Título: Emergente estratégico
Autor: Martinez,Chris
Fonte: Valor Econômico, 21/11/2011, Especial, p. F1

U m seleto grupo de brasileiros desembarca hoje na capital moçambicana Maputo, na África, disposto a fazer negócios de toda ordem. Pode ser uma operação inicialmente pequena, como exportar alimentos genuinamente nacionais. Mas podem ser - de preferência - transações grandiosas como construção de hidrelétricas, aeroportos ou rodovias, obras com investimentos na casa de bilhões de reais e que estão na ordem do dia de países como Moçambique e Angola.

Em todos os cantos do globo há investidores atentos à perspectiva de a África se transformar em uma nova China. Afinal, o continente formado por 53 países tem ativos com preços baixos, crescimento econômico e grande potencial de consumo. Exibe números invejáveis: possui um terço do urânio mundial, metade do ouro, dois terços dos diamantes e 10% das reservas estimadas de petróleo, além de ter acesso aos oceanos Atlântico e Índico.

Ou seja, oferece oportunidades de negócios em importantes setores da economia: da construção civil, passando pela infraestrutura, exploração de minérios e petróleo, à agricultura. É um continente com um bilhão de pessoas e PIB de US$ 1,7 trilhão. Os investimentos estrangeiros saíram de US$ 10 bilhões em 2000 para US$ 59 bilhões em 2009, segundo a agência da Organização das Nações Unidas (ONU) que monitora o comércio internacional.

Mesmo com toda a sorte de problemas - com países que duelam entre a riqueza e pobreza extremas -, a África tornou-se um bloco econômico ainda não dominado. "Nos últimos dez anos, o crescimento do PIB da região subsaariana (que inclui os países mais desenvolvidos, como África do Sul, Angola, Moçambique e Nigéria) foi de 5%, atrás apenas de China, Rússia e Índia", diz Gert Wunderlich, executivo do Standard Bank, maior banco sul-africano, com ativos de US$ 200 bilhões. "Há um enorme potencial de crescimento", afirma.

O Standard Bank tornou-se financiador e assessor de clientes brasileiros com projetos na África. Um deles é a Vale. "Por ser rica em recursos naturais, a África é considerada a última fronteira mundial, onde há potencial de aumentar significativamente a exploração de matérias primas", diz o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros. Além de companhias brasileiras, as chinesas têm feito aquisições de minas e jazidas, além de firmar parcerias com os governos do continente.

Para o economista, houve uma mudança de patamar em várias nações africanas, com vocações específicas. "É uma questão geopolítica, de relação de preços e poder de compra", diz. Historiadores e economistas lembram que, até os anos 1960, boa parte dos países africanos eram colônias e tinham uma economia baseada no comercio exterior. Com os movimentos de independência, desenvolveram-se. Em 1990, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) angolano estava em 0,143, (1 representa o bem-estar máximo). Hoje, está em 0,561. "Há mudanças importantes em curso", diz Wunderlich.

Essas companhias estão apostando firme nos movimentos dos países do continente. A reconstrução de Angola - depois de mais de duas décadas de guerra civil - atraiu 200 empresas brasileiras para o continente. O número supera a presença de 150 companhias da China, que detém a posição de maior parceiro bilateral dos angolanos em valor de investimentos. O Brasil é o segundo maior. Hoje, Brasil e Angola têm 40 acordos comerciais assinados na gestão Lula (2003-2010).

Angola, aliás, é um dos pontos a ser visitado pela missão brasileira que zarpou do país no sábado. O grupo é formado por executivos e empresários de 73 companhias - entre as quais, BR Foods, Camargo Corrêa, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Docol, Deca, Oi, Lorenzetti, Banco do Brasil, e Bombril. Eles fazem parte de uma missão que tem a anuência especial da presidente Dilma Roussef e foi planejada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria Comércio e pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex).

Não foi por acaso. Era para ser uma missão comercial nos moldes convencionais, com rodadas de negócios entre empresários brasileiros e africanos. Mas, a pedido da presidente, que esteve na África em outubro, a viagem ganhou um caráter institucional que inclui reuniões com o alto escalão dos governos desses países.

"Estamos levando executivos de setores como o de telefonia que, assim como o de energia elétrica ou de defesa, envolvem questões regulatórias que precisam ser discutidas e alinhadas entre empresas e governos locais", diz Ricardo Santoro, coordenador de imagem e acesso a mercados da Apex.

O Banco do Brasil pretende se informar sobre detalhes técnicos para instalar agências em países africanos e atender brasileiros que trabalham lá. A ideia, acrescenta Santoro, é desenvolver parcerias. Tanto que uma das empresas envolvidas é a Univali, uma universidade de Santa Catarina. O importante, neste caso, é ver a África com um parceiro comercial.