Título: Presidente do TSE diz que eleitor deve responder à crise ética com o voto
Autor: Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 05/05/2006, Política, p. A8

Em um duro recado ao PT e ao governo Lula, o novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio Mello, afirmou, em sua posse, ontem, que o Brasil vive uma crise ética sem precedentes devido aos escândalos de grupos políticos que fizeram "mirabolantes projetos de poder", e conclamou a população a responder no voto. Ele criticou duramente os escândalos de corrupção do governo petista e a resposta de "agentes públicos" que se dizem desinformados.

"Nunca é demais frisar que, se a ordem jurídica não aceita o desconhecimento da lei como escusa até do mais humilde dos cidadãos, muito menos há de se admitir a desinformação dos fatos pelos agentes públicos, a brandirem a ignorância dos acontecimentos como tábua de salvação", atacou o ministro, numa alusão às justificativas do presidente Lula que alegou nada saber sobre os escândalos de seu governo.

"Faz de conta que não se produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam - o que lhes daria uma carta de alforria prévia para continuar agindo como se nada de mal houvessem feito", ironizou Marco Aurélio. "Faz de conta que não foram usadas as mais descaradas falcatruas para desviar milhões de reais, num prejuízo irreversível em país de tantos miseráveis", completou.

Marco Aurélio não citou Lula, nem o PT nas onze páginas de seu discurso, mas fez várias menções aos escândalos de corrupção envolvendo o PT e integrantes do governo. Para ele, a denúncia feita pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, contra os 40 suspeitos de envolvimento no mensalão tornou-se "quase banal" por causa da rotina de escândalos. "Tornou-se quase banal a notícia de indiciamento de autoridades dos diversos escalões não só por um crime, mas por vários, incluindo o de formação de quadrilha."

Para Marco Aurélio, essa "rotina de desfaçatez e indignidade" criou uma "apatia cada vez mais surpreendente" na população. O povo está reagindo "como se todos os homens públicos, nas mais diferentes épocas, fossem e tivessem sido igualmente desonestos, numa mistura de escárnio e afronta". A repulsa à corrupção se transformou em indiferença e desdém, advertiu Marco Aurélio. "E seguimos, como se nada estivesse acontecendo", continuou o ministro. "Perplexos, percebemos, na simples comparação entre o discurso oficial e as notícias jornalísticas, que o Brasil se tornou um país do faz-de-conta."

Na sua crítica à apatia da população frente às denúncias de corrupção, Marco Aurélio dividiu o país em dois segmentos: o da corrupção e o da "massa comandada". O segmento da corrupção seria aquele "seduzido pelo projeto de alcançar o poder de forma ilimitada e duradoura", e o da massa comandada seria o das pessoas que se esforçam para "sobreviver e progredir".

A eleição foi encarada pelo novo presidente do TSE como o momento certo para que a população dê a resposta aos escândalos éticos. "Ao usar a voz da urna, o povo brasileiro certamente ouvirá o eco vitorioso da cidadania, da verdade - que, sendo o maior dos argumentos, mais dia, menos dia, aparecerá."

Marco Aurélio disse que o Judiciário também dará a sua resposta aos escândalos "No que depender desta Presidência, o Judiciário compromete-se com redobrado desvelo na aplicação da lei", prometeu. Segundo ele, o TSE não será condescendente com a corrupção. "Nenhum fim legitimará o meio condenável. A lei será aplicada com a maior austeridade possível", enfatizou. E haverá atenção especial às contas partidárias: "Esqueçam a aprovação de contas com as famosas ressalvas".

Marco Aurélio Mello será o presidente do TSE durante as eleições deste ano. Caberá a ele presidir os julgamentos de processos envolvendo partidos políticos, acompanhar as prestações de contas de campanhas e comandar o processo de votação em outubro próximo. O ministro assumiu para um mandato de dois anos. O presidente do TSE é eleito pelos critérios de antiguidade e de revezamento, entre os ministros do Supremo Tribunal Federal.