Título: Chávez é líder mais influente da região
Autor: Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 05/05/2006, Especial, p. A10

A crise do gás pode ser o marco de uma realidade incômoda para a política externa do PT: é a Venezuela de Hugo Chávez, e não o Brasil de Lula, a liderança mais forte e influente da região.

Enriquecida pelo petróleo, que pulou de US$ 10 para US$ 75 o barril desde que Chávez assumiu, há sete anos, a Venezuela está fazendo o que o governo Lula gostaria de fazer: ajudar os vizinhos pobres para criar um espaço geopolítico em que seja o centro de poder. Tem sido assim com a Bolívia e até com a Argentina, a quem Chávez tem socorrido comprando títulos soberanos rejeitados pelo mercado.

O projeto de Chávez é fazer contraponto à antiga dominação dos EUA na região. Já Lula se apresentou aos países ricos como líder popular confiável, respeitador dos contratos e comprometido com a responsabilidade macroeconômica. Sua ambição era fazer do Brasil um país respeitado pelos grandes.

Lá fora, Lula vinha sendo visto como um presidente capaz de contribuir para descolar o Brasil da instável América do Sul, marcada novamente pela emergência de líderes populistas. O problema é que sua diplomacia elegeu, como prioridade absoluta, a aproximação com as nações sul-americanas.

Na prática, o Brasil tem acumulado ressentimentos. Incapaz de ajudar diretamente os vizinhos (além da escassez de recursos, a lei brasileira impede que agências de crédito oficiais financiem estrangeiros), o governo Lula fez promessas de investimento em infra-estrutura difíceis de cumprir. Ignorou regra de ouro da tradição diplomática brasileira: sem excedentes de poder, o Brasil ainda não tem como exercer liderança que lhe parece natural. Só deveria fazê-lo após crescer e se tornar país desenvolvido, o que, para analistas, ocorrerá nas próximas décadas.

Endinheirado, Chávez cresceu no vácuo deixado por Lula. O contraste é visível: há três anos, o Brasil ajudou Chávez a se manter no poder. Hoje, é Chávez quem faz a intermediação para pacificar a relação de Lula com a Bolívia, a nação mais pobre da região e que esteve na esfera de influência brasileira.