Título: Demanda por bônus alemães fica abaixo da oferta de € 6 bilhões
Autor: Oakley,David
Fonte: Valor Econômico, 24/11/2011, Finanças, p. C2

A Alemanha assistiu ontem a uma de suas piores vendas de títulos, no que foi visto como um leilão fracassado pelo mercado. O resultado se deu em meio a temores de que a crise da dívida da zona do euro esteja se propagando e acabará alcançando Berlim.

"Não me lembro de um leilão pior do que esse... Se a Alemanha obtém esse tipo de participação, o que os demais [países] podem esperar? Os rendimentos estão num nível completamente indevido", disse Marc Oswald, da corretora Monument. Ele comentou que a relação quantidade de lances recebidos no leilão de títulos sobre a quantidade de lances aceitos foi de apenas 0,65 vez, já que o Bundesbank, o BC do país e responsável pela dívida alemã, vendeu € 3,644 bilhões de seu novo Bund de 10 anos, comparativamente aos € 6 bilhões ofertados.

O Bundesbank reteve a sobra de € 2,356 bilhões em papéis que planeja vender nos próximos dias. Se incluída a retenção do Bundesbank, a relação quantidade de lances recebidos sobre a quantidade de lances aceitos foi de 1,1 vez.

Muitos participantes consideram o leilão fracassado, embora alguns digam que, tecnicamente, não se defina como tal. Ao reter os bônus, o Bundesbank puxou a relação entre lances recebidos sobre aceitos para cima de 1,0 vez.

A média do rendimento dos bônus de 10 anos foi de 1,98%.

O euro caiu significativamente no câmbio com o dólar após a divulgação dos resultados do leilão. A moeda única recuou 1%, para US$ 1,3379, e perdeu 0,6%, para 103,30, na troca com a moeda japonesa. Em relação à moeda britânica, a retração foi de 0,5%, para 0,8595 libra esterlina.

"O leilão foi extremamente fraco. Apesar de o novo papel parecer atraente, a extrema riqueza dos títulos alemães influenciou a demanda ", disse Annalisa Piazza, da consultoria Newedge Strategy.

A fragilidade do sentimento reinante nos mercados de capitais foi enfatizada pelos mais recentes dados da economia da região, que mostraram que os pedidos encaminhados às indústrias da zona do euro despencaram 6,4% em setembro, comparativamente ao mês anterior.

A agência de classificação de crédito Standard & Poor"s advertiu que as notas de risco da zona do euro poderão ser revisadas se grandes partes da zona do euro voltarem a resvalar para a recessão, como o previsto, no ano que vem.

David Beers, responsável pelo rebaixamento dos Estados Unidos pela S&P, disse: "A dinâmica financeira desencadeada pela atual crise de confiança, na opinião da Standard & Poor"s, elevou o risco de ocorrer uma nova recessão num crescente número de integrantes da zona do euro; esse fator poderá aumentar a pressão de queda das classificações soberanas da zona do euro".

Quando os papéis da Alemanha começaram a ser negociados como um ativo de risco - com os rendimentos dos Bunds aumentando mais ou menos em linha com os pagos pelos papéis de França, Itália, Espanha e Bélgica -, o medo se disseminou pelos pregões.

"Este leilão reflete as preocupações em torno da Alemanha e o fato de muitos clientes estarem se perguntando: "Se o euro entrar em colapso, será que meu dinheiro, mesmo na Alemanha, estará seguro? O que vai acontecer com meus títulos denominados em euros?"", disse um operador. O Banco Central Europeu voltou a intervir nos mercados, mas isso não foi suficientes para baixar as tensões.

Os mercados de credit default swaps (CDS, que asseguram contra a inadimplência do tomador) também registraram saltos dos preços em meio à crescente preocupação acerca da zona do euro.

Os rendimentos dos bônus italianos de 10 anos subiram para 6,92%, uma alta de 10 pontos base; os da Espanha aumentaram para 6,65%, ou 5 pontos-base; os da Alemanha tiveram alta de 8 pontos-base, para 2,03%; os da França totalizaram 3,62%, com aumento de 9 pontos-base, e os belgas tiveram elevação para 5,20%, com acréscimo de 13 pontos-base.

Os preços dos CDS italianos saltaram para 558 pontos-base, o equivalente ao custo de US$ 558 mil para assegurar anualmente US$ 10 milhões em títulos por cinco anos, com alta de 7 pontos-base no dia; os CDS da Espanha ficaram em 448 pontos-base, os da França em 245 pontos-base e os CDS da Bélgica, em 361 pontos-base.

De forma reveladora, o custo para assegurar os bônus da Alemanha contra a inadimplência saltou para 107 pontos-base, acima do patamar correspondente aos papéis soberanos do Reino Unido.

Houve tensão nos mercados de swap cambial, com o custo para trocar euro por dólar tendo atingido o nível mais elevado desde o fim de 2008, em meio ao clamor para que se evitem posições em ativos denominados em euros.

"O único motivo pelo qual o euro se mantém é o fato de haver alguma repatriação, mas começamos a assistir venda maciça da moeda. Esse pode ser o começo do fim, a não ser que autoridades ajam rapidamente", disse um operador. (Colaborou Neil Dennis)