Título: TRF mantém quebra da patente do Viagra
Autor: Josette Goulart
Fonte: Valor Econômico, 13/07/2006, Legislação &, p. E1
O Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região negou um pedido da Pfizer para que fosse suspensa uma sentença de primeira instância que anulou uma das patentes do Viagra - aquela que dava à farmacêutica o direito exclusivo de produzir medicamentos inibidores da enzima PDE5, causadora da disfunção erétil em homens. O juiz convocado e relator da medida cautelar, Ferreira da Rocha, argumentou em 17 páginas os motivos para não suspender liminarmente a decisão de primeira instância. A Pfizer terá agora que esperar o julgamento da apelação. Até lá os outros laboratórios podem produzir livremente seus remédios para disfunção erétil com base na inibição da enzima.
A Pfizer continua com a patente do princípio ativo do Viagra, o Sildenafil, que foi registrado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) primeiramente para uso no combate a problemas cardíacos e que expira no Brasil em 2011. A outra patente, mais ampla, e que previa a exclusividade na produção de inibidores da PDE5, que expiraria por aqui em 2013, foi derrubada pelo próprio INPI em uma ação entre a Bayer e a Pfizer. A discussão entre as farmacêuticas começou na Europa pois, com a exclusividade para produzir remédios que inibam a enzima PDE5, todos os outros laboratórios não poderiam produzir e comercializar medicamentos para disfunção erétil. O argumento, aceito na Inglaterra, foi de que não se pode patentear uma função do corpo humano, e por isso a patente do Viagra foi quebrada em parte.
Com essa quebra, o INPI entendeu que também aqui a Pfizer não teria mais direito à patente, já que o Viagra estava registrado sob o sistema "pipeline". Esse sistema permitiu, durante a transição de leis em meados da década de 90, que as patentes farmacêuticas, desde que registradas em outros países, fossem apenas revalidadas por aqui. O procurador-geral do INPI, Mauro Maia, explica que para isso era necessário que o pedido fosse idêntico à patente original e, se ela é quebrada em seu país de origem, não pode ser mantida no Brasil. As outras empresas farmacêuticas também entendem dessa forma, tanto que Bayer e Lilly entraram com processos judiciais no Brasil contra a Pfizer para poderem comercializar livremente seus remédios.
E foi justamente no processo promovido pela Bayer que o INPI pediu a nulidade da patente. As duas empresas entraram em um acordo financeiro e resolveram encerrar a disputa, mas o INPI, que já fazia parte do processo, só foi comunicado na homologação do acordo. Foi então que o instituto, de posse dos documentos ingleses, resolveu levar a questão adiante. O advogado da Pfizer, José Roberto de Gusmão, do escritório Gusmão & Labrunie, diz que o INPI não poderia ter pedido a nulidade dessa forma e argumentou ainda que o laboratório teve seu direito de defesa cerceado, pois a nova decisão da Justiça Federal não ouviu os argumentos da farmacêutica.
Na medida cautelar que impetrou no TRF, a Pfizer alegou que não houve comprovação da quebra da patente originária. Chegou a argumentar que o pipeline e a patente no exterior eram independentes. Mas todos os argumentos foram refutados pelo juiz Ferreira da Rocha, que disse, em sua decisão, que não se pode duvidar dos documentos apresentados pelo INPI que mostram a nulidade da patente inglesa e a revogação da européia, e que por este motivo a pipeline não pode ser mantida em território nacional. O juiz ainda decidiu que o INPI tinha direito de pedir uma nova decisão de primeira instância, após o acordo fechado sem sua participação, pois, como órgão federal responsável pelo processo, era parte litisconsorte. "É de se rememorar que a anulação de patente pode ser efetuada pelo INPI inclusive no âmbito administrativo", argumentou Rocha.
O INPI já declarou que mudou de postura quanto às patentes pipelines e que irá atrás daquelas que estão irregulares, seja por terem sido concedidas de forma errônea, seja porque tiveram suas patentes originais canceladas. O procurador-geral do INPI diz que agora a estratégia na Justiça é a de argumentar pessoalmente com juízes e ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).