Título: Mercado vê Copom gradualista e já projeta Selic de um dígito em 2012
Autor: Bittencourt,Angela
Fonte: Valor Econômico, 14/10/2011, Finanças, p. C1

Em linha com a indicação do Banco Central de que seguirá ajustando a taxa Selic de forma gradual, a aposta majoritária é de que a taxa Selic será reduzida novamente em 0,5 ponto percentual na próxima reunião do Copom, marcada para os dias 18 e 19 de outubro. Dos 30 economistas ouvidos pelo Valor, apenas três esperam decisão diferente: dois contam com um corte de 0,75 ponto e um fala em redução de 1 ponto percentual, para 11%.

Esse placar responde, em grande medida, às afirmações feitas nos últimos dias por diretores do BC, inclusive pelo presidente Alexandre Tombini, de que a autoridade monetária fará "ajustes moderados" na taxa de juros.

Já quando se olha para um horizonte mais longo, o que se observa é que as projeções também incorporam a indicação de que o governo deseja reduzir a taxa de juros para um dígito no próximo ano. Há duas semanas, fontes do Planalto ventilaram a ideia de que, com o objetivo de preservar o consumo e o crescimento, a taxa Selic deveria recuar para, pelo menos, 9% em 2012.

Essa hipótese já é contemplada por boa parte dos analistas: oito profissionais preveem juros de um dígito (9% ou 9,5%) em dezembro de 2012. Outros cinco veem a taxa em 10%. Há alguns dos analistas que acreditam que a Selic pode esbarrar em um dígito nos próximos meses, mas voltará a subir até o fim do próximo ano.

A hipótese de uma taxa de juros tão baixa era impensável antes da reunião passada, em 31 de agosto, quando o Copom surpreendeu os economistas e iniciou o ciclo de alívio monetário. Na ocasião, a aposta mais ousada para os juros era de uma taxa de 10,50% em dezembro de 2012, hipótese considerada por apenas duas instituições.

Agora, o que altera o horizonte da política monetária é, principalmente, a avaliação pessimista que o Banco Central faz do cenário internacional. A avaliação geral é de que o BC está empenhado em preservar o desempenho da economia, ainda que isso custe uma inflação ainda acima do centro da meta. A maior parte dos economistas vê o PIB crescer entre 3,5% e 4,2% em 2012, e ao redor de 3,5% este ano. Já para o IPCA, ninguém espera uma taxa inferior a 6,4% neste ano. E, para 2012, a maioria enxerga uma inflação superior a 5,5%.

Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, projeta Selic em 12% em dezembro do ano que vem, mas decorrente de uma reversão da posição do BC. A expectativa da consultoria é que o juro básico encerre este ano a 11% e recue até 10% no ano que vem. O juro deve voltar a subir por volta de abril, quando o Copom realizará a terceira reunião de 2012. "Nossa hipótese é de que a inflação voltará a se acelerar e por isso o BC terá que reverter sua posição. Mas isso não ocorre por causa de compromisso do BC com a meta, mas talvez um compromisso com a inflação no teto, ou seja, 6,5% de IPCA para o governo parece estar de bom tamanho."

Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Nacional e economista-chefe do banco J.Safra, não vê abandono do regime de metas pelo BC. Ele, que já vinha trabalhando com perspectiva de queda do juro básico antes que ele acontecesse, considera que na última reunião do Copom existiu preocupação com o crescimento, o que não quer dizer que a inflação saiu de foco. Kawall, que projeta três cortes consecutivos de 0,50 ponto na Selic, acredita que o governo tem claro que a inflação deve cair, mas com alguma flexibilidade. "Estamos numa situação atípica aqui e no mercado internacional, mas não vejo o sistema de metas abandonado ou subordinação do BC ao Executivo", comenta ele.

André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, também projeta três cortes de 0,50 ponto e avalia que a sinalização do BC deve se confirmar nesta reunião do Copom. "É um jeito barato ou elegante de o BC reconquistar parte da confiança do mercado que ficou muito receoso com o corte de 0,50 ponto no fim de agosto. O BC sabe que credibilidade é muito importante no regime de metas para inflação. Mais adiante, se a crise externa fizer mesmo o trabalho "sujo" de frear a atividade mais fortemente lá fora e aqui, nada impede o Copom de cortar mais a taxa Selic no ano que vem."

O BES Investimento do Brasil, que também não vê o BC abandonando o regime de metas para inflação mas dando peso maior ao crescimento, projeta dois cortes seguidos de 0,50 ponto. Flávio Serrano, economista da instituição, lembra que está antecipando o que o BC vai fazer e não o que o BC deveria fazer. "Vemos um processo de arrefecimento da atividade, mas isso não ocorre na inflação. Teimosamente, a inflação não dá sinais de enfraquecimento. E a desaceleração da atividade vem ocorrendo em setores e não como um todo. A indústria é o segmento que sofre mais. No entanto, o setor de serviços se mantém fortíssimo, confirmando que os setores mais ligados à renda estão resistentes e pesam na inflação."

Para o economista do Santander, Cristiano Souza, o cenário de desaceleração econômica não deverá ter impacto deflacionário para países emergentes. Por isso, o banco espera que o BC continue conduzindo o ciclo de alívio monetário de forma gradualista, com mais dois cortes de 0,5 ponto percentual da Selic. Souza acredita que o crescimento da China, que deve ser de 8,9% este ano, segundo sua previsão, sustente os preços das commodities. Além disso, o vigor do mercado de trabalho e da renda - com impulso especial do reajuste de 14% do salário mínimo no ano que vem - e a manutenção dos gastos públicos devem limitar os efeitos da crise externa sobre a inflação doméstica. "Não devemos ver grande mudança no emprego no Brasil nem redução importante do gasto público, o que sinaliza para um descompasso entre demanda e oferta", observa. Nesse cenário, diz Souza, o banco considera uma retração da atividade, mas não um evento de ruptura, como foi a quebra do Lehman Brothers, em 2008. Souza considera, entretanto, que ainda que haja um ambiente externo mais perverso, não é possível afirmar que a crise é realmente deflacionária para o Brasil. "Se o quadro for mais grave, pode haver um choque de câmbio, o que consequentemente pressionaria a inflação", observa.

O economista-sênior do HSBC, Constantin Jancsó, concorda que não há certeza de que, com a crise, a inflação local vá recuar. Mas o BC deixou claro que há a intenção de cortar os juros, por estar pessimista com o ambiente externo e, portanto, o banco espera mais quatro cortes da Selic, de 0,5 ponto cada. "Há duas hipóteses: ou o BC tem a percepção mais acurada da economia, acesso a mais informações do que o mercado, ou a política econômica se tornou mais tolerando com a inflação", diz o economista, que projeta IPCA de 6,5% este ano e 5,7% no ano que vem.