Título: Empresas captam R$ 34 bilhões
Autor: Altamiro Silva Júnior e Catherine Vieira
Fonte: Valor Econômico, 04/07/2006, Finanças, p. C1
O mercado de capitais brasileiro movimentou R$ 34 bilhões no primeiro semestre, incluindo todos os instrumentos de captação, como debêntures, ações e fundos de recebíveis, revelam dados de ontem da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A quantia é um pouco inferior ao mesmo período do ano passado, que havia sido o melhor da história, quando R$ 36 bilhões foram captados. A forte volatilidade no mercado desde maio acabou influenciando as operações, principalmente as emissões de ações, e muitas ofertas em preparação foram adiadas ou até canceladas. As debêntures, que dependem menos da demanda dos estrangeiros, foram menos afetadas. Só em junho, cinco novas operações, totalizando R$ 18 bilhões, entraram em análise na CVM, incluindo uma emissão de R$ 15 bilhões da BFB Leasing e outra de R$ 2 bilhões da AmBev.
A emissão de debêntures da Empresa Energética do Mato Grosso do Sul (Enersul), feita no final de maio, ou seja, no auge da volatilidade do mercado, ilustra o interesse dos investidores por papéis de renda fixa. A empresa emitiu R$ 337,5 milhões em debêntures no dia 31 de maio. O papel acabou atraindo vários investidores e a remuneração caiu.
A empresa estava disposta a pagar rentabilidade de até 107% da taxa DI, mas, com a alta demanda, a remuneração ficou em 104,3% da taxa DI. "Os investidores estão interessados em bons papéis", diz Denise Avarina, do Bradesco Banco de Investimento, que coordenou a emissão. "A Enersul é bem estruturada e a emissão não era tão grande", diz a executiva.
"Há apetite na indústria de fundos para absorver dívida privada e os bons projetos sempre terão demanda, inclusive entre estrangeiros", avalia Nelson Rocha Augusto, presidente da BB DTVM , a maior gestora de recursos de terceiros da América Latina. Rocha lembra que o ciclo da expansão do mercado de capitais ocorre no rastro do aumento do crédito e do crescimento da indústria de fundos, que só este ano já captou mais de R$ 47 bilhões.
O presidente da BB DTVM ressalta que há um ciclo de queda de juros em curso e que a economia brasileira entra no segundo ano de crescimento. "No início do ciclo de expansão do mercado muitas operações ainda eram de troca ou reestruturação de dívida, agora, com a melhora dos fundamentos da economia, as empresas estão captando para investir em projetos."
Além das operações já aprovadas pela CVM, há mais R$ 50 bilhões em emissões sendo analisadas pelos técnicos da autarquia, dos quais R$ 26,3 bilhões só em debêntures. As previsões da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro (Andima) eram de que as emissões de debêntures renderiam até R$ 35 bilhões para as empresas este ano. Este número, porém, deve ser superado, avalia Paulo Eduardo Sampaio, superintendente geral da associação. Para ele, o fechamento da janela para emissões externas abre possibilidade para as empresas acessarem o mercado local.
Desde maio, a fuga dos estrangeiros colocou um ponto de interrogação sobre as mais de 15 operações de ações que estão na fila para ir a mercado. Os estrangeiros eram os principais compradores destes papéis. Devido à turbulência, várias operações foram adiadas. Só duas foram a mercado, Banco do Brasil e Porto Seguro. "A volatilidade afetou muito mais as operações no mercado de equities", diz Denise, do Bradesco.
Para o presidente da CVM, Marcelo Trindade, o mercado de capitais tem hoje uma estrutura mais sólida. "O primeiro semestre foi ótimo sim, mais consistente com o ritmo dos anteriores. Esse é um movimento que já vinha ocorrendo desde 2004", lembrou. Ele reconhece que houve um abalo no segundo trimestre, fruto de questões relacionadas ao cenário externo. "A economia brasileira vai muito bem, no que depender do Brasil, estamos preparados para um bom segundo semestre", completou.
Para Alexandre Póvoa, da Modal Asset Management, as operações que dependerem mais do humor dos estrangeiros, como é o caso da maioria das ofertas de ações, vão ter de esperar. "Agora temos um período de férias até agosto, depois deve haver um certo suspense por causa da eleição, então possivelmente o apetite maior para as ofertas só volte no último trimestre, se não houver nenhum outro fator maior de estresse", prevê.
Arthur Carvalho, da Ativa Corretora, acha que a volatilidade tende a diminuir. "Agora, o mercado tem mais certeza de que o aperto monetário nos Estados Unidos está chegando ao fim; antes, havia só incertezas", diz.