Título: CDMA encara o complicado desafio de sobreviver
Autor: Talita Moreira e Heloisa Magalhães
Fonte: Valor Econômico, 03/07/2006, Empresas &, p. B3

Pergunte a qualquer engenheiro de telecomunicações e ele lhe dirá que o CDMA, padrão tecnológico para redes de celular, é mais eficiente no uso do espectro e proporciona maior velocidade na transmissão de dados sem fio. Mas, no placar da competição na telefonia móvel, o CDMA perde de goleada para o GSM, tecnologia mais utilizada no mundo.

Enquanto o CDMA, desenvolvido nos Estados Unidos, contabilizava 335 milhões de usuários, o GSM, que é europeu e foi criado alguns anos mais cedo, ultrapassou em junho a barreira dos 2 bilhões.

Com menos fôlego na disputa, o padrão desenvolvido pelos americanos amargou duros golpes nas últimas semanas. Um deles foi o anúncio da finlandesa Nokia de que deixará de produzir celulares CDMA até abril de 2007. Não é pouca coisa. A empresa nunca teve participação relevante na tecnologia, mas é o maior fabricante mundial de telefones móveis.

O outro, com impacto talvez maior, foi o anúncio da Vivo de que estuda implantar uma rede GSM. A operadora brasileira representa a sexta maior base celulares CDMA do mundo - mais de 25 milhões de seus 30 milhões de assinantes utilizam a tecnologia. As maiores são as americanas Verizon e Sprint Nextel.

Os representantes da tecnologia negam que haja problemas e defendem o CDMA com um fervor quase religioso.

"Comparar as duas tecnologias é inapropriado porque o GSM é uma tecnologia de segunda geração e o CDMA é de terceira geração", diz Celedonio von Wuthenau, diretor-executivo para a América Latina do CDG, associação que reúne empresas ligadas ao padrão.

A afirmação reproduz a eterna briga entre os adeptos das tecnologias sobre quão avançada é cada uma delas. Formalmente, a terceira geração (3G) só chegará quando a Anatel vender licenças para isso. O WCDMA, padrão usado na 3G, tem componentes do CDMA, mas não é exatamente uma evolução em linha reta.

O presidente da Qualcomm, Marco Aurélio Rodrigues, segue na mesma linha. Ele destaca que o CDMA representa 20% dos celulares no mundo e 50% do mercado americano e sua participação está crescendo com a adesão de operadoras, especialmente na Ásia. A Qualcomm é uma das empresas que detêm patentes dos chips de telefones nesse padrão.

Rodrigues minimiza a decisão da Nokia de sair do mercado. "Efetivamente, o assunto tem de ser olhado no contexto de que há uma disputa de renovação de licença [de uso da tecnologia] que deve se dar no ano que vem e essas coisas acabam se acirrando durante um período como esse", afirma. "Mas a Nokia nunca foi muito forte no CDMA, dominado pela LG, Samsung e Motorola."

A Nokia não havia retornado os pedidos de entrevista até o fechamento desta edição.

Uma visível desvantagem do CDMA é o preço dos aparelhos, em média 20% mais caros do que os terminais GSM, segundo relatório da Merrill Lynch. Mais antiga, a tecnologia européia tem escala maior, o que barateia os produtos. Essa diferença foi prejudicial à Vivo, que teve de gastar mais em subsídios para colocar no mercado aparelhos a preços similares aos de outras teles.

No entanto, as dificuldades da Vivo não se limitaram a isso. A operadora tem lacunas importantes em sua cobertura - Minas Gerais e parte do Nordeste. Além de não vender seus serviços, a operadora acaba expondo os clientes que viajam para essas regiões ao risco de clonagem, que é maior onde não há roaming digital.

A operadora tem perdido participação no mercado constantemente. A Vivo já foi líder absoluta, mas a opção da Anatel de licitar a faixa de freqüência mais favorável ao GSM a partir de 2002 acirrou a competição. A empresa tem hoje 33% dos celulares no país, conforme o site especializado Teleco.

Para suprir essas deficiências de cobertura, a operadora defendeu que a Anatel realizasse o leilão das licenças de telefonia de terceira geração (3G) - mas as concorrentes GSM se opuseram e até agora não há uma definição sobre o assunto.

O consultor Alexandre Gärtner, da Voga Advisory, observa que a tecnologia dos celulares é irrelevante para o consumidor, mas preço e segurança fazem diferença.

O novo presidente da Telemar/Oi, Luiz Eduardo Falco, diz que a implantação de uma rede GSM pela Vivo não deve alterar o mercado. "A Vivo pode tirar o atraso indo, mas não vai virar o jogo", avalia. "O cliente quer integração e isso ela não tem."

A integração a que Falco se refere é a oferta conjunta de serviços de telefonia fixa, móvel e transmissão de dados. A Telefónica, acionista da Vivo, é concessionária de telefonia fixa em São Paulo, mas só detém metade do bloco de controle da celular. Os espanhóis têm planos de adquirir a fatia da Portugal Telecom na empresa, o que pode facilitar a adoção desse modelo.

A Samsung, uma das principais fornecedoras da Vivo, diz não estar preocupada com a possível instalação do GSM, pois fabrica aparelhos nos dois padrões. Hoje, o CDMA representa 40% das vendas. "Não vejo mudanças no médio prazo e, se for o caso, temos condições de nos adaptar", afirma o vice-presidente José Roberto Campos.