Título: Prioridade do governo é manter conquistas
Autor: Ricardo Balthazar
Fonte: Valor Econômico, 27/07/2006, Brasil, p. A4

Com o fracasso das negociações na Organização Mundial do Comércio (OMC), o governo brasileiro passou a ter como uma das prioridades garantir que não se percam os avanços acumulados até agora, como o compromisso em eliminar os subsídios à exportação e cortes oferecidos no volume de subsídios que distorcem o comércio de produtos agrícolas. "Houve uma suspensão, não um encerramento das negociações", comentou o diretor do Departamento de Comércio do Ministério das Relações Exteriores, Roberto Azevedo.

Funcionários do governo revelam que os impasses nas negociações em Genebra sepultaram até um dos cenários imaginados pelo governo brasileiro, o de um "acordo pouco ambicioso", no qual os países em desenvolvimento aceitariam cortes modestos nas tarifas protecionistas em agricultura e medidas de redução dos subsídios que, na prática, apenas impediriam um agravamento da situação existente. Nesse caso, os compromissos dos países em desenvolvimento com a redução das tarifas para produtos industriais também seriam tímidos.

A recusa dos Estados Unidos em aceitar essa saída determinou a suspensão das conversas em Genebra. Em uma retomada da rodada da OMC, as conversas informais de membros do governo brasileiro indicam que o Brasil partiria para concretizar, pelo menos, esse cenário de "baixa ambição", como indicam as declarações genéricas de Azevedo, ontem, em entrevista de avaliação sobre as repercussões do malogro na OMC.

O caso dos EUA é exemplar: apesar de autorizados pela OMC a dar subsídios de até US$ 48,2 bilhões, os americanos, na prática, concederam cerca de US$ 19 bilhões em 2005 e vinham oferecendo um corte (nos subsídios autorizados) que lhes permitiria manter apoio a seus produtores domésticos de até US$ 22 bilhões, cifra só alcançada, nos últimos anos, em 1999 e 2000. A maior preocupação no governo brasileiro é pelo menos, congelar os subsídios nos níveis de hoje.

Azevedo informou que, apesar do colapso na última tentativa de fazer avançar a rodada da OMC, nesta semana, em Genebra, ministros e funcionários de diversos escalões dos governos envolvidos nas negociações vêm trocando telefonemas e marcando encontros para discutir como retomar as discussões. Ele desdenhou as análises de que, com o fracasso das negociações multilaterais com a OMC, o Brasil se encontra atrasado em relação a outros países que passaram, nos últimos meses, a negociar acordos bilaterais de comércio.

"Não tenho inveja daqueles acordos. Pelo que, vi, não assinaria nenhum deles", disse, ao comentar os acordos firmados por países andinos com os Estados Unidos. O governo brasileiro avalia que os andinos firmaram acordos com os EUA para manter tratamento preferencial que já era concedido a suas exportações e estavam ameaçados de extinção. Em troca, cederam a exigências dos EUA que podem criar problemas no futuro.

"O Brasil apostou na rodada da OMC porque não há opção a não ser o multilateralismo", argumentou. "Não adianta uma negociação manca, centrada só em acesso aos mercados." Ele lembrou que só na OMC os países com fortes subsídios, como os EUA, admitem negociar a ajuda à agricultura.

Azevedo afirmou que não há planos, no governo, de reagir ao colapso das negociações com a abertura de novos contenciosos, como os bem-sucedidos questionamentos aos subsídios americanos aos produtores de algodão e o auxílio oficial europeu à produção e comercialização de açúcar.

Ele disse que o Brasil vai esperar só até o fim do mês, quando se encerra o ano fiscal americano, para verificar os gastos com os subsídios ao algodão e decidir se irá ao Comitê de Arbitragem para exigir o respeito dos EUA à decisão contra a ajuda aos produtores locais.

No caso da disputa com a Europa, a reforma do sistema de subsídio ao açúcar realizada recentemente pela União Européia parece atender satisfatoriamente às queixas do Brasil, avaliou.