Título: Kapaz afasta-se de institutos de defesa da ética
Autor: Cristiane Agostine e André Vieira
Fonte: Valor Econômico, 27/07/2006, Política, p. A8

O empresário e ex-deputado Emerson Kapaz afastou-se dos três institutos dos quais participava, ligados à defesa da ética e da transparência política, para esclarecer as acusações de participação no esquema de desvio de dinheiro na compra de ambulâncias. O caso, investigado pela CPI das Sanguessugas, colocou em xeque a atuação do ex-deputado que chegou ao Congresso em 1999, pelo PPS, depois de lançar-se como liderança renovadora na política empresarial.

O afastamento da presidência do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco), do conselho do Instituto Ethos e do conselho deliberativo da ONG Transparência Brasil deu-se depois do depoimento do empresário Luiz Antônio Vedoim, um dos sócios da Planam, empresa de ambulâncias que subornava parlamentares. Segundo ele, Kapaz apresentava emendas para compra de ambulâncias e pedia em troca 10% do valor do negócio.

Alegando a falta de possibilidade de defesa, pois o processo corre em sigilo de Justiça, Kapaz desmetiu "qualquer intermediação com prefeitos em troca de benefícios ou negociações" com a Planam. "Não intermediei contatos com prefeitos em troca de qualquer beneficio e não negociei com a empresa Planam", disse, em nota.

A saída da ONG Etco é considerada como certa por conselheiros da entidade, segundo apurou o Valor. Eles temem maiores prejuízos à imagem do instituto criado para combater a sonegação e evasão fiscal. Tendo empresas líderes de seus setores -- AmBev, Coca-Cola, Souza Cruz e BR Distribuidora -- como fundadoras, a entidade criada por Kapaz ajudou a combater a informalidade na economia. Mas serviu também para as empresas escudarem seus interesses.

Na indústria de cerveja, os medidores de vazão - um sistema de software que quantifica a produção e informa os dados à Receita Federal - surgiu de sugestão de executivos da AmBev. A idéia foi encampada pelo sindicato da categoria, mas ganhou relevância depois que Kapaz abraçou a causa.

Em 2005, uma dúzia de laboratórios farmacêuticos - entre eles Pfizer, Novartis, Merck, Aché e Medley - encomendou um estudo, avaliado em US$ 2 milhões, à consultoria McKinsey e o escritório Pinheiro Neto para medir o grau de informalidade do setor. A Interfarma pediu ao Etco para que fizesse sua divulgação e organizou um seminário com a presença do então ministro da Saúde Saraiva Felipe.

"O Etco tinha uma história de sucesso", diz o presidente-executivo da Interfarma, Gabriel Tannus, ao justificar a ajuda pedida pela entidade a Kapaz. "Foi um choque", afirma. Tannus espera as explicações do empresário.

A acusação surpreendeu também dirigentes das duas outras entidades. "É uma acusação chocante, que causa perplexidade", comentou Ricardo Young, presidente do Instituto Ethos. "Todos ligados à ética, à transparência, ficam entristecidos com isso. Mas ainda não há fatos consistentes".

Para o diretor-executivo da Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, o pedido de afastamento "representa a aplicação, à própria entidade, do mesmo critério pugnado para aqueles que se dedicam à vida pública".

No meio empresarial, Kapaz sempre foi conhecido por ter uma "rígida postura moral", como relatou o diretor do Moinho Pacífico, Lawrence Pih. Kapaz começou sua atuação no setor produtivo na fábrica de sua família, a Elka Plásticos. Representando o setor de plásticos e brinquedos na Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), no fim dos anos 80, ele foi uma das lideranças do grupo de empresários dissidentes da federação, que formaram o Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE). O primeiro coordenador do movimento foi Oded Grajew, substituído por Kapaz no ano seguinte.

Na defesa da "modernização do empresariado", lutou pela renovação do grupo dirigente da Fiesp e concorreu à presidência da entidade em 1992, contra Carlos Eduardo Moreira Ferreira. Perdeu por 24 a 119 votos.

O ingresso na política foi em 1995, como secretário de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento da gestão Mário Covas, em São Paulo. Em 1998, elegeu-se deputado federal pelo PPS e dois anos depois, desistiu de concorrer à Prefeitura de São Paulo para ser vice na chapa de Luiza Erundina (PSB), hoje deputada federal. Em 2003, desfiliou-se do PPS para presidir o Etco.

Mesmo com provas que revelam a gravidade das denúncias, segundo relatou o vice-presidente da CPI, Raul Jungmann (PPS- PE), Kapaz pretende defender-se dizendo que suas emendas relativas à compra de ambulâncias foram empenhadas e liquidadas, mas ainda não foram pagas.