Título: Guerra vai afetar economia libanesa por muitos anos
Autor: Zeina Karam
Fonte: Valor Econômico, 27/06/2006, Internacional, p. A11

Os bombardeios de Israel desferiram um golpe devastador sobre a frágil economia do Líbano, justamente quando ela se recuperava de anos de queda na na atividade.

Uma lucrativa temporada turística foi perdida, os investidores fugiram, grande parte do comércio parou, a construção está parada - a um custo de US$ 70 milhões/dia.

Economistas dizem que podem ser necessários US$ 5 bilhões e muitos anos para reerguer a infra-estrutura destruída. "Esta é uma guerra que mutila e obviamente é desastrosa para a economia", disse o ministro da Economia e do Comércio libanês, Sami Haddad.

Quando o Hezbollah seqüestrou dois soldados israelenses em 12 de julho - desencadeando uma ofensiva israelense maciça que causou a debandada de turistas e estrangeiros e que desalojou mais de meio milhão de libaneses - a economia do Líbano havia recentemente começado a se recuperar de uma recessão que foi exacerbada pelo assassinato do ex-premiê Rafik Hariri, em fevereiro de 2005.

Em questão de horas, o minúsculo país mediterrâneo foi transformado, passando de uma terra cheia de turistas e homens de negócios a uma zona de guerra abarrotada de correspondentes estrangeiros e refugiados. Os aviões de combate israelenses pulverizaram pontes, estradas, estações de energia elétrica, portos e armazéns de cereais, bem como torres de TV e de telefones celulares.

Israel também bombardeou as três pistas de pouso do aeroporto internacional de Beirute, levando a seu fechamento, e impôs um bloqueio aos principais portos do país. Detentores de passaportes estrangeiros fugiram por terra para a Síria ou em barcos para Chipre e Turquia. As autoridades dizem que mais de 400 pessoas foram mortas, na maioria civis.

"Estamos falando de enormes prejuízos aqui, os efeitos negativos serão sentidos por anos", disse o economista libanês Louis Hobeika. Mesmo se houvesse um cessar-fogo hoje, disse, "seriam necessários ao menos dois anos para que a economia pudesse se recompor e retornar a seu ciclo regular".

Muitas lojas e empresas, incluindo algumas fábricas importantes no leste do Líbano que foram bombardeadas, fecharam temporariamente, porque muitos empregados ficaram em suas casas. Os restaurantes estão fechados ou desertos. A Bolsa de Valores de Beirute foi fechada por vários dias após o início dos bombardeios. As ações da Solidere, a empresa fundada por Hariri para reconstruir o centro comercial de Beirute, caíram em aproximadamente 15%.

Até os lixeiros, muitos dos quais vieram da Índia e do Sri Lanka, fugiram do país, deixando pilhas de lixo não recolhido nas ruas, cena que faz lembrar a guerra civil que durou de 1975 a 1990.

Se por um lado o impacto econômico e humanitário da guerra é grave, especialistas crêem que os efeitos sobre o setor financeiro do país devem ser limitados.

Apesar de uma grave escassez de dólares, a libra libanesa não caiu muito ante o dólar, como ocorreu após o assassinato de Hariri, segundo relatório do JP Morgan. O estudo sustenta que o sólido sistema financeiro, as expectativas de ajuda substancial para reconstrução e a consciência dos investidores sobre a capacidade dos libaneses de lidar com situações de crise poderão ajudar a limitar as perdas para a economia no longo prazo.

O Líbano, já sobrecarregado por uma dívida pública de aproximadamente US$ 38 bilhões, ou 180% do PIB, precisará se apoiar exclusivamente sobre doações estrangeiras para reconstruir o país.

Os ministros das Relações Exteriores europeus e árabes que se reuniram em Roma ontem concordaram em convocar uma conferência de doadores para a reconstrução da infra-estrutura do Líbano. Na terça, o rei Abdullah, da Arábia Saudita, anunciou doações para o Líbano num total de US$ 1,5 bilhão. A Comissão Européia disse estar empenhando US$ 25,3 milhões em ajuda financeira.

A maioria concorda, porém, que será muito difícil atrair os investidores de volta ao Líbano, a menos que se alcance uma solução séria e duradoura. O economista Charbel Nahhas alerta para outros problemas, como o grande número de pessoas que perderam as suas empresas e as falências esperadas.

Sem uma paz duradoura, um dos maiores desafios enfrentados pelo Líbano será a perda de capital humano, o principal ativo do Líbano. Muitos libaneses que fugiram durante a guerra civil estavam retornando e abrindo empresas; agora reina um grande temor de que eles partirão mais uma vez e que levarão outros com eles.