Título: Brasil pode levar a melhor em cenário de recuperação
Autor: Monteiro,Luciana
Fonte: Valor Econômico, 28/10/2011, Imvestimentos, p. D3

Na recuperação esperada para os mercados por conta das medidas europeias, a bolsa brasileira tem grandes chances de levar a melhor. Com ativos bem depreciados, o Índice Bovespa acumula no ano desvalorização de 14,48%. A perda é maior que a registrada pelos principais indicadores das bolsas de Portugal e Espanha, por exemplo, dois países altamente endividados.

Conta a favor da recuperação do Brasil neste momento o fato de o Ibovespa ter caído mais do que a maioria dos mercados, avalia Walter Mendes, sócio da Cultinvest Asset Management. Ou seja, as ações brasileiras têm muito mais espaço para subir do que as de outros países. A prova disso, segundo ele, é que, nos momentos de queda deste mês, o Índice Bovespa caiu menos do que os principais indicadores. E, nos dias de alta, subiu mais, diz.

Além das boas notícias externas, os temores com relação aos fundamentos econômicos locais estão se dissipando, lembra o sócio da Cultinvest Asset Management. "O medo de que a economia brasileira está superaquecida, ou seja, que o Banco Central não deveria já ter começado o processo de queda da taxa de juros não existe mais", afirma.

Mesmo o investidor internacional tem mostrado uma percepção melhor sobre a bolsa brasileira. Pelo menos é o que mostram os dados mais recentes de sua atuação na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F). A posição "vendida" (apostando na queda) dos estrangeiros em Ibovespa futuro voltou a ficar abaixo dos 60 mil contratos, retomando níveis de um mês atrás. No dia 26 de outubro, essa posição era de 53.517 contratos. Vale lembrar que a maior posição vendida do ano foi atingida em 19 de julho (106.841).

Já no mercado à vista, as compras dos estrangeiros na bolsa superaram as vendas entre os dias 20 e 25, quando o ingresso líquido foi de R$ 473,8 milhões. No acumulado de outubro, entretanto, o fluxo direto do investidor externo ainda está levemente negativo, em R$ 220 milhões até o dia 25.

Outro que acredita que o mercado fica mais leve para engatar um movimento de alta após o acordo firmado na zona do euro é Alexandre Espírito Santo, economista da Way Investimentos, chefe de Finanças da ESPM-RJ e professor do Ibmec-RJ. Num momento em que poucos profissionais se arriscavam a acreditar numa alta da bolsa, em setembro, o economista não se intimidou e recomendou o investimento em ações. E foi além: disse que não se surpreenderia com um rali de fim de ano para a bolsa.

Para Espírito Santo, o acordo foi uma saída honrosa para a Grécia e traz o endividamento do país para 120% do PIB até 2020. "O bom é inimigo do ótimo, então, foi feito o possível, já que um calote parcial é melhor que um calote total", diz. "Se o mercado buscar agora os 63 mil pontos, não me surpreenderia."

Para os Estados Unidos, a perspectiva do professor é de que o crescimento se mantenha num rame-rame, mas sem recessão. E a China continuará vendendo para a Europa, assim como o Brasil. O interesse da China em ajudar a zona do euro está justamente no comércio: cerca de 30% de suas exportações são para a Europa.

Na visão de Espírito Santo, as ações de empresas boas pagadoras de dividendos se mostram interessantes, já que o juro em queda deixa os "dividend yields" (ganho apenas com dividendos) bem atraentes, avalia Espírito Santo. "Mas acho que pode ser interessante neste momento sair das ações conservadoras e ir para as mais agressivas", diz. Isso porque, com a situação da Europa sob controle, a China continuará comprando e os preços das commodities devem ficar em alta. "E, por aqui, a economia continua crescendo, apesar de em menor intensidade, e os balanços se mantêm bons", afirma ele, que vê com bons olhos as ações dos setores de consumo, construção, além de Vale e OGX.

Mas como vários pontos do acordo ainda precisam ser detalhados, o investidor pode esperar volatilidade, alerta o economista da Way Investimentos. Por exemplo, o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF) deve ser multiplicar em até cinco vezes, mas não se sabe como esse aumento será feito. Além disso, não se sabe como funcionará o socorro feito pelo fundo aos países e bancos em dificuldade.

Pontos relevantes ainda não foram esclarecidos, alerta Leonardo Sapienza, economista-chefe do banco Votorantim. Ele cita, por exemplo, que não há certeza que o corte de 50% da dívida grega será suficiente. "Além disso, qual será a função do Banco Central Europeu (BCE) para garantir a implementação das medidas? Como será o aumento do fundo de estabilização?", questiona ele. "E se o perdão de parte da dívida da Grécia significa a perda da validade dos contratos de proteção (os chamados CDS)?"

Bastante cético com a implementação das medidas previstas no acordo, Sapienza acredita que a falta de detalhes, juntamente com a valorização de ontem dos mercados, é um prato cheio para que ocorram movimentos de queda dos ativos ainda mais intenso no curo prazo.