Título: Devolução de dinheiro do Noroeste vira 'leading case'
Autor: Cristine Prestes
Fonte: Valor Econômico, 14/06/2006, Legislação &, p. E1

Depois de pouco mais de seis anos de buscas, está chegando ao fim um dos mais bem-sucedidos casos de recuperação de ativos desviados e submetidos à lavagem de dinheiro em vários países do mundo. O "leading case", como está sendo considerado, refere-se à fraude de US$ 242 milhões desviados do Noroeste, descoberta em 1998 quando o banco foi vendido ao Santander. No sábado, durante a 9ª Conferência de Crimes Transnacionais em Madri, na Espanha, promovida pela Internacional Bar Association (IBA) - associação internacional de advogados - o caso será apresentado pelos profissionais que participaram da recuperação do dinheiro do Noroeste.

Do total dos recursos desviados do Noroeste, US$ 190 milhões foram remetidos para fora do país e se tornaram alvo de uma tentativa de recuperação por parte dos ex-controladores da instituição - as famílias Cochrane e Simonsen -, que na época da venda do banco acabaram recebendo apenas metade do valor combinado para cobrir o prejuízo. A operação de localização, bloqueio e efetiva devolução do dinheiro aos ex-controladores começou no início de 2000 e foi comandada pelo escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, mas envolveu mais de 30 advogados no mundo e investigações em dezenas de países.

De acordo com Domingos Refinetti, advogado do Machado, Meyer que coordenou a busca internacional dos recursos, dos US$ 190 milhões enviados para fora do país, US$ 120 milhões foram localizados, US$ 90 milhões foram efetivamente recuperados e US$ 60 milhões foram devolvidos aos ex-controladores - a diferença entre os dois últimos números foi paga em despesas e honorários de advogados. O dinheiro foi localizado nos Estados Unidos e Suíça - onde tudo que havia já foi devolvido -, Inglaterra - onde ainda está pendente apenas a venda de uma casa - e na Nigéria - onde ainda há bens sendo vendidos e outros pendentes de bloqueio.

O caso do Noroeste ficou famoso pelo montante de recursos desviados - a metade do patrimônio do banco - em uma época em que temas como lavagem de dinheiro e fraude em operações contábeis ainda não faziam parte da rotina das empresas. O desvio foi imputado ao ex-diretor do banco, Nelson Sakagushi, que, junto com subordinados, teria feito sumir a maior parte do dinheiro a partir de uma agência da instituição nas Ilhas Cayman. De 1995 a 1997, ele teria utilizado a agência do banco em Cayman - usada para captar dólares para as operações brasileiras que ficavam depositados em contas bancárias nos Estados Unidos - para fazer transferências ilegais de dinheiro. Segundo Refinetti, o dinheiro saía das Ilhas Cayman com destino a "lavadores" na Suíça, Reino Unido, Hong Kong e Cingapura e chegava à Nigéria, onde dois nigerianos recebiam os recursos. Sakagushi cumpriu pena de 25 meses de prisão na Suíça, onde foi condenado por lavagem de dinheiro, e retornou ao Brasil, onde responde em liberdade a uma ação penal por gestão fraudulenta. Os dois nigerianos estão presos. Na Nigéria, país conhecido como destino de "dinheiro lavado", o caso tomou tamanha proporção que o governo criou uma força-tarefa para combater esse tipo de crime - a Economic Financial Crimes Comission (EFCC).