Título: Lei trouxe avanços, mas disputa pela gestão continua
Autor: Cezar , Genilson
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2011, Especial, p. F1

Há um consenso de que a Lei do Saneamento (Lei 11.445 sancionada em janeiro de 2007 regulamentada em junho de 2010) foi um avanço ao estabelecer o marco regulatório do setor no Brasil, após 20 anos de vácuo legal com a extinção do Plano Nacional do Saneamento (Planasa), em 1986.

Entre vários aspectos, a lei estabeleceu as diretrizes gerais para a prestação dos serviços por Estados, municípios e o setor privado, criando as condições para a renovação dos contratos de concessão que começaram a vencer a partir de 2005. Mas a lei não conseguiu resolver em definitivo uma questão crucial: a quem cabe a titularidade do saneamento.

De acordo com especialistas, os artigos 29 e 30 da Constituição, que definem as competências de Estados e municípios, preveem que a titularidade da gestão do saneamento cabe ao município. Mas alguns Estados questionam essa titularidade. Cidades do interior do Paraná e Rio Grande do Sul também tentam impor regras que impedem os municípios de arbitrar sobre os serviços de saneamento.

"A Lei 11.445 deixa claro que a responsabilidade pela concessão do saneamento é do município, mas não tratou das áreas metropolitanas porque não houve acordo. Para que se conseguisse fechar a lei, que já estava em discussão há dez anos, optou-se por deixar esta questão ser definida na Justiça onde já tramitavam duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal", lembra Edison Carlos, presidente do Instituto Trata Brasil, movimento em prol da universalização do acesso à coleta e ao tratamento de esgoto.

As duas Adins que tramitam no STF envolvendo os Estados do Rio e da Bahia estão longe de um desfecho. A Adin 1842, que dispõe sobre a região metropolitana do Rio bem como de dispositivos que disciplinam serviços públicos de transporte e de saneamento básico no Estado, está há 13 anos em análise no STF. Já a Adin 2077 discute o interesse local do saneamento na Bahia e questiona a emenda constitucional criada em 2001, quando houve a tentativa de se privatizar a Embasa.

"Não há nenhuma dúvida de que a titularidade é do Estado. O sistema metropolitano é interligado. No Rio, o único centro produtor é o do Guandu. As leis não superam a lógica e a engenharia. Fechamos um acordo de cem anos com a capital e os municípios da região metropolitana estão fechados, na maior parte. A melhor solução é a da concessionária estadual, temos cobertura de água de 90%, de coleta de esgoto em 76% e de tratamento 59%", defende Wagner Victer, presidente da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), do Rio.

Para Gesner Oliveira, coordenador do grupo de economia, saneamento, energia e soluções ambientais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-presidente da Sabesp, a tendência é que seja aprovada uma solução que aponte para uma competência compartilhada. "Alguns Estados como São Paulo e o Rio se anteciparam. Em São Paulo fechamos um acordo com a prefeitura da capital em 2009 entendendo que valia a pena o acordo independente da decisão do STF", diz Oliveira.

Um sinal nesta direção é a posição da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe), que já defendeu a posição a favor dos Estados e hoje caminha para a tese do compartilhamento segundo Abelardo de Oliveira Filho, presidente da entidade e da Embasa, a concessionária da Bahia.

Mas em relação às agências reguladoras, a posição da Aesbe é pela agência municipal. Alguns municípios consideram que a agência estadual poderá ficar à mercê do poder da operadora estadual e vêm criando suas próprias agências, como permite a Lei do Saneamento, ou se consorciando em agências regionais como ocorreu em Santa Catarina onde foi criada a ARIS - Agência Intermunicipal de Saneamento.