Título: Dilma procura rumo próprio na diplomacia
Autor: Exman,Fernando
Fonte: Valor Econômico, 10/10/2011, Brasil, p. A5

A presidente Dilma Rousseff está há pouco mais de nove meses no cargo e só agora está colocando a política externa no centro de sua agenda. Diplomatas e alto funcionários do Palácio do Planalto, no entanto, já passaram a notar uma profunda mudança na chamada diplomacia presidencial. Saiu de cena o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que aproveitou sua popularidade e carisma, além do interesse internacional pelo fato de ser um operário que chegou à Presidência da República, para aproximar-se de países de toda sorte e tentar colocar o Brasil no centro dos debates sobre as questões políticas internacionais. No seu lugar, entrou um estilo menos personalista e que já vem sendo chamado no Itamaraty de "realismo com idealismo" ou "pragmatismo com humanismo".

Em outras palavras, a política externa de Dilma prestigia os valores tradicionais da diplomacia brasileira, como os direitos humanos e a democracia, mas busca com "muita disposição" e "disciplina" os interesses comerciais e políticos do país. Embora às vezes passe a imagem de estar pouco à vontade nos cerimoniosos eventos oficiais, a presidente faz questão de finalizar pessoalmente seus discursos. E faz questão de passar duros recados a seus interlocutores. Exemplos disso foram as cobranças a líderes europeus por decisões que deem um fim à crise financeira global em seu recente périplo pela Europa e o apoio à criação do Estado palestino na Assembleia-Geral das Nações Unidas.

Após reuniões privadas da presidente com líderes estrangeiros, diz um auxiliar direto da presidente, os interlocutores de Dilma não escondem a surpresa que tiveram com seu conhecimento técnico sobre o combate à crise financeira mundial. Antes, diplomatas de outros países tentam prever se haverá entrosamento entre a presidente e seus chefes. "Ela não está lá para se promover. Ela quer mostrar o Brasil e os interesses do Brasil. Ela não está lá para agradar ou desagradar", explicou um diplomata

Pelo menos por ora, Dilma tem escolhido a dedo seus interlocutores no cenário internacional. Recebeu em Brasília o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e visitou a China e os países do Mercosul. À margem da Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, reuniu-se com o presidente da França, Nicolas Sarkozy, e o primeiro-ministro britânico, David Cameron. Na semana passada, fez seu primeiro "tour" pela Europa. Encontrou-se com as principais autoridades da União Europeia, visitou a Bulgária por questões sentimentais e seguiu para a Turquia, país com o qual o Brasil pretende ampliar laços políticos e econômicos.

Em todos esses casos, a presidente buscou saber o que cada país ou bloco poderia oferecer ao Brasil e quais pautas tenderiam a entrar na agenda. Só então desenhava sua estratégia para os encontros. Também não foram raras as vezes que, ao conversar com o ministro Antonio Patriota (Relações Exteriores), Dilma perguntou o que de concreto o país obteria com algumas das iniciativas da chancelaria brasileira.

"[Nos encontros com líderes estrangeiros] ela não é nada além do que é normalmente. Não é artificial. Ela tem um estilo próprio e sabe o que quer", disse o diplomata.

Sua forte personalidade também transparece nas viagens internacionais. Assim como ocorre no Brasil, Dilma tem evitado a imprensa. O costume de Dilma de proibir que seus ministros deem declarações à imprensa, no Brasil, também tem se reproduzido nas viagens internacionais.

No entanto, diplomatas alertam que ainda é cedo para saber se a presidente manterá esse estilo até o fim do mandato. Olhando para o passado, dizem, está claro que o ex-presidente Lula valeu-se da questão pessoal para agradar a todos, independentemente da linha ideológica do interlocutor.

Manteve, por exemplo, bons relacionamentos pessoais com o ex-presidente americano George W. Bush e com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Desse modo, tentou colocar o país no centro das negociações mais complexas do cenário internacional, como a questão dos direitos humanos no Irã, com resultados negativos algumas vezes.

A diplomacia presidencial conduzida por Fernando Henrique Cardoso foi diferente, avaliam os diplomatas. O período FHC foi marcado pelo respeito político e acadêmico que despertava em seus interlocutores pelo mundo e a diplomacia foi bastante centrada na figura do presidente, ancorada em suas qualidades pessoais e traquejo internacional.

No que diz respeito aos interesses do Brasil, foi uma política diversificada, voltada para assuntos comerciais, com intensa participação na Organização Mundial do Comércio (OMC), e variada pauta política, com presença no continente sul-americano, mas com significativa aproximação, até pessoal, com as grandes potências.