Título: Sonhos destroçados
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 26/08/2010, Mundo, p. 30

Criminosos executam 72 imigrantes ilegais que tentavam chegar aos EUA. Cônsul confirma quatro brasileiros entre os mortos

Faltavam apenas 160km para que os 76 imigrantes ilegaisprovenientes de Brasil, Equador, Honduras e El Salvadorcomeçassem a experimentar o chamado American dream. Cada um pagou cerca de US$ 5 mil a umcoiote, criminoso que os ajudaria a atravessar a fronteira entre o México e os Estados Unidos.Mas o sonho foi massacrado, supostamente pelos narcotraficantes do cartel Los Zetas. Na última segundafeira, militares daMarinha mexicana encontraram72 corpos dos imigrantes (58 homens e 14 mulheres) dentro de uma fossa, em um rancho situado a 22km da cidade de San Fernando, no estado deTaumalipas.

Ementrevista ao Correio, por telefone, o embaixador Márcio Lage, cônsul geral do Brasil no México, confirmou que quatro brasileiros estão entre os mortos. A informação que temos da Secretaria das Relações Exteriores do México é de que são quatro, mas ainda não foram identificados, nem sabemos ainda se são homens ou mulheres, disse o diplomata.

O governo mexicano colocou à disposição dos quatro países representantes consulares para verificar a documentação das pessoas mortas, acrescentou. Segundo ele, a informação sobre a nacionalidade das vítimas deve ser divulgada hoje.

Estou enviando o nosso vice-cônsul (João Carlos Zaidan) para região, comentou Lage.

A Procuradoria-Geral da República e aMarinha ainda investigam as circunstâncias da chacina. O equatoriano Luis Fredy Lala Pomavilla, sobrevivente da matança, contou aoMinistério Público que o terror teve início quando os imigrantes encontraram pelo caminho um comboio com homens fortemente armados.Ogrupo teria sido levado ao encontro do chefe de Los Zetas.Após interrogálos, o suposto líder ofereceu-lhes US$ 1 mil por 15 dias de trabalho como pistoleiros.

Diante de uma negativa, o criminoso ordenou que os estrangeiros fossem imobilizados e amordaçados. Pomavilla disse que, nesse momento, ouviu os tiros.

Por meio de um comunicado, aMarinha revelou ter localizado os corpos depois que um homem chegou ao posto de controle, emuma rodovia, com ferimentos à bala. Apoiados por unidades aeronavais, os militares se dirigiram ao local indicado por Pomavilla e foram recebidos a tiros. Após repelirem várias agressões, detiveram um suposto delinquente menor de idadeque se encontra à disposição da Procuradoria Geral daRepública, afirmaa nota, segundo a qual três criminosos e ummilitar morreram.

Além dos 72 corpos, os militares apreenderamseis carabinas M-4, três fuzis AK-47, sete escopetas calibre 12, cinco rifles calibre 22, 101 carregadores de armas, 2 cintas de munição, 6.649 cartuchos, unformes camuflados e quatro camionetas uma delas idêntica às viaturas da Secretaria da DefesaNacional.

Medo O cartel Los Zetas tem espalhado o pânico no estado de Tamaulipas. Também por telefone, o Correio falou com o fazendeiro O.C.ele pediu para não ser identificado , que mora a apenas 30km do rancho onde os corpos foram descobertos.

Aqui a situação é caótica. Estamos enfrentandoumaguerra entre o grupo Los Zetas e o cartel do Golfo. Os combates começaram em fevereiro, relatou.

Os Zetas são praticamente donos do Estado.

Eles controlam as rodovias, extorquem, matam e sequestram. O que aconteceu com os 72 imigrantes é apenas a ponta do iceberg, acrescentou.

O.C. afirmaque a atmosfera na fronteira é horrível.

Os criminosos passam de rancho em rancho capturando menores e forçando-os a trabalhar para eles, descreveu. Os combates entre as forças federais e o cartel Los Zetas ocorrem entre as cidades de San Fernando e Reynosa, já que os narcotraficantes querem espalhar seus negócios para o norte, disse. Sob condição de anonimato, uma moradora deMatamoros, vizinha a San Fernando, afirmou estar apavorada. Na noite passada (terça-feira), granadas foram lançadas sobre uma ponte. É claro que temos medo, e muito!

Eles extorquem, assassinam e sequestram. O que aconteceu com os 72 imigrantes é a ponta do iceberg O.C., fazendeiro mexicano que vive a 30km do rancho onde estavam os corpos.