Título: Reflexos da não-cumulatividade do PIS/Cofins
Autor: Edison C. Fernandes
Fonte: Valor Econômico, 26/06/2006, Legislação &, p. E2

O problema a ser aqui enfrentado foi suscitado por nós em estudo técnico publicado em fevereiro de 2003, portanto, logo após a adoção (e entrada em vigor) da sistemática de não-cumulatividade para a Contribuição para o PIS, por meio da Lei nº 10.637, de dezembro de 2002. Quase dois anos depois, quando da entrada em vigor da sistemática de não-cumulatividade da Cofins, trazida pela Lei nº 10.833, de 2003 (fevereiro de 2004), o problema se agravou e, em julho do mesmo ano de 2004, o Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) pronunciou-se a esse respeito, por meio da Interpretação Técnica nº 01/04; novamente nos manifestamos, dessa vez em artigo publicado por via eletrônica, contestando a solução orientada pelo referido Instituto, sendo esse artigo o texto mais consultado à época. Tendo em vista a repercussão do problema e da solução por nós apresentada, decidimos divulgar o nosso entendimento.

Dentre as diversas sistemáticas de não-cumulatividade (neutralidade tributária) desenvolvidas pela doutrina, inclusive internacional, foi adotado para o caso da contribuição para o PIS e da Cofins , expressamente (conferir a Exposição de Motivos da Medida Provisória n° 135), o Método Subtrativo Indireto.

Pelo Método Subtrativo Indireto, a não-cumulatividade é alcançada por meio da concessão de crédito fiscal sobre as compras (custos e despesas) definidas em lei, na mesma proporção da alíquota que grava as vendas (receitas). Trata-se, portanto, de uma sistemática distinta daquela adotada pela legislação do IPI e do ICMS, para os quais aplica-se o Método de Imposto contra Imposto, isto é, compensa-se o montante devido na saída (vendas) com o valor efetivamente recolhido por ocasião da entrada (compras).

No caso do Método Subtrativo Indireto - adotado pela Lei n° 10.637, de 2003, e pela Lei n° 10.833, de 2004, com as alterações feitas posteriormente -, não se exige qualquer vinculação com o montante recolhido na etapa anterior para a concessão do crédito fiscal, a ponto de ser indiferente se o fornecedor é optante pelo lucro presumido, pelo SIMPLES ou se tem suas vendas isentas.

A transformação da contribuição para o PIS e da Cofins em tributos não-cumulativos teve por finalidade (novamente, conferir a Exposição de Motivos da Medida Provisória n° 66 e da Medida Provisória n° 135) a expansão da atividade comercial brasileira, quer com relação ao mercado interno quer com relação às exportações. A concessão de créditos fiscais, portanto, não objetiva garantir retorno do investimento empresarial, mas, antes, garantir a competitividade para as empresas brasileiras, liberando recursos de tributos para ser empregado como capital fixo ou capital de giro.

Dentre as diversas sistemáticas, foi adotado para o caso da PIS/Cofins o Método Subtrativo Indireto Também a destinação dos créditos fiscais concedidos, por meio da sistemática de não-cumulatividade da contribuição para o PIS e da Cofins, está prevista em lei, uma vez que, regra geral, tais créditos somente podem ser utilizados para compensar débitos a título de contribuição para o PIS e da Cofins Em resumo, a adoção do Método Subtrativo Indireto atribui ao crédito fiscal referente à contribuição para o PIS e à Cofins três características que lhe dão a sua natureza, a saber: (a) transferência de recursos públicos para as empresas privadas; (b) previsão de finalidade específica; e (c) previsão de destinação dos recursos específica.

Dadas essas características, concluímos que os créditos fiscais da contribuição para o PIS e da Cofins têm a natureza de subvenção pública. E, como subvenção pública, o seu registro contábil será como segue: Débito - ativo circulante - tributos a recuperar; e Crédito - patrimônio líquido - reserva de capital. Identificar esses créditos como subvenção pública harmoniza a sua natureza com sua finalidade e sua destinação, conforme apresentado a seguir.

Primeiro: o montante dos créditos fiscais não são submetidos à incidência de Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), o que garante a total neutralidade dessas contribuições sociais. Segundo: os recursos gerados pela concessão desse crédito público são indisponibilizados, não podendo ser revertidos aos investidores, devendo permanecer na empresa. Na utilização desses recursos concedidos pelo Poder Público, somente se poderá reduzir o saldo de prejuízos acumulados ou aumentar o capital social da empresa.

Entendemos que os efeitos prejudiciais da orientação contábil apresentada pelo Ibracon, concernente à questão acima, podem ser evitados por uma norma complementar editada pela Secretaria da Receita Federal, nos termos do artigo 100, I do Código Tributário Nacional (CTN), disciplinando a matéria.

Essa disciplina seria no sentido de que teriam os contribuintes a faculdade de considerar os créditos da Contribuição para o PIS e da Cofins, gerados em razão da sistemática de não-cumulatividade, como subvenção pública (para investimentos), registrando os respectivos valores em conta de reserva de capital. Com isso, estaria garantida a utilização desses recursos para incremento da atividade empresarial, além de não criar uma contingência com relação ao passado, pois, as empresas que já houvessem distribuído o lucro gerado com base nesses créditos, não teriam a possibilidade de recuperar o valor recolhido a título de IRPJ e de CSLL.

Edison C. Fernandes é advogado, sócio do escritório Fernandes, Figueiredo Advogados e professor da Universidade Mackenzie e da Fundação Getulio Vargas (FGV)