Título: ONU quer tropas no Líbano, mas há pouca chance de cessar-fogo
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Fonte: Valor Econômico, 18/07/2006, Internacional, p. A9

O premiê britânico, Tony Blair, e o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, propuseram ontem a formação de uma força de paz para dar fim rápido à crise entre Israel e o grupo xiita Hezbollah no Líbano. A iniciativa foi recebida com ceticismo pelos EUA e por analistas. Os desdobramentos dos últimos dias sugerem que o conflito deve se prolongar, e não que um fim rápido esteja ao alcance.

Para Blair, "a crua realidade é que a violência não vai parar, a menos que criemos as condições para que ela cesse". "O único modo [...] é enviarmos uma força internacional que possa parar o bombardeio contra Israel e assim dar a Israel uma razão para parar os ataques ao Hezbollah", disse.

Annan, que se reuniu com Blair na cúpula do G-8, em São Petersburgo, pediu aos dois lados que cessem as hostilidades para que a força de paz possa ser enviada. Ele disse que a proposta da força de paz começaria a ser discutida ontem no Conselho de Segurança.

Mas analistas observam que, como as duas partes têm controle sobre suas tropas, o fim dos ataques depende mais de vontade política que de uma força internacional, que pode servir para monitorar, mas não impor, um cessar-fogo.

Israel diz ser "muito cedo para a utilização de uma força de paz". O premiê de Israel, Ehud Olmert, já disse que os ataques ao território libanês só cessarão quando os dois soldados israelenses capturados pelo Hezbollah forem devolvidos. Para ele, "não há um limite de tempo para as ações".

Após os ataques com mísseis que o grupo xiita libanês fez contra a cidade israelense de Haifa, Olmert respondeu que "isso é um crime de guerra contra um país". "Qualquer país no mundo reagiria como estamos reagindo", disse, referindo-se aos ataques de larga escala contra infra-estrutura libanesa e alvos considerados civis.

Além de se dizer no direito de retaliar, o governo israelense condiciona o cessar-fogo ao cumprimento da resolução 1.559 da ONU, que estipula o desarmamento de todas as milícias no Líbano, inclusive do Hezbollah. Israel sabe que o grupo xiita dificilmente aceitará essa condição, o que dá ao país margem para manter a ofensiva pelo tempo que quiser.

Principal país aliado de Israel, os EUA deram sinais de que não estão levando em consideração a formação de uma força de paz, pelo menos agora. "Nossa mensagem a Israel é: defenda-se, mas pense nas conseqüências, então pedimos que use de comedimento", afirmou no sábado o presidente George W. Bush.

O mercado reagiu bem ontem a especulações de que Israel iria parar seus ataques nos próximos dias. O preço do petróleo caiu 2,3% em Nova Iorque, a maior queda em cinco semanas. A commodity atingiu níveis históricos na semana passada devido à preocupação de que o conflito possa se alastrar pelo Oriente Médio, região que produz 31% do petróleo mundial.

Em Nova York, o preço do barril para entrega em agosto caiu US$ 1,73, para US$ 75,30 o barril.

Entretanto as ações militares durante o dia - o sexto, desde o início das operações israelenses - não deram razão ao otimismo do mercado. Mísseis israelenses voltaram a atingir o aeroporto de Beirute, e ao menos 36 pessoas morreram em diversas partes do Líbano, em uma nova escalada dos ataques israelenses, em represália aos ataques contra Haifa.

Israel bombardeou portos, estradas, bases militares e centrais elétricas e novamente atacou a principal estrada entre Beirute e Damasco, que passa pelo vale do Bekaa, no leste do Líbano. Com isso, o Líbano fica praticamente isolado do resto do mundo.

A ONU disse que não consegue levar comida e água às tropas que mantém no sul do Líbano desde o fim da guerra civil no país, nem pode oferecer ajuda humanitária aos civis da região, pois Israel não garante passagem segura. A Unifil (Força Interina das Nações Unidas no Líbano) tenta negociar a ajuda das forças israelenses para os soldados internacionais.

Mesmo com as operações se deslocando para o leste do Líbano, o chefe das Forças Armadas israelenses, o general Dan Halutz, afirmou que o país não tem intenções de atacar a Síria, ao menos neste momento.

O "Yedioth Ahronoth", um dos principais jornais de Israel, afirmou que a ofensiva contra o Hezbollah destruiu pelo menos um quarto da capacidade de combate do grupo, o que seria um objetivo estratégico de Israel. Citando fontes militares, o jornal disse que, apesar dos fortes bombardeios israelenses sobre a infra-estrutura libanesa, a cadeia de comando do grupo ainda estaria intacta.