Título: Crise na Europa eleva risco de terrorismo político
Autor: Paolozzi ,Vitor
Fonte: Valor Econômico, 15/12/2011, Internacional, p. A11

Uma recente onda de ataques e ameaças contra alvos políticos e financeiros deixou a Europa em alerta, num momento em que vários países do continente implementam duras medidas de austeridade para combater o agravamento da crise da dívida. O premiê da Itália, Mario Monti, alertou para o risco de volta do terrorismo.

A situação é mais tensa na Itália. Nesta semana, Monti demonstrou preocupação com o risco do retorno da violência política. "Ameaças e intimidações representam estratégias de outras eras que não podem, e não devem, retornar", disse.

Na segunda-feira, foram interceptadas cartas contendo balas de munição enviadas ao prefeito de Roma, Gianni Alemanno, e à ministra da Justiça italiana, Paola Severino. Três dias antes, um funcionário da Equitalia, o fisco italiano, havia sido ferido na mão e no rosto por uma carta-bomba.

Na semana passada, a sede do Deutsche Bank, na Alemanha, interceptou correspondência com explosivos enviada ao CEO do banco, Josef Ackermann. A ação foi reivindicada por um grupo extremista italiano, a Federação Anárquica Informal (FAI), autor de alguns ataques nos últimos anos.

Monti, que já foi comissário europeu de concorrência e diretor do banco Goldman Sachs, luta pela aprovação até o Natal de um pacote de austeridade que prevê cortes de € 30 bilhões no Orçamento do país. No ano que vem, ele pretende implementar uma série de medidas para liberalizar o mercado de trabalho, tema que já provocou ações violentas de grupos de extrema-esquerda no passado.

O alvo da insatisfação agora parece ser o "governo dos bancos". Substituto de Silvio Berlusconi, que renunciou em novembro, Monti formou um gabinete de tecnocratas que inclui o ex-CEO do banco Intesa Sanpaolo, o segundo maior do país, e dois outros ex-funcionários do banco. Nos últimos dias, anarquistas picharam agências do Intesa com os dizeres "abaixo os banqueiros ladrões!".

Recentemente, houve também ataques com motivações políticas na França na Alemanha. Na segunda-feira, a polícia parisiense detonou um pacote com explosivo de baixa potência enviado para a embaixada grega. A polícia alemã, por sua vez, investiga uma rede neonazista responsável pela morte de dez estrangeiros e por uma série de roubos a banco no país.

David Lea, analista-sênior para a Europa da Control Risks, consultoria de segurança com escritórios diversas partes do mundo, destaca que os ataques já vêm acontecendo há algum tempo. "O terrorismo de extrema esquerda vem aumentando numa série de países europeus já há dois, três anos, o que mais ou menos coincide com o início da crise", disse ao Valor.

Embora faça a ressalva de que não pode afirmar que existe uma conexão causal, ele não descarta essa possibilidade nos casos na Itália e na Alemanha. "Esses são os dois países-chaves para o terrorismo de esquerda, particularmente nos anos 70 e 80", disse, destacando um "paralelo entre as condições econômicas de antes e agora".

Uma das causas da forte expansão do terrorismo político na Europa, nos anos 70 e 80, foi justamente a crise econômica na região, que começa no final dos anos 60 e se agrava com os choques do petróleo nos anos 70.

"Eu não espero um retorno das Brigadas Vermelhas, mas há o risco de ataques mais ou menos organizados contra pessoas ou instituições vistas como símbolos das finanças globais", disse Federico Niglia, professor de um curso sobre terrorismo na St. John"s University de Roma. "Nesse sentido, o governo tecnocrata pode ser visto como um alvo, assim como executivos de bancos e multinacionais."

Veronica Soria, pesquisadora italiana do Royal United Services Institute (Rusi), no Reino Unido, também diz que não se trata de casos isolados e aponta que essa nova série de atentados traz um novo desafio aos governos europeus, ao impor uma mudança de foco nas ações de contraterrorismo, que antes se concentravam na ameaça de grupos islâmicos. "Desde o 11 de Setembro, a principal ameaça para os países europeus é o terrorismo ligado à Al Qaeda. Mas isso pode ter levado a subestimar outras fontes", disse ao Valor . "O Reino Unido está tentado recalibrar e reequilibrar a estratégia de prevenção, direcionando-a a outras formas de terrorismo, como o mais politicamente motivado pela extrema-esquerda ou a extrema-direita."

Para os analistas, serão maiores também as chances de atentados promovidos por grupos menores ou menos organizados, ou ainda por indivíduos agindo por conta própria, como o norueguês Anders Breivik, que matou quase 90 jovens do Partido Trabalhista em um ataque no mês de julho.

"Tem se tornado mais comum indivíduos solitários radicalizarem, publicarem suas opiniões na internet e promoverem ataques caseiros, sem necessariamente fazer parte de um grupo", afirmou a italiana Soria. "Quando os ataques vêm de forma aleatória, fica realmente difícil de controlar e prevenir, como aconteceu na Noruega."