Título: País estuda apoio a sócios menores do Mercosul
Autor: Sergio Leo
Fonte: Valor Econômico, 19/06/2006, Brasil, p. A3

O Brasil assumirá a presidência temporária do Mercosul, no próximo mês, com um projeto de apoio às economias menores do Mercosul, Uruguai e Paraguai, informou ao Valor o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. É a mais nova tentativa de responder às críticas dos governos uruguaios e paraguaios, de falta de resultados econômicos com a integração incompleta no bloco do Cone Sul. O governo quer aumentar o financiamento para investimentos e melhoria da estrutura produtiva dos dois países, diz Amorim, que, nas últimas semanas, tenta vencer a resistência de outros ministérios ao projeto.

"É decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva marcar essa Presidência com um novo arranjo para os sócios menores do Mercosul", afirmou o ministro. "O que pensamos é em medidas para maior integração produtiva na região", adiantou Amorim.

No fim desta semana, o ministro viajará a Montevidéu, onde deverá discutir com o governo uruguaio as demandas daquele país. Viaja com uma comitiva de integrantes de outros ministérios, e dois dirigentes do BNDES, de quem o Itamaraty espera maior esforço na formulação de programas para estimular investimentos na vizinhança. Em 2005, o banco liberou, em apoio a exportações de produtos e serviços na região, pouco mais de US$ 172 milhões, menos da metade do que o banco esperava liberar no ano passado. Também é pequena a liberação de empréstimos do Proex, a linha de financiamento administrada pelo Banco do Brasil, com recursos orçamentários.

A participação do BNDES foi estimulada por Lula e seus assessores no Palácio do Planalto. Mas ainda não há nenhuma orientação concreta para que o banco crie ou altere linhas de financiamento capazes de apoiar o aumento da capacidade produtiva nos sócios menores do Mercosul.

No Itamaraty, há desconforto com a falta de resultados nos esforços de apoio à integração nos países menores, que têm demonstrado insatisfação com o Mercosul. Em maio, Amorim, em depoimento no Senado, chegou a dizer que também estaria desiludido com o Mercosul se fosse uruguaio, reclamou da falta de uma "visão mais aberta" no país em relação ao bloco e criticou a política industrial brasileira por tratar os sócios do Mercosul como "apêndice", sem fazer o "suficiente" para Uruguai e Paraguai. "Falamos muito e fizemos pouco", desabafou, cobrando maior apoio dos outros ministérios.

Amorim busca uma tradução para o que vem chamando de "new deal" no Mercosul. O termo em inglês é mais conhecido pelo programa que, nos anos 30, foi lançado nos EUA pelo presidente Franklin Roosevelt, com medidas de assistência social e reformas econômicas e financeiras destinadas a superar os efeitos da grande recessão no país.

O desconforto dos diplomatas é alimentado pela distância entre o pequeno desembolso feito pelo BNDES e Banco do Brasil e as metas anunciadas por Lula, que chegou a assinar protocolos oferecendo até US$ 1 bilhão em empréstimos à Venezuela, US$ 1 bilhão à Argentina e US$ 600 milhões à Bolívia.

Para a Venezuela, foram aprovados financiamentos para exportação de equipamentos destinados à hidrelétrica La Vueltosa (US$ 121 milhões, dos quais nada havia sido desembolsado até o início do ano), US$ 78 milhões para financiar as obras da Odebrecht para a linha 3 do metrô de Caracas e US$ 20 milhões para a venda de colheitadeiras pela Cotia Trading ao país. Nos últimos três anos, também foram liberados US$ 50 milhões de um total de US$ 77 milhões aprovados em 2001 para a linha 4 do metrô da capital venezuelana. No total, cerca de um quinto do que se esperava.

Não se pode dizer que não houve esforço no governo: em 2005, quando anunciou a moratória e viu fecharem-se as fontes de recursos para a Argentina, o governo Kirchner conseguiu do BNDES aprovação de US$ 237 milhões para financiar bens e serviços de engenharia em dois gasodutos, um deles, o TGS (beneficiado com o empréstimo de US$ 200 milhões), operado pela subsidiária argentina da Petrobras.

Necessários, com urgência, para minimizar o risco de apagão energético, os tubos (da Confab) e serviços de engenharia e construção (da CNO) foram garantidos no prazo necessário, depois que o governo argentino aceitou usar, como garantia, as linhas do CCR, um convênio entre bancos centrais que dá segurança à operação. Foram, porém, os únicos financiamentos concedidos até hoje, do total prometido à Argentina.

A Bolívia, país altamente endividado, a quem o BNDES não pode emprestar por não atender aos requisitos mínimos de garantia, recebeu bem menos recursos, cerca de US$ 25 milhões entre 2005 e o início de junho deste ano, em desembolsos do Proex-Financiamento, administrado pelo Banco do Brasil, que financia a venda de produtos e serviços àquele país com recursos orçamentários. Foi o país que mais recebeu recursos do Proex em 2006, seguido pela Argentina, com US$ 2,9 milhões (US$ 1 milhão, em 2005).

O CCR também garantiu empréstimo de US$ 50 milhões ao Equador, para obras do aeroporto de Tena (contrato obtido pela Odebrecht), que chegou a ser adiado pela crise que depôs, em 2005, o presidente Lucio Gutierrez. O Equador também recebeu grandes desembolsos (quase US$ 150 milhões) de um empréstimo de US$ 243 milhões, aprovado em 2000 para construção da hidrelétrica San Francisco. O Uruguai não recebeu nada; e o Paraguai, a quem o BNDES esperava financiar a construção de até três estradas de integração, ficou apenas com os desembolsos para a chamada Ruta 10, contratada em 2001.