Título: Resultado fraco reflete ação do governo no começo do ano, diz economista
Autor: Lamucci ,Sergio
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2011, Brasil, p. A6

A perda de fôlego da economia brasileira no terceiro trimestre teve algum impacto da crise externa, mas reflete basicamente as medidas adotadas pelo governo no começo do ano para conter a demanda, diz o diretor de macroeconomia da LCA Consultores, Celso Toledo. Segundo ele, o ciclo de alta de juros ? já revertido -, as medidas de restrição ao crédito - que também começaram a ser levantadas - e a política fiscal mais restritiva explicam em grande parte por que o Produto Interno Bruto (PIB) ficou estável no período de julho a setembro, na comparação com os três anteriores, feito o ajuste sazonal. O desempenho positivo das exportações, sobretudo de produtos básicos, indica que o comércio exterior -um dos principais canais de contágio - foi pouco atingido pela piora do cenário internacional.

Toledo considera "totalmente implausível" um crescimento de 3% em 2011, "dados os fundamentos econômicos atuais". Segundo ele, "o consumo e investimento permanecerão fracos e as exportações, que seguraram a barra no terceiro trimestre, deverão fraquejar no quarto". Ele tampouco vê como possível uma expansão do PIB de 5% em 2012, como gostaria de ver o ministro da Fazenda, Guido Mantega. "Se o governo adotar políticas para estimular a economia a crescer nesse ritmo, a meta de inflação não será cumprida. E um ponto importante é que um crescimento de 3% no ano que vem já embute a expectativa de reação expressiva da economia a partir do segundo trimestre."

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: A desaceleração do PIB no terceiro trimestre foi generalizada, tanto pelo lado da oferta como pelo lado da demanda. Ela reflete mais as medidas adotadas pelo governo desde o começo do ano para reduzir o ritmo de crescimento (alta de juros, medidas de restrição ao crédito, esforço fiscal maior) ou sofreu um impacto expressivo da deterioração do cenário externo?

Celso Toledo: É implausível afirmar que a crise não tenha tido impacto. A possibilidade concreta de um cenário de ruptura colocou os agentes econômicos em estado de alerta, sobretudo empresas, e isso deve ter afetado negativamente alguns gastos. Essa incerteza deverá continuar deprimindo o crescimento por mais um tempo. Mas o outro canal de transmissão de crises externas, o comércio exterior, não mostrou grande contágio. Pelo contrário, as exportações, sobretudo puxadas pelos produtos básicos, tiveram desempenho expressivo. Nesse cenário, a parte do leão da desaceleração deve-se às medidas de contenção adotadas no início do ano. Havia muita dificuldade em estimar o impacto das medidas macroprudenciais sobre a economia, que demorou mais do que se imaginava, impactando mais o terceiro trimestre. As empresas planejaram um Natal mais forte do que o que deve efetivamente ocorrer, o que levou a um acúmulo de estoques forte, o motivo pelo qual, acredito, o governo decidiu estimular o consumo e o crédito. No segundo semestre, além dos estoques, até o mercado de trabalho começa a acusar o golpe.

Valor: O investimento, que cresceu mais de 21% em 2010, desacelerou com força neste ano. Por que houve essa perda de fôlego tão forte desse componente da demanda? É algo que deve se recuperar em 2012?

Toledo: O investimento público esfriou bastante por conta do ajuste de arrumação das contas do governo. Como se sabe, o governo não tem muita margem de manobra para fazer ajustes a não ser nos investimentos. Os demais gastos são "carimbados". O setor privado sofreu com as medidas de contenção do crédito e, mais recentemente, acusou o golpe da crise externa. Indicadores divulgados mensalmente sugerem que os investimentos caíram fortemente em setembro, como é o caso das importações e da produção de bens de capital. Os investimentos certamente apresentarão recuperação expressiva no ano que vem se não houver um cenário de ruptura ? a nossa hipótese principal. O dinamismo dos investimentos públicos dependerá da decisão do governo de cumprir ou não a meta "cheia" de superávit primário [na casa de 3% do PIB]. Saberemos isso em janeiro. Meu palpite é que o governo está demonstrando bastante preocupação com o esfriamento da economia, como se vê pelas medidas tomadas recentemente, e deverá pisar no acelerador no ano que vem. A reversão da política monetária e a adoção de uma política fiscal e talvez de uma política de crédito também mais expansionista deverão fazer o investimento privado crescer com mais força a partir do segundo trimestre.

Valor: O resultado do PIB no terceiro trimestre aponta para um crescimento menor que 3% neste ano ou ainda é possível um número um pouco mais alto?

Toledo: Para crescer 3% em 2011 seria necessário ocorrer uma aceleração do crescimento no quarto trimestre em relação ao terceiro totalmente implausível, dados os fundamentos econômicos atuais. O consumo e investimento permanecerão fracos e as exportações, que seguraram a barra no terceiro trimestre, deverão fraquejar no quarto. Salvo surpresas de natureza estatística (revisões de dados para trás, efeitos sazonais), é remota a chance de crescimento superior a 3% nesse ano.

Valor: O governo fala em crescimento de 5% em 2012. É possível ou o sr. acredita num número mais próximo de 3%? Por quê?

Toledo: Para crescer 5% em 2012, o PIB deveria se expandir, em média, o equivalente a 7,5% em termos anualizados durante os quatro trimestres [o equivalente a 1,8% por trimestre, na taxa não anualizada] Dados os fundamentos da economia global, isso é praticamente impossível. Se o governo adotar políticas para estimular a economia a crescer nesse ritmo, a meta de inflação não será cumprida. E um ponto importante é que um crescimento de 3% no ano que vem já embute a expectativa de reação expressiva da economia a partir do segundo trimestre. No final do ano, esperamos que o Brasil estejam crescendo em ritmo anualizado da ordem de 4% a 4,5%.

Valor: Os juros estão em queda, os gastos públicos vão acelerar, o governo está revendo as medidas macroprudenciais e anunciou redução de tributos para estimular o consumo. Isso vai reacelerar a economia de modo importante em 2012? Por quê?

Toledo: Se não houver cenário de ruptura no resto do mundo, sim. Foram estas as medidas que fizeram a economia perder fôlego até agora e a reversão delas deverá fazer a demanda voltar a crescer no ano que vem.