Título: Chance de superar gargalos nos transportes em 2005
Autor: Carmen Ligia Torres
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2004, Especial Agronegócios, p. F4

Se em 2003 e em 2004 a vontade dos governantes não conseguiu avançar muito além dos discursos, há indicações de que 2005 pode marcar, de fato, o início do resgate da infra-estrutura brasileira de transportes, medida urgente para ajudar o país a engatar de vez um ciclo contínuo de desenvolvimento econômico. O orçamento do Ministério dos Transportes para 2005, inicialmente enviado para o Congresso, foi de R$ 3,5 bilhões, superior em R$ 1,3 bilhão o valor registrado para 2004, que foi de R$ 2,2 bilhões. Além disto, já estão acertados mais R$ 2,5 bilhões relativos a projetos que tiveram autorização do Fundo Monetário Internacional para serem excluídos da conta de superávit primário como despesa. A pasta conta ainda com R$ 1 bilhão do Fundo de Marinha Mercante, que será encaminhado para projetos de estímulo aos modais aquaviários. Neste item, estão incluídas obras de infra-estrutura física para viabilizar hidrovias, e outras para a área portuária marítima, além dos investimentos para o suporte à operação, com apoio à construção de 92 embarcações, cujas encomendas já feitas estão orçadas em R$ 5 bilhões.

As parcerias público-privadas também estão na mira do Ministério dos Transportes como instrumento para alavancagem de recursos, até mesmo para a aplicação na malha rodoviária. "Há projetos de rodovias que não têm sustentabilidade para o setor privado atuar dentro do modelo clássico de concessão e, nestes casos, as negociações podem se enquadrar em uma parceria nos moldes das PPPs", afirma Paulo Sérgio de Oliveira Passos, secretário-executivo do Ministério dos Transportes. Ainda em relação às rodovias, na semana passada, o Ministério dos Transportes realizou a primeira audiência pública da segunda etapa do Programa de Concessões das Rodovias Federais, por meio da qual mais 3.038 km de rodovias federais serão transferidas à operação privada. São trechos das BRs 101, 116,153, 381 e 393, nas regiões Sudeste e Sul do País. A primeira etapa do Programa de Concessão de Rodovias foi realizada em 1996 e repassou a operação de 1.491 km de estradas federais para a operação das empresas privadas. A recuperação da malha rodoviária e a melhoria das condições físicas e operacionais dos portos estão praticamente definidas para o calendário de 2005. Cerca de R$ 2 bilhões, além do orçamento, deverão ser alocados para a conservação, manutenção e recuperação de estradas, visando, especialmente, o escoamento da safra agrícola. Entre 30% e 40% dos investimentos serão em rotas que afetam as regiões produtoras de grãos, como Mato Grosso, Bahia, Maranhão, Tocantins. "As melhorias serão sentidas na próxima safra", diz Passos. Segundo ele, neste ano de 2004, dívidas com empreiteiras dificultaram até mesmo a realização de recursos previstos para aplicação da pasta. Desta forma, nos primeiros meses do ano, os desembolsos para obras estacionaram entre R$ 40 milhões e R$ 50 milhões/mês, para chegar a R$ 250 milhões somente no mês de novembro. "Passamos o ano trabalhando para ampliar os limites de desembolso e liquidar compromissos com débitos passados e, portanto, para o próximo ano o ritmo será mais satisfatório nas frentes de serviço de todo o país", afirma o secretário-executivo, adiantando que 14 mil km de rodovias serão alvo das ações do governo federal. Para os portos, a Agenda Portos detectou os principais entraves em dez portos e os recursos estão sendo aplicados, em dragagem, recuperação de pavimentos nos pátios, iluminação, melhorias de acesso, além das questões operacionais como cumprimento de regras internacionais de segurança. "Já estão sendo alocados R$ 57 milhões", diz Passos, garantindo mais recursos para o próximo ano. Para as ferrovias, o Ministério dos Transportes concentra esforços na Ferrovia Norte/Sul e na Nova Transnordestina, além de estudar aportes para o Ferroanel em São Paulo e projetos que abranjam as melhorias de traçado, a exemplo da transposição da área urbana em Belo Horizonte, trecho operado pela Ferrovia Centro-Atlântica. Passos confirma os estudos para o equacionamento dos gargalos ferroviários mas não se compromete com uma data para divulgação do documento. "Estamos discutindo os problemas e iremos investir nas áreas que são de responsabilidade do governo federal". Para as grandes exportadoras, o modal ferroviário é o que menos atende às necessidades de transporte. A pesquisa Logística e Comércio Internacional, elaborada pelo Centro de Estudos Logísticos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) registra que 68% das 100 maiores empresas exportadoras e importadoras considera que o transporte ferroviário não atende às suas necessidades. Outros 25% acreditam que atende precariamente e apenas 7% consideram o atendimento adequado. "Nos períodos de safra, temos muita dificuldade em conseguir disponibilidade de fretes ferroviários", afirma José Cícero Aderaldo, gerente comercial da Cocamar, cooperativa paranaense que exporta entre 20% e 30% de sua produção de 1 milhão de t/ano de grãos pelo Porto de Paranaguá. Para acessar o terminal portuário, o ideal para a Cocamar é embarcar os grãos pelos trilhos operados pela ALL, que passam nas cercanias da unidade central, em Maringá/PR. Quando isto não é possível, a carga embarca em caminhões, gerando custos adicionais de frete ocasionados pela demora em chegar até o porto. "As filas de veículos nas rodovias, nesta época, aumentam as despesas, pois temos que pagar os dias parados do caminhão", informa Aderaldo. As 11 operadoras de ferrovias reclamam da falta de recursos do governo federal para agilizar a movimentação de carga pelos trilhos. Segundo Rodrigo Vilaça, diretor-executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), os avanços foram muitos, como ampliar a participação do modal para 24% na matriz de transportes, puxados pelo crescimento de 94% na produtividade dos vagões, desde o início das concessões, em 1996. Na pesquisa Logística e Comércio Internacional, os portos também foram muito criticados. Entre os problemas mais graves apontados, aparecem congestionamentos nas áreas retroportuárias, deficiência de armazenagem, morosidade para liberação das cargas, tarifas e greves. "Chegamos a esperar 27 horas no porto de Santos para embarcar nossos contêineres", diz Jeremiah O´Callaghan, diretor da unidade de carne da Coimex.