Título: Companhias querem desoneração de juros sobre o capital
Autor: Marta Watanabe e Nelson Niero
Fonte: Valor Econômico, 15/12/2004, Brasil, p. A5

As companhias de capital aberto deverão pleitear junto ao governo federal a reversão da cobrança de PIS e Cofins nos juros sobre capital próprio prevista por decreto editado em julho. A exigência, que já levou a mineradora Vale do Rio Doce e a sua holding controladora Valepar à Justiça, fez com que um grupo de 12 empresas reunidas na Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) elaborasse um levantamento sobre o impacto da nova exigência. O estudo servirá como argumento para solicitar a desoneração dos juros. A cobrança das duas contribuições fez com que as empresas perdessem uma forma de capitalizar valores que, além da relativa simplicidade, oferecia uma vantagem adicional: a dedução dos juros no Imposto de Renda (IR) e na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) devidos pela empresa que distribuía os lucros. Em razão das vantagens tributárias, o mecanismo de juros sobre capital próprio, criado em 1995, é usado pelas empresas como alternativa ao pagamento dos tradicionais dividendos. Muitas vezes, porém, os juros são apenas creditados e voltam a ser capitalizados na empresa. O mecanismo é utilizado porque o lançamento dos juros permite que a empresa pagadora os deduza do IR e da CSLL devidos. Em 2003 foram pagos R$ 14,96 bilhões em juros sobre capital próprio. O montante gerou arrecadação de R$ 2,24 bilhões em IR na fonte no período. O problema é que a cobrança de 9,25% de Programa de Integração Social (PIS) e de Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) retira a vantagem da utilização dos juros sobre capital próprio para a dedução no IR e CSLL. O PIS e a Cofins são exigidos nos juros sobre capital próprio pagos somente a outras empresas nacionais. Isso atinge mais os grandes conglomerados brasileiros, nos quais os juros não são pagos diretamente a um sócio pessoa física, mas sim a uma cadeia de empresas, o que provoca uma cobrança de 9,25% de PIS e Cofins a cada pagamento de juros, sem direito a crédito. Ou seja, de forma cumulativa. Foto: Carol Carquejeiro/ Valor

Alfried Plöger: "Essa exigência é uma contra-reforma porque estabelece uma hipercumulatividade de tributos" A discussão existe desde julho, quando um decreto presidencial isentou as receitas financeiras de PIS e Cofins, mas fez duas exceções: o hedge e os juros sobre capital. Para escapar da tributação, a companhia poderia captar recursos por mecanismos que geram dívidas, como empréstimos ou emissão de debêntures. Caso a empresa queira manter o pagamento de juros sobre capital próprio, a saída seria um planejamento fiscal e societário no qual os juros são pagos a uma holding intermediária com sede no exterior e depois repassados a uma empresa brasileira. As empresas estrangeiras não pagam PIS e Cofins nas receitas relativas a juros sobre capital próprio. O estudo da Abrasca mostra que, com a exigência de PIS e Cofins, a carga tributária nos juros sobre capital aumentou de 24,5% para 29,125%. O cálculo leva em conta não só a tributação na empresa pagadora como também na companhia que recebe os valores. O estudo destaca que enquanto a tributação nos juros sobre capital aumentou em pouco mais de 4,5 pontos percentuais, a tributação sobre os rendimentos de debêntures foi reduzida de 20% para 15%. O percentual vale para aplicações por pelo menos 24 meses. A desvantagem de substituir a capitalização por empréstimos ou debêntures é que esses mecanismos geram dívidas para as empresas e riscos maiores, já que os empréstimos e debêntures exigem contratos a prazo determinado e com obrigações. "São diferentes dos juros sobre capital próprio, que dão flexibilidade e possibilidade de definir valores conforme o desempenho", diz Pedro César da Sival, da ASPR Auditoria e Consultoria. Para o superintendente geral da Abrasca, Eduardo Lucano da Ponte, qualquer das medidas em substituição aos juros sobre capital próprio irão exigir negociações complexas e demandar custos. "Isso trará um caráter irreversível às operações." Ou seja, os recursos não voltarão a ser capitalizados nas empresas ou não voltarão a ser pagos a holdings brasileiras. Segundo o presidente da Abrasca, Alfried Plöger, o assunto deverá ser levado ao governo federal. A esperança das empresas é que essa cobrança de PIS e Cofins seja eliminada. "Essa exigência é uma contra-reforma porque estabelece uma hipercumulatividade de tributos." Nem todo mundo espera as negociações. A Vale já contestou o assunto e conseguiu liminar favorável. A companhia pagou, a título de juros sobre o capital próprio, R$ 2,25 bilhões relacionados aos resultados do ano passado. O argumento é o de que os juros sobre capital são créditos na conta de investimentos e não receitas financeiras, como determinou o Decreto nº 5.164/2004, de julho. A base para a alegação é uma deliberação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que classifica dessa forma os juros. A exemplo da Vale, outras grandes companhias pagaram parte de seus dividendos como juros sobre capital. Na Petrobras, dos R$ 5,647 bilhões de lucros distribuídos relativos a 2003, R$ 4,551 bilhões foram como juros sobre capital próprio.