Título: Bradesco mira crédito consignado
Autor: Maria Christina Carvalho
Fonte: Valor Econômico, 15/12/2004, Finanças, p. C1

O Bradesco anunciou ontem acordo de cessão de operações de crédito com desconto em folha no valor de até R$ 4 bilhões com o Banco Cruzeiro do Sul. Foi a quarta operação do tipo assinada em quatro dias úteis. Na segunda-feira, o próprio Bradesco fechou acordo igual com o Banco BMC, envolvendo uma carteira de R$ 2 bilhões de crédito consignado. E, na semana passada, o BMG protagonizou dois acordos semelhantes, um de R$ 1,5 bilhão com o Itaú e outro de nada menos que R$ 6 bilhões com a financeira francesa Cetelem. Os acordos conciliam dois interesses. De um lado, os grandes bancos voltam as baterias para o crédito com desconto em folha para crescer no financiamento ao consumo de pessoas físicas, complementando a onda de parcerias com o varejo. Do outro, os bancos médios que estão cedendo a carteira ganham fôlego em um momento em que os grandes investidores institucionais ainda estão retraídos, escaldados pela intervenção no Banco Santos, e alavancam o crescimento.

Com um estoque em outubro de R$ 10,9 bilhões, o mercado do crédito consignado representa apenas 10% do total de R$ 108,5 bilhões de empréstimos a pessoas físicas com recursos livres do mercado financeiro. Mas, o potencial de crescimento é enorme e, disse o presidente do Bradesco, Márcio Cypriano, o risco de inadimplência é baixíssimo. Neste ano, o crédito consignado saltou 72,8% em comparação com o estoque de R$ 6,319 bilhões de janeiro. Ao final do ano, deve atingir R$ 12 bilhões, estima o mercado. Tradicionalmente, as operações eram feitas com funcionários de empresas públicas. O governo Lula abriu o mercado para o setor privado, no ano passado. E, neste ano, regulamentou as operações com aposentados e beneficiários do INSS que têm um grande potencial ainda inexplorado. Com 22 milhões de pessoas, os aposentados e beneficiários do INSS recebem mensalmente R$ 10,5 bilhões - o dobro da carteira atual de crédito consignado. "Estamos falando de R$ 120 bilhões por ano", calculou o superintendente de crédito consignado do Santander Banespa, Wilson Carvalho, que está comemorando fechar o ano com uma carteira de R$ 400 milhões, sem ainda entrar no segmento do INSS. "Esse é o crédito mais nobre", disse o diretor superintendente do Cruzeiro do Sul, Adolpho Nardy, referindo-se à baixa inadimplência. Para o Bradesco, o acordo com o Cruzeiro do Sul é a quarta iniciativa tomada desde novembro para ampliar o crédito para a pessoa física, em uma rodada que começou com o acordo de financiamento das vendas da Casas Bahia, a noiva cobiçada do varejo, passou pelo acordo com a rede de varejo Salfer, de Santa Catarina e Paraná, e pela cessão de crédito com o BMC. Somando tudo, Cypriano calculou um adicional potencial de R$ 10 bilhões na carteira de crédito para pessoa física, que fechou setembro em R$ 18 bilhões. A carteira total monta a R$ 60 bilhões. A perspectiva é que pelo menos R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões desse adicional serão materializados no próximo ano, ampliando a expansão da carteira, que era projetada em 25%. Segundo Cypriano, tanto o BMC quanto o Cruzeiro do Sul atraíram o Bradesco pela especialização na área do crédito com desconto em folha. "Esse negócio exige uma logística totalmente diferente. Queimamos etapa ao fazer o acordo", explicou. O Cruzeiro do Sul opera há 11 anos no crédito em consignação e tem também acordos de cessão de crédito com a americana GE Capital, com a Cetelem e 21 outros bancos, que serão mantidos. O Cruzeiro do Sul carrega uma carteira de R$ 500 milhões mas gerou o triplo em operações, das quais fez cessão. Como um banco médio consegue esse feito é explicado pela sistemática do crédito com desconto em folha, que é vendido por cerca de 10 mil corretores ligados a 80 promotoras em repartições públicas espalhadas pelo país. "Esse era um mercado desprezado pelos grandes bancos", disse Nardy que surpreendeu-se com a rapidez do Bradesco. As negociações começaram às 15 horas e estavam concluídas quatro horas depois. A carteira de crédito consignado do Santander Banespa cresceu 50% a mais do que o mercado, disse Carvalho; e deve mais do que dobrar em 2005, atingindo R$ 850 milhões. As operações com o setor público ainda representam a maior parte do estoque (56%), mas o setor privado prevalece nos novos contratos.