Título: Setor privado quer debater salvaguardas na reunião
Autor: De Belo Horizonte
Fonte: Valor Econômico, 16/12/2004, Brasil, p. A2

Enquanto os diplomatas brasileiros preferem tirar as divergências bilaterais entre Brasil e Argentina da pauta da reunião do Mercosul, os empresários acham que este é o momento mais oportuno para resolver a questão. "Se tem havido aumento das divergências entre Brasil e Argentina, não podemos separar questões profundas como esta da discussão", afirmou Maria Tereza Bustamante. Executiva da Embraco, ela é uma das principais negociadoras dos acordos do setor de eletrônicos entre os dois países. Para Maria Tereza, a reunião do Mercosul em Belo Horizonte e Ouro Preto é "oportunidade brilhante" para discutir as salvaguardas que a Argentina quer impor, ouvindo inclusive a posição dos outros sócios - Paraguai e Uruguai. Segundo ela, o assunto extrapola interesses específicos dos dois países. "É uma infração ao marco legal do Mercosul e da Organização Mundial do Comércio", disse. "Se queremos mostrar ao mundo a imagem de que o Mercosul tem regras claras, que são respeitadas, não podemos admitir as salvaguardas", argumentou. A executiva da Embraco espera que desta cúpula saia um programa mais realista sobre as diferenças bilaterais. Segundo ela, este programa deve definir o dever de casa que cada setor tem de fazer em cada país. A cobrança do setor de eletrônicos ocorre num momento em que estão num impasse as negociações com a indústria argentina sobre as restrições impostas para a importação de lavadoras de roupa, uma medida aplicada para proteger duas fábricas locais. Os argentinos limitaram a participação brasileira em 35%. Luiz Carlos Auler Pereira, assessor de comércio exterior do Sindipeças, o sindicato das indústrias de autopeças, criticou ontem propostas para transformar o Mercosul em área de livre comércio em vez de união aduaneira. "Não nos interessa um passo atrás". O temor dos fabricantes de autopeças é que, no livre comércio, a Argentina passe a exigir maior índice de nacionalização de autopeças nos carros lá produzidos e reduza tarifas de importação para terceiros, o que prejudicaria as indústrias brasileiras que hoje exportam para a Argentina. A mesma preocupação atinge os setores de máquinas, equipamentos e químicos. Em defesa dos interesses da indústria argentina, empresários do país vizinho distribuíam ontem em Belo Horizonte cópia de documento enviado ao ministro de Relações Exteriores, Rafael Bielsa. No texto, os empresários dizem que o Brasil deve aceitar a fixação de salvaguardas a um conjunto de produtos muito afetados pela importação que debilita a indústria local. "As salvaguardas são necessárias especialmente para os setores de eletrodomésticos e calçados", diz o vice-presidente da confederação argentina de médias empresas da Argentina, Roberto Marcere. Para o presidente da Associação de Empresas Brasileiras para Integração de Mercados (Adebim), Michel Alaby, os empresários do Mercosul têm de pensar além do bloco, em vez de ficar discutindo indefinidamente as divergências internas. "O Mercosul só tem uma saída, ou se desenvolve para fora ou vai parar nos US$ 14 bilhões", disse. Segundo Alaby, há grandes oportunidades para o bloco na agropecuária e agroindústria para explorar destinos como Oriente Médio. "Podemos abrir novas possibilidades se agirmos sem imediatismo".