Título: Itamaraty vê acordo EUA-Austrália como modelo para Alca
Autor: Raquel Landim, Daniel Rittner e Ivana Moreira
Fonte: Valor Econômico, 16/12/2004, Brasil, p. A6

O Itamaraty enxerga o acordo entre Estados Unidos e Austrália como uma referência do tipo de negociação "possível" com os americanos na Área de Livre Comércio das Américas (Alca). "Não é o melhor modelo, mas é o possível", diz um negociador do ministério. Ele explica que os australianos deixaram de fora alguns produtos agrícolas, mas evitaram ceder demais. Primeiro país desenvolvido a fechar acordo com os EUA desde a formação do Nafta (Área de Livre Comércio da América do Norte), a Austrália encerrou a negociação com os americanos em fevereiro. Ficou de fora do acordo o açúcar e os australianos conseguiram uma elevação mínima das cotas de commodities lácteas. O prazo de desgravação de carne bovina também é longo: 18 anos. Em contrapartida, os australianos zeraram as tarifas americanas de 97% dos produtos manufaturados e tiveram ganhos pontuais em alguns produtos agrícolas, como lã, vinho, frutas, queijos e cereais, relata levantamento realizado pelo Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone). Os australianos cederam pouco. Conseguiram evitar a cláusula investidor-Estado, preservaram a possibilidade de uso de política de controle de preços de medicamentos e mantiveram os monopólios de exportação em produtos como açúcar, trigo, arroz e cevada. O Brasil tem especial interesse na questão relacionada aos medicamentos. Na época, o acordo com Austrália foi visto pelo setor agrícola brasileiro como um exemplo para o Brasil, já os dois países são gigantes do agronegócio. O governo parece agora compartilhar dessa opinião. Os diplomatas do Itamaraty acreditam que é possível avançar bastante nas negociações da Alca em 2005, após a retomada dos contatos feita através das cartas entre Celso Amorim, ministro de Relações Exteriores do Brasil, e Robert Zoellick, representante de comércio dos EUA. Mas evitam colocar prazos para a conclusão das conversas. Já estão marcadas reuniões dos co-presidentes Adhemar Bahadian (Brasil) e Peter Allgeier (EUA) na terceira semana de janeiro e um encontro de Amorim e Zoellick no início de fevereiro. Outro fator também pode influenciar no rumo das discussões para a formação da Alca. O Mercosul deve iniciar uma negociação de livre comércio com o Canadá, parceiro dos Estados Unidos no Nafta. A decisão política neste sentido foi tomada após a visita em novembro do primeiro-ministro canadense, Paul Martin, ao Brasil e os grupos técnicos já estão trabalhando para melhorar as ofertas e identificar os pedidos. As negociações com o Canadá não precisam necessariamente avançar em paralelo com a Alca, avalia o Itamaraty.