Título: Governo federal reavalia risco de intervir na Varig
Autor: Henrique Gomes Batista e Vanessa Adachi
Fonte: Valor Econômico, 16/12/2004, Empresas, p. A10
O vice-presidente da República José Alencar recebeu de seu antecessor na pasta da Defesa, José Viegas, o texto de uma Medida Provisória (MP) que estabelece a intervenção do governo na Varig como forma de viabilizar a solução da grave crise financeira da companhia aérea. Alencar, no entanto, optou por não implementar a solução ao assumir o Ministério da Defesa e estaria reavaliando as consequências de adotar uma medida tão extrema. Intervir na Varig significaria também assumir o ônus da sua dívida bilionária. E esse é um risco e tanto até mesmo para o governo. Mesmo que fosse equacionada a dívida, o governo ainda poderia ser acionado judicialmente no futuro por ter, um dia, sido o gestor da companhia. Segundo o Valor apurou, em uma reunião ocorrida em outubro entre Casa Civil e ministérios da Fazenda e Defesa, estudou-se a MP e chegou-se à conclusão de que a intervenção seria a única alternativa. Ontem, um grupo de parlamentares participou de um café da manhã no Palácio do Jaburu, residência do vice-presidente. Nela, Alencar disse aos parlamentares que encontrou pronta, ao assumir a Defesa, a minuta da intervenção. Alencar não quis adiantar aos parlamentares presentes qual será o modelo para a Varig e para o setor, mas negou a informação do presidente da Infraero, Carlos Wilson, de que a empresa sofreria uma intervenção até sexta-feira. "Soube dessa intervenção pelos jornais", disse Alencar. O vice-presidente disse que nenhuma decisão sobre a Varig está fechada. A mesma coisa foi repetida ao presidente da Varig, Carlos Luiz Martins, segundo o Valor apurou. Alencar telefonou a Martins ontem para dizer que o governo ainda não tinha um plano fechado para a companhia. As declarações de Carlos Wilson, dadas na terça-feira, em Manaus, criaram um mal-estar no governo, na Varig e nas demais companhias aéreas. A Infraero entrou ontem, na Justiça Federal de Porto Alegre, com ação de cobrança judicial de uma dívida de R$ 132 milhões da Varig, decorrente de tarifas de pouso, permanência e navegação aérea. Esse é mais um desdobramento da crise da companhia aérea, que se arrasta há meses, à espera de uma solução do governo. Durante o café da manhã com o ministro da Defesa, o presidente da Infraero ficou calado, conforme relato de um dos presentes. À tarde, em uma audiência pública na Câmara dos Deputados, Adenauher Figueira Nunes, diretor financeiro da Infraero, tentou explicar o que havia dito seu superior. "Wilson não disse que até sexta-feira seria encontrada uma solução global para Varig, ele se referia apenas a dívida que a companhia possui com a Infraero, de R$ 132 milhões", justificou Nunes. Não havia representante do ministério da Defesa na audiência pública. Falando sobre a cobrança judicial da dívida da Varig com a Infraero, Nunes disse que a Infraero aceita negociar o pagamento do total da dívida em 12 meses e com garantias sólidas - como certidão bancária de fiança. Mas a Varig ofereceu, inicialmente, pagar em 60 meses, prazo depois reduzido para 36 meses. E queria dar como garantia ações da VEM (Varig Engenharia e Manutenção) e imóveis que já estão penhorados pelo Banco do Brasil. A minuta de medida provisória da intervenção, elaborada ainda na gestão de Viegas, cria o instituto do Regime de Administração Especial Temporária da Aviação Civil (Raetac). E regulamenta os procedimentos para a decretação de liquidação extrajudicial de empresa aérea. A minuta não institui os rituais da intervenção porque essa não é uma hipótese contemplada pelo governo. A intervenção do Executivo numa companhia aérea significa colocar na empresa um interventor, afastar toda a administração da companhia e assumir a responsabilidade pela dívida desta com terceiros. A minuta de medida provisória prevê a indicação, pelo ministro da Defesa, de um administrador temporário para a companhia aérea até que se normalizem as contas da companhia ou seja decretada a liquidação extrajudicial. Esse texto, se for acatado pelo presidente da República, porém, por si só não resolve o problema do setor em geral, nem o da Varig, em particular. Outras medidas teriam que ser tomadas simultaneamente. De acordo com os parlamentares da frente de defesa da Varig, uma das situações analisadas pelo governo no socorro à Varig é uma proposta original do ex-ministro Viegas. Segundo essa proposta, a empresa seria dividida em duas: as linhas nacionais seriam repassadas às empresas nacionais (TAM e Gol) e as linhas internacionais, grande preocupação estratégica do governo, ficaria com outra empresa, "filha" direta da atual Varig. Ontem, Alencar chegou a defender a conversão das dívidas em ações. Essa solução já foi estudada anteriormente, mas não avançou. "Temos interesse em fazer negócios com a Varig se forem economicamente viáveis", afirmou Sérgio Bittencourt Varella Gomes, assessor do BNDES e coordenador do grupo de trabalho sobre companhias aéreas dentro do banco. As ações preferenciais da Varig acumularam alta de 45% na Bovespa nos pregões de terça e quarta-feira por conta dos boatos sobre a intervenção. Os papéis têm pouquíssima liquidez.