Título: A hora da ressaca
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 14/09/2010, Economia, p. 12

Reflexo do crédito fácil e do aumento de gastos dos trabalhadores, a inadimplência salta 11,5% em agosto

Os gastos desenfreados e não planejados do brasileiro fizeram do mês passado o agosto com maior expansão da inadimplência desde 2005. De acordo com a Serasa Experian, o avanço foi de 11,5% em comparação com igual mês de 2009. O calote foi puxado pelas prestações em atraso dos televisores de alta definição, comprados para a Copa do Mundo, e pelos presentes do Dia dos Pais. O indicador do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas, divulgado na semana passada, está alinhado com a Serasa e também registrou alta no período, em um avanço de 3,71%.

Com o crédito fácil, quanto mais crescem as vendas, mais se eleva o número de maus pagadores. Segundo o Índice Nacional SCPC de Crédito ao Consumidor, da Associação Comercial de São Paulo, a oferta de financiamentos cresceu 10,5% em agosto. Isso faz com que os consumidores tornem-se mais predispostos a assumir compromissos a prazo, explicou o economista-chefe da associação, Marcel Solimeo.

Na comparação entre julho e agosto, a quantidade de calotes também aumentou (1,8%). No levantamento da Serasa, as dívidas com cartões de crédito e financeiras figuraram como as campeãs e contribuíram em 2% para a formação da inadimplência. Os bancos ficaram em segundo lugar, com 0,6%. Não temos uma situação de pânico. A única coisa que constatamos é que o endividamento está crescendo. De acordo com o Banco Central, 35% do orçamento do brasileiro está comprometido com dívidas, disse Carlos Henrique de Almeida, assessor econômico da Serasa Experian. Agora, é preciso saber a qualidade desse endividamento. Temos de olhar o assunto com calma e monitorar.

Sem fundo

A despeito do cheque estar caindo em desuso, o valor das dívidas(1) nessa modalidade de pagamento registrou alta explosiva. No acumulado dos sete primeiros meses do ano, houve um incremento de 32,7%. Parte desse percentual foi puxado pelos micro e pequenos empresários que misturam as contas do negócio às pessoais, justificou Almeida. Até agosto de 2010, o valor médio dos cheques sem fundos era de R$ 930,69. Em 2010, essa quantia passou para R$ 1.235,18.

Mesmo com a inadimplência em expansão, economistas e representantes do varejo não demonstram preocupação. Enquanto as vendas estiverem crescendo em ritmo mais elevado que a inadimplência e o mercado de emprego continuar forte, com escalada constante na renda dos trabalhadores, a quantidade de maus pagadores não se tornará um problema. Esses números vão dar uma aliviada no fim do ano, principalmente no último bimestre, com a chegada do 13º salário. As pessoas aproveitam o dinheiro extra para quitar dívidas em atraso, disse Almeida.

Serviço

Segundo especialistas, deixar de ser inadimplente exige um controle severo dos gastos. O primeiro passo para limpar o nome é saber o tamanho da dívida e quem são os credores. Começar pelas contas maiores ou que têm juros elevados é a sugestão de economistas. Não é fácil, mas a única saída para quem quer se livrar dessas restrições é pagar a dívida, afirmou o assessor econômico da Serasa.

Procurar os serviços Limpe seu nome, na maioria dos casos, pode causar mais problemas do que apertar o orçamento e quitar a dívida. Em alguns casos, são quadrilhas com o objetivo de dar um golpe no consumidor. A Polícia Civil já desmanchou alguns desses grupos de estelionatários. No caso dos escritórios de advocacia que oferecem os serviços, não costuma haver esquema criminoso, mas levar as dívidas ao Judiciário pode ser arriscado. Se perder a causa, o consumidor tem de arcar, além dos débitos que já tinha, com as custas do processo. Na maioria das vezes, os tribunais têm dado razão aos credores.

1 - Portabilidade

O consumidor que está endividado e pagando juros elevados pode recorrer à portabilidade do crédito. Ou seja, ele tem a possibilidade de transportar seu saldo devedor para outro banco que aceite a operação e ofereça condições melhores. O cliente quita o débito com a instituição financeira original com recursos transferidos eletronicamente pela nova, que passa a ser a credora, nas condições negociadas com o devedor. Os custos dessa transferência não podem ser repassados ao cliente. Segundo analistas, essa é uma ótima opção para quem está enfrentando dificuldades para arcar com os encargos.

Como sair do sufoco

Procure o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e a Serasa Experian para descobrir a quem você deve e o tamanho desse débito.

Evite acumular cartões de crédito e contas bancárias. Quanto menos produtos financeiros desse tipo você tiver, mais eficiente será o controle do seu orçamento.

Tente concentrar todas as suas dívidas em uma só. Pegue um empréstimo grande o suficiente para quitar os débitos.

Se a dívida for no cartão de crédito ou no cheque especial, o empréstimo será mais barato que os juros do dinheiro de plástico.

Saia do cheque especial e do rotativo do cartão. Esses são os juros mais caros que existem e se transformam em uma bola de neve impagável. Negocie com o banco parcelas fixas para essas dívidas.

Reduza gastos. Anote todas as despesas do mês, do cafezinho ao posto de gasolina. Assim você descobrirá o que é supérfluo e dispensável.

Fonte: Serasa Experian

Palavra de especialista O cartão pode ser um aliado

O cartão de crédito, emitido por bancos, por financeiras ou por lojas, é um excelente instrumento de consumo, que permite adquirir bens e serviços sem ter dinheiro disponível naquele momento. A principal vantagem é concentrar numa única data, escolhida por você, o pagamento de diversas despesas do mês. Com isso, há uma facilidade no controle do fluxo de caixa pessoal e um prazo maior para o pagamento.

Por essas vantagens e pelo desenvolvimento tecnológico, a quantidade de cartões de crédito passou de 118 milhões, em 2000, para 565 milhões em 2009, evolução que caminhou paralelamente ao volume de transações efetuadas, com acréscimo de 457% no mesmo período, conforme levantamento da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs).

Tamanha praticidade exige maior atenção por parte do cliente. Como o crédito é muito fácil, as pessoas podem gastar mais do que têm, trazendo problemas para liquidar sua fatura na data do vencimento. Lembre-se de que você só gastou porque quis. Ninguém o obrigou a consumir. No caso de o consumidor não pagar a totalidade da fatura, sobre o saldo devedor remanescente incidirá uma das maiores taxas do mercado, que gira em torno de 238% ao ano. É importante que o cliente pague sempre o valor total da fatura, mesmo que para isso seja preciso tomar um empréstimo com juros mais baixos, como o consignado.

O limite do cartão de crédito não é dinheiro seu. As compras feitas com ele são, na verdade, pequenos empréstimos que precisarão ser pagos em data futura. Outra dica é evitar saques no cartão de crédito, pois os juros são elevados. Se você consegue ser organizado financeiramente, pagando as contas em dia, o uso do cartão permitirá que aplique o dinheiro até o vencimento da fatura gerando, ainda, juros a seu favor. Se bem utilizado, o cartão de crédito é um grande aliado, dando mais comodidade e praticidade.

Wilson Pires é professor do curso de Administração do Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana (FEI)