Título: As novas garras do leão
Autor: Flavia Lima
Fonte: Valor Econômico, 16/12/2004, Eu & Investimentos, p. D-1
Agora é para valer. Os investidores de previdência contam, a partir de janeiro, com um regime alternativo de tributação. A medida provisória 209, que trata das alíquotas regressivas de imposto de renda, foi aprovada pelo Senado na terça-feira e vai para sanção presidencial. A nova regra estabelece que, a partir de janeiro, os investidores de fundos de previdência poderão optar pela tributação regressiva de imposto de renda, que vai de 35%, para quem permanecer até dois anos, até 10%, para aqueles que ficarem por mais de dez anos. O investidor deve ter claro, porém, que a medida não altera o formato dos planos e a forma de aplicação dos recursos de cada carteira, assim como não mexe com instrumentos como a possibilidade de dedução de até 12% da renda anual sobre aportes feitos nos Planos Geradores de Benefícios Livres (PGBLs). O texto sofreu poucas modificações em relação ao que foi aprovado na Câmara. A mais importante é a que trata da contagem do prazo para investidores dos planos atuais que optarem pelo novo regime de tributação. O projeto enviado à Câmara dava aos investidores que entrassem em um plano de previdência até o final de 2004 e que migrassem para um plano novo um "bônus" de um ano - ou seja, um prazo de acumulação retroativo, que seria contado a partir de janeiro de 2004. A versão final do projeto de lei, entretanto, exclui essa possibilidade e considera o início da contagem dos prazos o dia 1º de janeiro de 2005, no caso dos aportes feitos até 31 de dezembro de 2004. Para aportes feitos a partir do ano que vem, o prazo começa a ser contado a partir da data da aplicação. Entre os planos atuais, o texto inova ao exigir que todos os resgates - parcela da aplicação disponível ao investidor a qualquer momento, conforme o regulamento do plano - sejam tributados na fonte em 15%, a título de antecipação de imposto. Para receber ou pagar a diferença, haveria necessidade de o investidor fazer a declaração anual. Nesse caso, a alíquota na fonte sobre os PGBLs incide sobre o total resgatado, enquanto entre os Vida Gerador de Benefícios Livres (VGBLs) incide apenas sobre o rendimento. A alíquota única de 15% põe fim à isenção de imposto para saques mensais de até R$ 1.058,00. Com isso, a Receita Federal fechar a brecha para que alguns investidores resgatassem baixos valores e, assim, escapassem da tributação. Outro ponto importante, que ainda depende de confirmação da Superintendência de Seguros Privados (Susep) e da Receita, é que os benefícios adquiridos no fim do prazo de acumulação do plano - que correspondem à aposentadoria na forma de pensão, renda ou benefício programado - devem ficar isentos da tributação na fonte de 15%, pagando apenas a alíquota da tabela progressiva. A nova regra dispõe que fica sob responsabilidade do investidor escolher, no momento da compra do plano, o regime de tributação de PGBLs, VGBLs e Fapis. O texto permite ainda aos investidores de planos atuais optarem pela nova tributação regressiva. Mas o prazo para a mudança vai somente até 1º de julho de 2005. Uma vez feita a escolha, porém, não há mais possibilidade de voltar atrás. A regra estabelece também para os novos planos o mecanismo da portabilidade, já previsto para os atuais. De acordo com o projeto, a migração entre planos, inclusive entre bancos e seguradoras diferentes, pode ser a qualquer tempo e em número ilimitado de vezes, desde que feita entre fundos de previdência de mesmo regime de tributação para efeito da contagem de prazo de acumulação. Patrícia Linhares, advogada especialista em previdência do escritório Mattos Filho Advogados, explica que o trânsito livre entre aplicações de tributação diferentes traria um "descompasso fiscal", dificultando a contagem de prazos e o estabelecimento de alíquotas. O texto ainda inclui algumas pendências que devem ser resolvidas pela Receita, em conjunto com a Susep - que trata dos fundos de previdência abertos - e a Secretaria de Previdência Complementar (SPC), que trata dos fundos fechados ou fundos de pensão. Dentre elas, o destaque é a forma de cálculo do prazo de acumulação das carteiras para efeito de tributação. Roberto Quiroga, sócio do escritório Mattos Filho, lembra que o cálculo é necessário porque as contribuições podem ser feitas sob valores diferentes e de forma irregular. Segundo ele, uma das possíveis formas de contagem seria pelo prazo médio do período em que foram feitas as contribuições. "Os valores poderiam ser ponderados e, a partir daí, seria considerado um prazo médio", diz. Para Osvaldo do Nascimento, presidente da Associação Nacional da Previdência Privada (Anapp), a nova regra representa um avanço significativo para o setor. "As pessoas vão repensar suas aplicações, direcionando parte dos recursos de longo prazo para a previdência." Entusiasmado, Nascimento lembra que, com a nova regra, é possível que o setor ultrapasse a marca de R$ 90 bilhões em reservas projetada para 2005. Para 2004, a expectativa é que as reservas, de R$ 57,4 bilhões até outubro, cheguem a R$ 60 bilhões. Para Paulo Hirai, da consultoria global na área de previdência Milliman, é preciso que a regulamentação esclarecendo as dúvidas saia logo, sob pena de afastar o investidor. Segundo ele, a forma como o prazo de acumulação será contado concentra as apreensões, já que, na cabeça do investidor, passados os dez anos, a tributação de 10% nos saques incidiria sobre o rendimento ou total acumulado até então. "Mas não é isso que vai acontecer", diz. Analistas entendem que os 10% seriam aplicados apenas para os ganhos obtidos ou sobre o total a partir do décimo ano. Hirai lembra que a incidência do imposto está atrelada aos volumes e aos prazos dos diferentes aportes a ser considerados. "Se cada mês for considerado um novo aporte, por exemplo, os custos das seguradoras irão aumentar consideravelmente", diz. "De qualquer forma, o investidor que pretende manter a aplicação por mais de dez anos pode aderir que será um grande negócio usar a nova forma de tributação", conclui o consultor.