Título: Acumular reservas e reduzir juros são opções a controle de capitais
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 17/12/2004, Brasil, p. A-3

Para evitar a valorização excessiva do câmbio, o Brasil deve dar prioridade à recomposição das baixas reservas internacionais e à redução dos juros elevados, em vez de seguir o exemplo da Colômbia e adotar o controle de capitais, segundo a maior parte dos analistas. Alguns economistas, porém, consideram a medida um instrumento que deve estar sempre à disposição do governo, embora reconheçam a dificuldade de implementá-la, devido a prováveis reações adversas do mercado. Na quarta-feira, a Colômbia determinou que os recursos que entrarem no país terão de ficar lá por pelo menos um ano. Como o real e outras divisas, a moeda colombiana passa por um movimento de apreciação em relação ao dólar. O ex-diretor do Banco Central (BC) Sérgio Werlang, hoje diretor do Itaú, não vê motivos para o Brasil seguir o exemplo colombiano. Para ele, o país tem de aproveitar o movimento de valorização do real para reduzir a vulnerabilidade externa. Um dos principais caminhos é o BC e o Tesouro intensificarem as compras de dólares, de modo a elevar as reservas líquidas, hoje na casa de US$ 24 bilhões, muito baixas em comparação com as de outros emergentes. As da China superam US$ 500 bilhões e as da Rússia, US$ 100 bilhões. "Outra opção é reduzir mais agressivamente a parcela da dívida doméstica atrelada ao câmbio", afirma ele. "E há também a alternativa de reduzir os juros. Não vejo nenhuma necessidade de adotar controle de capitais no momento." O professor Paulo Nogueira Batista Jr., da Fundação Getúlio Vargas (FGV), vê o controle de capitais com mais simpatia, mas acredita que, no momento, baixar os juros e acumular reservas fazem mais sentido. Para ele, a decisão do BC de comprar dólares está na direção certa, mas a autoridade monetária, além de ter demorado a agir, tem adquirido a moeda de maneira tímida. O dólar fechou ontem em R$ 2,739, pouco acima dos R$ 2,70 registrados na semana passada, quando o BC voltou a atuar depois de dez meses de ausência. Para Batista Jr., baixar os juros é outra forma de combater a valorização do câmbio. Ele nota que o diferencial entre juros internos e externos é um dos grandes responsáveis pela apreciação do real nos últimos meses. "Os juros altos atraem um tipo de capital com o qual não se deve contar. Pode sair rapidamente do país e provoca volatilidade excessiva no câmbio." O professor Francisco Eduardo Pires de Souza, do grupo de conjuntura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que, "antes de pensar no controle de capitais, é o caso de começar a reduzir os juros". Com taxas tão altas, fica difícil conter a valorização cambial, afirma ele, mesmo num cenário em que a autoridade monetária intervém no mercado. Souza diz que o juro alto é um fator a mais para a apreciação do real, num quadro marcado de desvalorização global do dólar. Batista Jr. lembra ainda outro efeito dos juros altos: encarece a acumulação de reservas. Isso ocorre porque, ao comprar dólares, o BC injeta reais na economia. Para esterilizar esses recursos, emite títulos públicos, que pagam uma taxa mais alta que a remuneração obtida com a aplicação das reservas. O professor Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp, acha que o ideal seria usar simultaneamente o controle de capitais, a redução dos juros e a acumulação de reservas. Para ele, instrumentos como a "quarentena" adotada pela Colômbia - estabelecimento de um prazo mínimo para o dinheiro ficar no país - é uma opção que deveria estar sempre à disposição do governo, e que é útil para evitar valorização excessiva do câmbio. Belluzzo considera a decisão da Colômbia perfeitamente normal. "Mas, no Brasil, falar em controle de capitais provoca hoje desmaios e chiliques. O Chile fez isso e a Colômbia também já havia feito nos anos 90." Para ele, um dos riscos de se anunciar uma medida como essa é que haja um movimento abrupto de desvalorização do câmbio, devido à "construção de um bloqueio ideológico" a ações desse tipo no país. "No momento, o mais conveniente seria baixar os juros", diz Belluzzo, também ressaltando que as taxas elevadas levam à apreciação indesejada do câmbio. Ele insiste, porém, na importância de o governo ter o controle de capitais como alternativa. O professor Márcio Garcia, da PUC-Rio, aponta outro problema no controle de capitais: a sua baixa eficácia. Ele vê com ceticismo medias como a imposição de prazos para a permanência dos recursos. Num país em que há mercados financeiros desenvolvidos - como o Brasil - os investidores encontram rapidamente maneiras de burlar as restrições. "Essas medidas têm um efeito efêmero num país como o Brasil", afirma ele. Garcia diz ainda que a outra opção, a de controlar a saída, é um instrumento "suicida" para quem deseja contar com poupança externa. Se há restrições à saída, o investidor simplesmente não aplica seus recursos no país.