Título: Retomada do programa nuclear poderá custar até US$ 13 bilhões
Autor: Ricardo Balthazar
Fonte: Valor Econômico, 03/11/2004, Brasil, p. A2
Especialistas reunidos pelo governo federal para reavaliar o programa nuclear brasileiro estimam que será preciso investir algo entre US$ 3 bilhões e US$ 13 bilhões nas próximas duas décadas para revigorá-lo. Lançado pelos militares na década de 70, o programa nuclear é considerado estratégico pela atual administração, que busca formas de recuperar os investimentos na área. Entre os vários cenários que o governo está analisando, o mais ambicioso prevê a retomada das obras de Angra 3 e a construção de mais seis usinas nucleares no país, segundo um funcionário que acompanha as discussões. Juntas, essas sete novas usinas teriam potência equivalente a duas vezes e meia a potência instalada nas duas usinas que já funcionam hoje em Angra dos Reis (RJ). As novas usinas consumiriam a maior parte dos investimentos previstos pelo grupo de especialistas. Elas tornariam viável a ampliação da planta de enriquecimento de urânio que o governo está instalando em Resende (RJ), criando condições para o Brasil exportar o material enriquecido e serviços associados a outras etapas da produção de combustível para reatores de outros países. O grupo governamental que estuda o assunto começou a trabalhar em junho, hoje tem representantes de cinco ministérios e é coordenado pela Casa Civil da Presidência da República. O cronograma que o grupo considerava ideal está atrasado, mas o Ministério da Ciência e Tecnologia, que conduziu a primeira fase das discussões, acredita que ele terá condições de levar suas conclusões ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva até o fim deste ano. Na primeira fase, os especialistas traçaram dezenas de cenários com projeções para a oferta de energia nuclear no Brasil e os investimentos necessários para garantir o abastecimento das usinas e reduzir a dependência tecnológica do país nessa área. O grupo agora tenta reduzir a três o número de cenários para examiná-los com mais cuidado antes de apresentar sugestões a Lula. Até agora ninguém pensou muito na maneira como os investimentos propostos pelo grupo poderiam ser financiados. Num cálculo preliminar que considerou os custos indicados para o cenário mais ambicioso e uma tarifa hipotética muito superior à que Angra 1 e 2 recebem atualmente, o grupo de especialistas estimou que só depois de 15 anos a receita gerada pelas novas usinas seria suficiente para compensar os investimentos feitos. Outra questão que até agora recebeu pouca atenção do grupo é a necessidade de definir áreas definitivas para o depósito do lixo atômico produzido nas usinas e de outros rejeitos radiativos. Como hoje existe pouco material dessa natureza no país, ele tem sido guardado em depósitos provisórios. Se forem construídas novas usinas nucleares, será preciso encontrar uma solução mais duradoura para esse problema. A discussão sobre o programa nuclear ganhou impulso dentro do governo por causa da polêmica em torno das inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) nas instalações de Resende. Mas a idéia de fortalecer o programa tirando Angra 3 da prancheta e construindo mais usinas está longe de ser consensual em Brasília. O Ministério de Minas e Energia, que não participou da primeira fase das discussões do grupo que está reavaliando o programa nuclear, tem demonstrado oposição à idéia de erguer novas usinas atômicas. O ministério comanda outro grupo de trabalho, com representantes de vários órgãos do governo, para analisar apenas a retomada de Angra 3. Esse grupo deve divulgar suas conclusões em um mês. Segundo especialistas da área nuclear e pessoas que acompanham essa discussão no governo, há uma disputa entre os dois ministérios mais envolvidos com o programa nuclear. O de Ciência e Tecnologia demonstra mais entusiasmo pelo programa e pela construção de novas usinas. O de Minas e Energia acha mais prudente investir em hidrelétricas e formas alternativas de geração de energia antes de voltar a pôr dinheiro em usinas atômicas.