Título: Fatia do Rio no PIB caiu 23% em 30 anos
Autor: Chico Santos e Janaina Vilella
Fonte: Valor Econômico, 03/11/2004, Brasil, p. A5
A economia do Rio de Janeiro sofreu um tombo nos últimos trinta anos. Entre 1970 e 2000, a participação relativa do Estado no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro caiu de 16,67% para 12,71%, uma queda de 23,76%. A perda foi superior à do Estado de São Paulo, cuja participação relativa no PIB do país encolheu 15%, no mesmo período, segundo trabalho inédito do economista Mauro Osório da Silva. O estudo expõe em números o processo de esvaziamento econômico sofrido pelo Estado fluminense nas últimas três décadas e que está levando o atual governo a incrementar a adoção de incentivos fiscais para reter e, ao mesmo tempo, atrair novas indústrias para a região. O enxugamento da indústria é, justamente, uma das principais razões para a perda da importância econômica do Estado. O estudo de Osório - denominado "Rio Nacional, Rio Local: Origens e Especificidades da Crise Carioca e Fluminense" -, indica que, de 1970 a 1993, a produção industrial do Rio cresceu 143,1%, contra 253,56% em São Paulo e 405,02% em Minas Gerais. A produção nacional cresceu 300,73% no mesmo período. Em termos de participação relativa na produção industrial, a perda do Rio no período atingiu 38,41%. De 2000 a 2004, nova perda: enquanto a indústria de transformação no país cresceu 15%, a instalada no Rio evoluiu 5,0%. O trabalho é uma dissertação recém-apresentada no Curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A transferência da capital do país para Brasília, em 1960 está, segundo a análise do economista, na raíz da decadência da antiga capital e do Estado que nasceu em 1975 com a fusão da Guanabara (ex-Distrito Federal) com o antigo Estado do Rio de Janeiro. Nunca foi traçada uma estratégia para reciclar a vocação da ex-capital federal. "O Rio não desenvolveu uma política regional, porque era o centro de atração cultural. O fracasso da economia fluminense está no desenvolvimento de distritos industriais. O certo seria reter atividades de nível nacional aqui e não focar todas as políticas em distritos", afirmou Osório. Foto: Nelson Perez/Valor
Osório: Estado não traçou estratégia para reciclar a vocação de ex-capital federal
Na tentativa de atrair novas empresas e manter as já implantadas no Estado, a governadora do Rio, Rosinha Matheus, tem aprovado um leque variado de incentivos fiscais e financeiros. Entre os benefícios, um dos destaques é o que estabelece o aproveitamento como crédito - parcelado em quatro anos - do imposto incidente sobre bens, desde que estes sejam integrados ao ativo fixo da empresa, em conformidade com a Lei Complementar Federal 102/2000. A maioria dos incentivos recai no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Em alguns produtos, como o querosene de avião, a redução da alíquota chega a 15 pontos percentuais - queda de 31% para 16%. Além de baixar alíquotas, o governo do Estado também tem concedido prazo de até cinco anos para o pagamento de ICMS para as empresas que se instalarem no Rio. As ações acabam por acirrar a guerra fiscal entre os Estados. De acordo com o secretário da Receita, Mário Tinoco, a política pretende atuar também com objetivo de corrigir distorções tributárias provocadas por incentivos do Espírito Santo e de São Paulo. "Estamos implementando esta política tributária desde o início de 2003 para estimular a nossa indústria e o crescimento econômico do Estado. O único instrumento que acaba ficando na mão do governador para enfrentar o problema do desemprego é a política tributária do ICMS. É também a forma como podemos nos defender da guerra fiscal", afirmou Tinoco ao Valor. O esvaziamento também afetou o emprego industrial. De 1989 para 1997, o Rio perdeu 41% dos postos de trabalho industriais, a maior queda entre todos os Estados da Federação. Em números, foram fechados no período 261 mil postos de trabalhos formais no setor fabril, segundo dados levantados na tese de doutorado de Silva com base em dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho. Com a redução, o Rio passou do segundo para o quarto lugar em emprego industrial no país, perdendo posições para Minas Gerais e Rio Grande do Sul. "A escassez de emprego no Estado do Rio é resultado da falta de dinamismo industrial que castigou a cidade depois da migração da capital para Brasília", explicou Silva. Os números se traduzem em fatos. Nas últimas décadas, grandes empresas, industriais ou não, deixaram, total ou parcialmente, o Rio. A Gilette transferiu-se para a Zona Franca de Manaus. A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e o laboratório Roche mudaram suas sedes administrativas para São Paulo. Na semana passada a cervejaria Kaiser anunciou o fechamento da sua fábrica localizada em Queimados (Baixada Fluminense). O último grande banco com sede no Rio foi o Nacional, que fechou as portas em 1995, parcialmente liquidado e parcialmente adquirido pelo ex-carioca e hoje paulista Unibanco. Na avaliação do diretor operacional do Sistema Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), Augusto Franco, o processo de esvaziamento econômico que atingiu o Estado está sendo revertido. Segundo ele, o "parque industrial fluminense tradicional está sendo substituído por novos setores, entre eles o turismo e atividades ligadas à indústria petrolífera". "A saída da capital federal gerou perdas de dimensões significativas. Mas uma cidade como o Rio não morre, encontra novas vocações. Pelo aglomerado urbano não existem mais condições para um grande empreendimento industrial na capital do Estado. A indústria vai ficar em Sepetiba e no sul fluminense. O Rio será a capital do turismo e do petróleo", afirmou Franco. Os incentivos da atual gestão estadual, contudo, ainda miram a indústria, tentando preservar parte do espaço perdido ao longo dos últimos trinta anos. Tinoco explica que os incentivos concedidos pelo governo atuam no combate à sonegação de impostos e à concorrência com produtos vindos de outros Estados, além de estimular novos investimentos. Com o objetivo de pôr fim à sonegação, por exemplo, o governo reduziu a alíquota de cervejas e refrigerantes de 21% para 19% e do álcool anidro e hidratado, de 31% para 19%. Já na tentativa de aplicar uma política competitiva com outros Estados da federação, o governo do Estado reduziu a base de cálculo dos remédios, de forma que a incidência resulte em 12%. Também baixou a base de cálculo do café e dos parafusos, de maneira que a cobrança do imposto resulte numa alíquota de 7% para o café e 12% para os demais produtos. A iniciativa já rendeu frutos. Um laboratório farmacêutico de grande porte que estava de mudança para Goiás, desistiu. "O governo está atento à criação de mecanismos para atrair indústrias. Também queremos fomentar a instalação de novas empresas no pólo gás-químico de Caxias e também em Porto Real (Vale do Paraíba, no sul do Estado", disse o presidente da Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro (Codin), Maurício Chacur. Entre os incentivos que ainda estão em estudo, destacam-se a redução da base de cálculo do ICMS incidente sobre produtos da linha branca, som e vídeo e eletroportáteis, de forma que a aplicação resulte em 12%. "Estamos com um pacote de novos incentivos saindo do forno. As microempresas, por exemplo, vão sair ganhando. Pretendemos dar isenção àquelas que faturam até R$ 120 mil por ano", adiantou Tinoco.