Título: Alta do preço de commodities e guerra fiscal alteram saldo comercial nas regiões
Autor: Watanabe, Marta
Fonte: Valor Econômico, 22/12/2011, Brasil, p. A2

A alta de preço das commodities, aliada à guerra fiscal do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na importação, provocou uma mudança na estrutura de importação e exportação nas cinco regiões do país. Combinados, os dois fenômenos acentuaram o déficit das regiões Sul e Nordeste e ampliaram o saldo positivo do Sudeste e do Norte.Nos 12 meses encerrados em outubro, os Estados do Sudeste tiveram superávit comercial de US$ 21,82 bilhões, muito superior aos US$ 8,43 bilhões dos 12 meses anteriores. A ampliação de saldo positivo foi resultado da elevação da exportação, que cresceu 36,1% no período, em ritmo mais forte que as importações, que tiveram alta de 25,3%. As vendas ao exterior da região Sudeste foram puxadas principalmente pela exportação de petróleo e minério de ferro.

Dentro da pauta de exportação do Sudeste, os dois produtos saíram de um total de US$ 27,6 bilhões vendidos de janeiro a outubro de 2010 para US$ 40,6 bilhões comercializados nos primeiros dez meses deste ano. "Foram os preços que comandaram a elevação e tiveram influência na mudança dos saldos comerciais das regiões", diz Rafael Bistafa, economista da Rosenberg e Associados. Enquanto o valor exportado com os dois produtos teve aumento de 47,1% no período, o volume de petróleo vendido ao exterior pelo Sudeste teve alta de apenas 4,3%. O de minério de ferro também cresceu pouco, com elevação de 2,35%.

A elevação do preço do minério de ferro também puxou as exportações dos Estados do Norte e ampliou bastante o saldo positivo da região. Nos 12 meses encerrados em outubro o Norte teve superávit comercial de US$ 5,64 bilhões, alta significativa em relação aos US$ 1,02 bilhão dos 12 meses anteriores. A venda ao exterior de minério de ferro, no mesmo período, saltou de US$ 5,37 bilhão para US$ 10 bilhões, o que significa 58,8% da pauta de exportação da região. As importações também tiveram bom crescimento no Norte, em razão do desembarque de componentes eletrônicos para a Zona Franca de Manaus.

A alta do preço do petróleo em 2011, na comparação com 2010, não trouxe impacto somente nas exportações. O aumento de preço do óleo bruto e derivados também contribuiu para elevar o valor das importações de algumas regiões, como o Sul e o Nordeste.

Nos Estados do Sul, por exemplo, os desembarques de petróleo e nafta - derivado de petróleo que é insumo importante para a cadeia de resinas plásticas - subiram de US$ 5,47 nos 12 meses encerrados em outubro de 2010 para US$ 6,89 nos 12 meses seguintes, ajudando a pressionar o valor das importações. Nesse período, a importação da região Sul passou de US$ 31,8 bilhões para US$ 40,4 bilhões.

A guerra fiscal de ICMS também dá sua contribuição no aumento de desembarques da região. Outro fator que explica a elevação de importação do Sul é a entrada de automóveis no país, de acordo com o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério Cezar de Souza. Além dos carros importados da Argentina, o porto de Itajaí, em Santa Catarina, também atrai os produtos, que entram pagando menos impostos e são repassados a mercados maiores, no Sudeste.

O incentivo da chamada guerra fiscal pesa na balança da região. "É mais atrativo para o importador entrar com o produto pelo Sul e depois fretar para todo o país", diz Souza.

O consultor tributário Clóvis Panzarini explica que o benefício de ICMS na importação costuma adiar o pagamento do imposto para o momento em que há transferência da mercadoria para outro Estado, com crédito presumido de até 75% do imposto devido na operação. Isso quer dizer que, na transferência interestadual tributada a 12%, o Estado em que a mercadoria desembarca recolhe 3% de ICMS e a empresa deixa de recolher 9%.

"É uma vantagem suficiente para fazer a mercadoria ser desembarcada em locais distantes do mercado consumidor", diz Panzarini, que já foi coordenador de administração tributária da Fazenda paulista. Ele lembra que os incentivos de ICMS na importação têm transferido desembarques não só para Estados do Sul, como também para os do Nordeste.

No Sul, adubos e fertilizantes também cresceram na pauta de importações, passando de US$ 53 milhões para US$ 176 milhões. A elevação reflete a safra recorde de grãos, que deve fechar o ano em cerca de 159 milhões de toneladas, número 6,6% maior do que o registrado em 2010, segundo o IBGE. "O Brasil não produz dois componentes necessários para a fabricação desse produto, então temos que buscar lá fora."

A importação de ureia com nitrogênio, componente do adubo, teve, na pauta da região Sul, variação mais expressiva, saindo de US$ 243 milhões, de janeiro a outubro de 2010, para US$ 419 milhões nos primeiros dez meses deste ano.

O Nordeste passa por um processo mais intenso de aumento de importações. Com a queda na produção industrial física, que está negativa em 4,9% no acumulado de janeiro a outubro em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo dados do IBGE, o consumo na região foi substituído em parte por importados.

A indústria cearense, por exemplo, encolheu 12,6% no acumulado de janeiro a outubro em comparação com o mesmo período de 2010. Os setores de calçados, vestuário e têxtil diminuíram neste ano em função da competição com similares asiáticos. "A indústria nordestina é forte em setores de base, como o alimentício e o de mão de obra intensiva, e o tradicional, como petróleo e madeira. Ela não é diversificada. Com a valorização do real, os produtos perderam competitividade e deram espaço aos importados", diz Souza.

Além disso, de forma parecida com o Sul, o aumento nos preços dos derivados de petróleo pesou na balança dos nordestinos. "Houve também uma posição estratégica da Petrobras, que diminuiu a produção no Nordeste em relação ao ano passado, privilegiando o Sudeste", afirma Souza. "Com isso, aumentou o consumo de derivados importados, que estão mais caros no mercado internacional."

Algodão e etanol também ganharam importância na pauta de importações da região. Enquanto os nordestinos compravam US$ 37 milhões em algodão bruto no acumulado de 12 meses até outubro de 2010, no período seguinte, o montante foi a US$ 246 milhões. Com o direcionamento de parte da safra de cana para a produção de açúcar, o etanol importado ganhou importância na balança. O consumo passou de US$ 6 milhões para US$ 256 milhões.