Título: Gastos públicos devem crescer mais e estimular o crescimento em 2012
Autor: Lamucci,Sergio
Fonte: Valor Econômico, 29/12/2011, Brasil, p. A3

Os gastos não financeiros do governo federal e de Estados e municípios vão acelerar ao mesmo tempo em 2012, devendo se tornar um estímulo relevante para a recuperação da atividade econômica. É o quadro oposto ao que ocorreu em 2011, quando as despesas da União e dos governos regionais perderam fôlego simultaneamente e colaboraram para a expansão mais fraca do Produto Interno Bruto (PIB), diz o economista-chefe da corretora Convenção Tullett Prebon, Fernando Montero. Ele estima que o conjunto dos gastos não financeiros das três esferas de governo vai aumentar 7,6% acima da inflação em 2012, mais que os 4,2% estimados para 2011.

O governo federal tem uma expansão significativa de gastos já contratada no ano que vem, especialmente por conta do reajuste na casa de 14% do salário mínimo. O aumento pega em cheio os benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) - dois terços deles são vinculados ao piso salarial - as despesas com o seguro-desemprego e os programas ligados à Lei Orgânica de Assistência Social, voltados para idosos e pessoas com deficiência.

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Além disso, o governo já deixou claro que pretende acelerar os investimentos, a despesa não financeira mais sacrificada em 2011 - de janeiro a novembro, eles recuaram 2,7% em relação ao mesmo período do ano anterior. Desse modo, o esforço de contenção de gastos deverá ficar restrito às despesas com pessoal e de custeio. Nas contas de Montero, os gastos da União vão passar de um aumento real de 3,6% em 2011 para uma alta de 8% em 2012. Só o impacto do salário mínimo deve custar R$ 23 bilhões aos cofres do governo, segundo estimativas da Tendências Consultoria.

Os governos regionais também devem gastar mais em 2012, diz Montero. No segundo ano de mandato, os governadores costumam acelerar as despesas, depois de um primeiro ano muitas vezes marcado por contenção de gastos. Nas prefeituras, as eleições municipais devem levar os prefeitos a abrir o cofre, seja para tentar a reeleição, seja para tentar fazer o sucessor. Somados, os gastos de Estados e municípios devem subir 7% acima da inflação em 2012, acima dos 5,1% projetados para este ano.

"Em resumo, deverá haver uma aceleração conjunta dos gastos nas três esferas de governo, que têm, combinadas, um peso próximo a um terço do PIB [as despesas da União equivalem a algo como 18% a 19% do PIB e as de Estados e municípios, a cerca de 13% do PIB]", diz Montero. Segundo ele, o impacto sobre a atividade do avanço sincronizado de despesas fiscais desse porte não pode ser subestimado, assim como não se deve desprezar o efeito de contenção da demanda da desaceleração de gastos em 2011. Nas estimativas de Montero, a alta real de quase 10% das três esferas de governo em 2010 deu lugar a um avanço de 3,6% neste ano. Segundo ele, foi uma perda de fôlego considerável, "grandemente sentida na economia". A última vez em que União e governos regionais haviam desacelerado os gastos tinha sido em 2003.

Montero calcula a variação dos gastos de Estados e municípios com base na arrecadação e no superávit primário (diferença entre receitas e despesas, excluindo gastos com juros) dessas esferas de governo. Por diferença, estima a variação dos gastos, informação não divulgada pelo Banco Central ou pelo Tesouro Nacional.

O estímulo fiscal em 2012 é um dos motivos que fazem Montero apostar num PIB de 3,5% no ano que vem, considerando possível até um número mais forte, dado o conjunto de incentivos que vão agir ao mesmo tempo sobre a economia- além da expansão de gastos das três esferas de governo, ele cita os juros mais baixos, o mercado de trabalho forte e a expectativa de que a indústria vire o ano com estoques ajustados.

O economista Aurélio Bicalho, do Itaú Unibanco, também acredita que a política fiscal mais expansionista vai estimular a demanda. Ele estima que as despesas não financeiras da União vão crescer 8,5% acima da inflação em 2012, bem mais forte que os 3,4% esperados para este ano. Segundo ele, parte do estímulo fiscal se transforma num consumo das famílias mais forte - como no caso do aumento das aposentadorias vinculadas ao salário mínimo - e parte numa formação bruta de capital fixo mais firme - no caso do investimento em obras públicas.

Um aumento muito forte das despesas públicas, porém, pode tirar o espaço para cortes de juros mais agressivos, diz Bicalho. Para ele, o aumento real de 8,5% dos gastos não financeiros do governo federal é compatível com uma queda da taxa Selic até 9% ao ano - hoje, está em 11%. Um crescimento mais forte dos gastos pode impedir que os juros caiam para os 9%, avalia Bicalho.

O economista Arthur Carvalho, do Morgan Stanley, já vê menos terreno para cortes de juros, dada a recente estratégia do governo em lançar mão de instrumentos fiscais para estimular a economia. Para ele, as medidas anunciadas pelo governo há algumas semanas, como as desonerações tributárias para eletrodomésticos da linha branca e a redução do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) no crédito, indicam que a equipe econômica não vai concentrar os esforços para promover a recuperação da atividade apenas no front monetário. Além dessas ações fiscais, Carvalho também aposta numa intensificação de estímulos "quase-fiscais", como um atuação mais forte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Com essa estratégia, a margem de manobra para diminuir a Selic é menor do que supõem muitos analistas, acredita ele. Não por acaso, Carvalho espera que o BC interrompa o ciclo de corte de juros quando a taxa estiver em 10%, não chegando aos 9% estimados por Bicalho.