Título: PPP, um programa de redução do déficit fiscal
Autor: Rubens Teixeira Alves
Fonte: Valor Econômico, 23/11/2004, Opinião, p. A10

Quanto custa o pedágio em uma rodovia que não existe? Quanto custa a tarifa telefônica de uma linha não instalada? Os economistas sabem que não é zero, e sim infinitamente caro. Não se trata de um conceito imediatamente intuitivo, mas pode-se dizer que é melhor termos alguma tarifa e algum serviço do que nenhuma tarifa e nenhum serviço. Sugestões para limitar o alcance das PPPs são, portanto, equivalentes a criar tarifas infinitamente caras, de modo a impedir investimentos necessários à infra-estrutura. Hoje, no Brasil, há vários projetos importantes sendo limitados pela busca, por caminhos equivocados, do equilíbrio fiscal. Um limite para os contratos de PPP, de 1% da receita líquida de cada ente contratante, será entendido como um limite na busca de eficiência. E por que 1% da receita líquida e não outro número? Diante da dificuldade de se aprovar uma lei como essa no Brasil, não pode tornar-se rapidamente equivocado estabelecer um número, claramente conjuntural, numa lei de incentivo às parcerias? Não há lógica econômica que sustente a criação de restrições orçamentárias quantitativas ao comprometimento público com as complementações tarifárias previstas nesses contratos, mesmo o medo do rompimento do equilíbrio fiscal. Tais despesas correntes continuadas, geradas no âmbito das PPPs, serão as melhores despesas que o setor público terá, pois estarão vinculadas a investimentos e práticas mais modernas de gestão. Seria muito mais inteligente exigir a redução das outras despesas e obrigar os governos a um grande rearranjo orçamentário, de modo a abrir espaço para as PPPs. Alguns projetos de PPP, como é o caso de prisões, agora chamadas de concessões administrativas, não dependem de subsídios ou subvenções, pois o poder público estará pagando por um serviço que teria, alternativamente, que prestar integralmente. Quando houver necessidade de subsídios para a complementação tarifária, recomenda-se a definição dos montantes de recursos no edital, com a previsão de desembolso, não permitindo riscos de variação exagerada desses valores ao longo do tempo - o que pode ser obtido com uma boa regulamentação. Os programas de PPPs devem ser encarados como programas de redução do custeio da máquina administrativa dos governos, portanto, fortemente pró-superavit fiscal. Trata-se de um programa de substituição de fornecedores da administração pública, que passarão a fornecer soluções integradas para as atividades-fim do setor público, abandonando a atual prática de fornecimento de insumos não integrados. Essa compra de soluções integradas exigirá a formação de nova categoria de fornecedores, capazes de combinar capacitação técnica, financeira e operacional em um único ente. A obrigatoriedade de se incluir nos Planos Plurianuais (PPAs) os projetos de PPP já é um controle exercido pelo Legislativo sobre o Executivo. Por que então se discute a criação de novas restrições, especialmente a análise do Tesouro Nacional para os programas estaduais? Trata-se de uma interferência indevida no âmbito de outro ente federativo, o que só seria viável sob um acordo direto entre as partes.

Limitar contratos a 1% da receita líquida do contratante será entendido como entrave à busca de eficiência

Não é indiferente, para o governo, contratar obras diretamente e conceder o serviço de exploração da infra-estrutura em seguida. Haverá redução substancial do custo da obra e do custeio posterior se aplicarmos os conceitos de PPP em contraposição ao sistema atual. Não há como contabilizar as despesas com complementação tarifária em PPP como investimento, pois as regras contábeis existentes não permitem isso - deve-se olhar para o risco e classificar a responsabilidade em função do risco assumido. Portanto, o controle da extensão dos projetos de PPP se dará pela atual redação da Lei de Responsabilidade Fiscal no que se refere a despesas correntes continuadas. O novo Fundo Garantidor das PPPs (FGP) deve ser utilizado primordialmente para alavancar financiamentos. Assim, o texto da lei federal deve permitir a possibilidade de o Tesouro Nacional dar contragarantias a programas de garantias de crédito de agências multilaterais, ou resseguradoras internacionais, para projetos brasileiros no âmbito das PPPs. Essas contragarantias devem ser negociadas caso a caso, e devem variar conforme a percepção de risco de cada projeto, indo além da mera garantia da parte devida pelo Poder Público nas futuras complementações tarifárias. O Tesouro precisa desse instrumento para adotar uma postura mais ativa diante da desestruturação do crédito internacional para os projetos de infra-estrutura brasileiros, agora sob liderança dos parceiros privados. O Banco Mundial e o BID já se posicionaram favoravelmente nesse sentido. Outra providência que deve ser incluída na nova lei é a permissão para que os parceiros privados possam oferecer soluções completas de PPPs para os governos, não ficando impedidos de participar da licitação posterior para o mesmo projeto. A possibilidade de se criar uma indústria de projetos é remota diante dos benefícios que essa medida traria e, com o tempo, apenas os grupos sérios terão capacidade suficiente para proporem tais projetos na escala que se deseja. O governo federal e os governos estaduais deveriam estabelecer, por exemplo, que, dentro de quatro anos, 10% das compras governamentais deverão ser feitas por meio de contratos de PPP, criando assim uma obrigação de migração de sistemas de compras no sentido da maior eficiência e da racionalidade econômica. Portanto, todo incentivo deve ser dado às PPPs, e toda restrição política ou orçamentária à execução desses programas deve ser evitada. Um novo ciclo virtuoso na economia brasileira, a partir dos investimentos em infra-estrutura, só virá de investimentos liderados pelo setor privado, com o acompanhamento direto e o comprometimento explícito do setor público. As discussões no Senado já trouxeram um aperfeiçoamento significativo do projeto de lei originalmente encaminhado pela Câmara dos Deputados. A sociedade espera, já com alguma impaciência, que o Congresso termine sua análise e crie a lei que regulará essas parcerias, observando os aspectos aqui mencionados, não eliminando a possibilidade de aperfeiçoamentos no futuro, já com base em alguma experiência prática.