Título: Pelo voto distrital
Autor: Guimaraes, Bernardo
Fonte: Valor Econômico, 01/11/2006, Opinião, p. A14

Sistema de votação proporcional ou distrital? Parece um detalhe, mas não é: a implementação do voto distrital pode melhorar muito a qualidade do nosso Legislativo.

Em anos eleitorais, os institutos de pesquisa nos revelam que os eleitores, em sua grande maioria, não se lembram em quem votaram para deputado na eleição passada, não acompanharam o desempenho de seu deputado e não sabem em quem votarão. A essa revelação, seguem apelos para que o eleitor se informe melhor, se lembre em quem votou e acompanhe o desempenho de seu deputado no Congresso. Apelos estes que não serão ouvidos, como revelará a pesquisa na véspera da eleição seguinte.

Aos apelos não ouvidos, seguem-se lamentos e reclamações ao eleitor que não faz a sua parte. Antes de culpá-lo, vamos nos perguntar: por que o eleitor age dessa maneira?

Escolher o candidato não é nada fácil. Em São Paulo existem cerca de mil candidatos a deputado federal todo ano. E mais tantos para deputado estadual. Conhecer alguns poucos leva muito tempo. Conhecer uma boa parte é impossível. Alguns eleitores optam por alguém famoso, como fizeram os quase 500 mil eleitores do candidato Clodovil. Destes, 250 mil elegeram o Clodovil. Os outros 250 mil elegeram o Coronel Paes de Lira, que teve 0,03% dos votos no Estado e nem eu, nem você, nem os 500 mil eleitores do Clodovil sabemos quem é. Mil candidatos e não sabemos nem quem de fato se beneficiou com o nosso voto. Alguns tentam escolher o partido em primeiro lugar, como deve ser feito em uma eleição proporcional, mas a maioria destes se sente confusa dada a heterogeneidade dos candidatos de um mesmo partido. Difícil escolher, difícil lembrar.

Passada a eleição, é a vez dos candidatos votarem como queremos para não perderem da próxima vez, certo? Bem, é impossível acompanhar todos os deputados do Estado (em São Paulo são 70) em todas as votações importantes. Além disso, não importa se 98% dos eleitores não gostam de um candidato: os deputados eleitos têm, tipicamente, menos de 1% dos votos. O fato da grande maioria da população conhecer um candidato e escolher não votar nele não o impede de ser eleito nem tampouco de ser o mais votado no Estado (quem foram os deputados federais mais votados nas ultimas eleições em São Paulo?) Portanto, acompanhar para que? Faz sentido investir nosso tempo para saber como tem votado boa parte dos candidatos em boa parte das questões para depois compará-los com os outros mil, e escolher um?

Com o sistema distrital, os eleitores estarão muito mais bem informados. Em um sistema distrital, há um candidato por partido ou coligação, como na eleição para governador. É simples conhecer a todos. O eleitor estará muito mais bem informado a respeito de uma quantidade muito menor de candidatos. Além disso, para ser eleito, é necessário obter grande parte dos votos em seu distrito - um candidato rejeitado pela maioria dos eleitores jamais será eleito. Ao contrário do que ocorre com o sistema proporcional, o candidato não tem a opção de ser eleito com votos de eleitores desinformados espalhados pelo Estado.

-------------------------------------------------------------------------------- Para o conhecimento do candidato pelo eleitor, o sistema distrital permite apenas um candidato por partido ou coligação --------------------------------------------------------------------------------

O sistema proporcional beneficia candidatos conhecidos do grande público e candidatos que fazem campanhas caras porque ser conhecido é fundamental - por que as campanhas políticas no Brasil são tão caras? Se todos são conhecidos, dinheiro é muito menos importante na campanha. Um artigo científico do economista Steven Levitt, da Universidade de Chicago, mostra que dinheiro não tem influência significativa nas eleições Legislativas nos Estados Unidos - onde o voto é distrital.

Depois de eleito, temos que acompanhar apenas um deputado. Este deputado tem muito mais incentivos para agradar o eleitor: os eleitores e os candidatos concorrentes na próxima eleição estarão seguindo seus atos. Como não é possível ganhar a próxima eleição com votos desinformados de 1% do eleitorado, desagradar os eleitores de seu distrito custa a próxima eleição.

O poder do eleitor depende de sua capacidade de punir ou premiar o seu representante (e o partido) na próxima eleição. O sistema distrital torna mais fácil escolher e acompanhar o deputado, aumentando o poder do eleitor. Assim, a qualidade do Congresso aumenta por dois motivos: o cidadão escolhe melhor os candidatos e os deputados tem mais incentivos para votar como quer o eleitor.

Quem se beneficia do sistema proporcional? Os deputados que querem um eleitor confuso, que buscam os votos de eleitores desinformados, que não querem ser seguidos de perto pelo cidadão.

Matematicamente elegante, o sistema proporcional distribui as vagas do Legislativo de acordo com a votação dos partidos e coligações e as aloca aos mais votados de cada partido. O sistema proporcional pressupõe partidos fortes mas não fortalece os partidos, assim como sair de guarda-chuva não faz chover. No sistema distrital, o eleitor tem melhor informação para escolher e acompanhar seu deputado, portanto, o partido tem mais incentivos para cuidar de sua reputação, escolher um bom candidato e não perder a vaga do Legislativo na próxima eleição. Na Inglaterra, onde moro, o voto é distrital e o fator primordial na escolha dos eleitores é o partido.

Na prática, o sistema proporcional coloca dificuldades enormes para a população escolher e cobrar seus representantes. Uma democracia precisa, antes de mais nada, de um eleitor forte, para que nossos representantes votem como nós queremos. O sistema distrital reduz brutalmente o custo para o cidadão estar bem informado e traz as ações dos deputados ao alcance do julgamento das pessoas. O voto distrital traz o poder aos eleitores.