Título: Indefinições marcam governo Dilma na área de energia
Autor: Rittner,Daniel
Fonte: Valor Econômico, 03/01/2012, brasil, p. A3

A falta de novos leilões para a exploração de petróleo, atrasos no envio do novo Código de Mineração ao Congresso, incertezas na política de combustíveis e a avalanche de dúvidas sobre o fim das concessões no setor elétrico deixaram a impressão de imobilismo e excesso de centralização na área que a presidente Dilma Rousseff mais gosta de acompanhar: o setor de minas e energia, cujo ministério ela chefiou entre 2003 e 2005, no início de sua meteórica carreira na Esplanada.

Segundo um funcionário do governo que trabalhou com a então ministra de Minas e Energia, embora não tenha mais tempo para se dedicar ao setor, Dilma ainda faz questão de monitorar pessoalmente a agenda de sua antiga pasta, desde discussões envolvendo a usina hidrelétrica de Belo Monte a detalhes do Código de Mineração. Muitos analistas atribuem justamente a isso a indefinição do governo sobre os principais temas energéticos.

"Pelo fato de haver uma concentração grande nas mãos da presidente, o setor privado não visualiza outros interlocutores no governo", afirma o economista Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). "As decisões ficaram centralizadas no Palácio do Planalto. Algumas não saíram do lugar e a agenda ficou congestionada para 2012", completa.

Dilma ainda não autorizou a realização da 11ª rodada de exploração da Agência Nacional do Petróleo (ANP) - aprovada em abril pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) -, exigiu mudanças nos projetos de lei para a indústria de mineração e não encontrou tempo suficiente para dar uma solução ao fim das concessões no setor elétrico. As empresas de geração, transmissão e distribuição com concessões expirando em 2015 calculam que a indenização por investimentos ainda não amortizados precisará chegar a R$ 47 bilhões caso elas não sejam prorrogadas.

"O governo pecou em não resolver questões importantes para a infraestrutura do país", diz o deputado Luiz Fernando Faria (PP-MG), presidente da Comissão de Minas e Energia da Câmara, para quem as indefinições já afetam investimentos. "Talvez isso tenha ocorrido porque a crise política ocupou tempo demais na agenda da presidente", avalia.

Uma das pendências mais urgentes são as concessões. O governo já praticamente fechou posição. Vai prorrogá-las, via medida provisória, sem nenhuma proposta de emenda constitucional (PEC) - havia dúvidas sobre a necessidade jurídica de fazer isso. O diabo, como sempre, está nos detalhes: o mercado se agita em torno das condições para a provável prorrogação. Por exemplo: qual será a exigência de redução das tarifas. Nas últimas semanas, trabalhava-se com a perspectiva de uma MP relativamente enxuta, basicamente para renovar as concessões. Para evitar que ela se transforme em uma colcha de retalhos, durante a tramitação no Congresso, a intenção é deixar outras definições para a regulamentação a ser feita por decreto presidencial. Mais uma vez, porém, é algo que depende da deliberação de Dilma.

É um jogo que pode terminar com economia de R$ 15 bilhões aos consumidores de energia, segundo estimativas da Abrace, associação que representa os grandes consumidores industriais. A entidade elogia o "tratamento técnico" da questão. "O ano de 2011, apesar dos resultados concretos para recuperação da competitividade da energia ainda serem tímidos, termina melhor do que começou", diz o presidente da Abrace, Paulo Pedrosa. "É verdade que não houve solução para alguns problemas, mas as percepções ficaram mais apuradas."

Na mineração, cujos royalties arrecadados pelo governo devem alcançar R$ 1,3 bilhão em 2011, a cobrança passará a ser feita sobre o faturamento bruto das empresas (hoje é sobre a receita líquida). A tabela em estudo prevê que a faixa dos royalties subirá para 0,5% a 6% - hoje o piso é 0,2% e o teto é 3%. Isso permitirá triplicar a arrecadação com a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem). Outra ideia em discussão no governo é seguir o exemplo da indústria de petróleo e cobrar participações especiais sobre jazidas com alta produtividade, como Carajás e o Quadrilátero Ferrífero, mas não existe consenso.

Na área de petróleo e gás, a ausência de novas rodadas de exploração já causa apreensão entre as empresas, que veem paralisia no mercado. Há dois anos, o Brasil tinha 341 mil km2 sob concessão. Em 2012, essas áreas já cairão para um terço - 114,3 mil km2 - se novos leilões não forem feitos, quantidade que minguará ano a ano, até chegar a 8,6 mil km2 em 2015. No Plano Plurianual 2012-2015, recém-aprovado pelo Congresso, o governo prevê dois leilões do pré-sal sob o regime de partilha nos próximos quatro anos.

Para Adriano Pires, é "quase impossível" que o primeiro leilão ocorra em 2012. Além da novela em torno da redistribuição dos royalties, que aguarda definição da Câmara dos Deputados, ele vê pouca disposição do governo em acelerar os leilões porque a Petrobras já está sobrecarregada com suas explorações. "Não dá para fazer nada sem definir o modelo dos royalties. Mas os leilões também não estão acontecendo por excesso de trabalho da Petrobras", diz o diretor do CBIE.

Para a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), a paralisação das licitações preocupa. "No setor de petróleo e gás natural, o atraso na realização de novos leilões de blocos de exploração e produção começa a afetar o planejamento das dezenas de empresas - concessionárias e fornecedores de bens e serviços", diz a mais recente análise da entidade. "Desde o leilão de concessão até o momento em que o empreendimento entra em operação comercial e começa a gerar receitas, há um intervalo de nove anos, em média, para projetos de petróleo, e até 12 anos para projetos de gás natural. A regularidade de leilões de concessão nesse setor é fundamental", acrescenta o relatório.