Título: Missões ajudam EUA a elevar vendas ao Brasil
Autor: Pedroso,Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 02/01/2012, Brasil, p. A4

Em 2011, cinco missões comerciais de governos dos Estados Unidos visitaram o Brasil em busca de novos consumidores. Os Estados de Indiana, Flórida, Massachusetts, Arkansas e Louisiana procuraram o país visando aumentar a penetração de seus produtos e contribuíram para o aumento de 25,4% das vendas americanas de janeiro a novembro em comparação com o mesmo período de 2010, quando saíram de US$ 24,8 bilhões para US$ 31,1 bilhões, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

Mesmo com um aumento maior nas exportações (36,4%), em números absolutos, o déficit do Brasil na balança comercial com os EUA subiu US$ 150 milhões e ficou em US$ 7,9 bilhões no período, o maior entre todos os déficits que o país acumula com parceiros comerciais. Depois dos EUA, é com a Alemanha (com US$ 5,7 bilhões) e a Coreia (com US$ 4,9 bilhões) que o Brasil registra os maiores saldos negativos no comércio exterior. Há três anos, o Brasil tinha superávit com os americanos.

De acordo com estimativas da Câmara de Comércio Americana (Amcham), a balança de 2011 fechou deficitária para o Brasil em quase US$ 10 bilhões. Para o CEO da câmara, Gabriel Rico, a maioria da importação é de manufaturados. "Esses produtos representam 90% do que é comprado pelo Brasil", afirmou. De janeiro a novembro, a venda desses produtos brasileiros aos Estados Unidos cresceu 16%, alcançando U$$ 10,5 bilhões. Por outro lado, os americanos venderam US$ 28 bilhões de manufaturados para o país, um aumento de 24% em relação ao mesmo período de 2010.

As missões, no entanto, têm um efeito complementar, de abrir caminho para investimentos, segundo Rico. "Essas delegações vêm chefiadas pelo governador, geralmente. Isso mostra que o Brasil é prioridade no investimento do setor privado americano," disse. Prova disso é uma missão que passou por três cidades americanas (Charlotte, Miami e Houston), em novembro, que ajudou empresários a investirem no Brasil.

No fim de outubro, o governador da Florida, Rick Scott, chefiou uma missão ao Brasil. O foco do Estado americano foi claro: aumentar as vendas para o que Scott classificou como "o país mais importante para a Flórida". Em 2010, o Estado vendeu US$ 13,7 bilhões a brasileiros, de acordo com levantamento da Florida Enterprise, empresa público-privada que auxilia os americanos a aumentar o comércio internacional de seus negócios. Em contrapartida, o Brasil vendeu US$ 2,1 bilhões em produtos ao Estado. A previsão é que a corrente de comércio tenha aumentado 25% em 2011.

Para o coordenador de análise econômica de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Fabrizio Panzini, a presença de produtos americanos no país deve se intensificar. "A vinda do presidente Obama para o Rio de Janeiro em março foi um indício disso. A internacionalização das grandes empresas sempre foi uma fonte importante de recursos para os Estados Unidos, ainda mais em tempo de estagnação econômica como o que eles estão passando. Essas missões mostram a estratégia de comércio exterior americano, que pretende dobrar as exportações para o Brasil em dez anos", afirmou.

Os grupos de produtos mais importados pelo Brasil são os ligados a máquinas, aparelhos e instrumentos mecânicos, que somaram US$ 6,36 bilhões de janeiro a novembro, e derivados de petróleo e biocombustível, com US$ 6,35 bilhões. O aumento de 40% do segundo grupo em relação ao mesmo período de 2010, no entanto, é reflexo da alta do preço do petróleo no mercado internacional. O terceiro grupo testá ligado à manufatura: material elétrico, eletrônico e de comunicação, com US$ 2 bilhões e alta de 20,5%.

Com um montante menor, adubo e algodão tiveram destaque no crescimento das importações. O primeiro aumentou 99%, chegando a US$ 731 milhões, puxado pela safra recorde de grãos esperada para o país em 2011. O segundo saiu de um patamar de US$ 36 milhões para US$ 365 milhões. Segundo Rodrigo Branco, economista da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), o preço do algodão americano está competitivo no mercado internacional e ganhou espaço no Brasil.

A tendência, no entanto, é que a pauta da corrente de comércio entre os dois países permaneça com predominância de importações de produtos com maior valor agregado. "Vamos continuar deficitários, pois a economia deles está estagnada, com menos espaço para o consumo dos produtos brasileiros. Ao mesmo tempo, a economia brasileira está em expansão, sob uma base de consumo interno. Esse quadro não deve se alterar no curto prazo", disse Branco.

Do outro lado, as exportações brasileiras de janeiro a novembro de 2011 ficaram concentradas em derivados de petróleo e biocombustível, que somaram US$ 5,1 bilhões ante US$ 3,3 bilhões do ano anterior. A alta mais expressiva foi de ferro e aço, que passou de US$ 1,2 bilhão para US$ 3,1 bilhões, firmando-se como o segundo produto mais vendido. O café teve alta de 71%, chegando a US$ 1,7 bilhão. Máquinas, aparelhos e instrumentos mecânicos cresceram 30% (US$ 2,3 bilhões), o que representa uma inserção de manufaturados brasileiros no mercado americano maior do que o registrado em outros países, segundo Gabriel Rico. "Exportamos 46% de manufaturados. São comercializados cerca de 11 mil itens entre os dois países, o que mostra um comércio dinâmico. Para a China, por exemplo, 85% dos produtos vendidos pelo Brasil são básicos", afirmou.

Fabrizio Panzini lembra que até 2004 o Brasil era superavitário na balança de manufaturados com os Estados Unidos. O "efeito China" acabou mudando o cenário do comércio internacional brasileiro, que hoje é baseado na venda de commodities (ver matéria abaixo). "A pauta do Brasil com os EUA mudou substancialmente. Hoje vendemos menos manufaturados do que no começo da década, porque as empresas americanas que produziam aqui mudaram para a China. Por outro lado, o Brasil perdeu competitividade e carece de uma política cambial que dê melhores condições à indústria. Os países do leste asiático perceberam que para se industrializarem precisariam de um câmbio estável e competitivo, e é isso o que se vê hoje nos países daquela região."