Título: Investidores pagam mais por ações que têm boa governança
Autor: Camba, Daniele e Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 06/09/2006, Eu & Investimentos, p. D1

Depois de muitas décadas relegado a segundo plano, o mercado de capitais brasileiro voltou a fazer parte da agenda do investidor estrangeiro. Entre outros motivos, segundo o ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Investimentos, Arminio Fraga, isso ocorreu principalmente graças ao desenvolvimento da governança corporativa, que, se de um lado reduziu o risco para os minoritários, de outro diminuiu o custo de capital das empresas brasileiras, uma vez que, mais seguros, os investidores agora estão dispostos a pagar mais pelas ações.

"O resultado é o que estamos vendo hoje, um 'boom' de empresas abrindo o capital e isso é apenas a ponta do iceberg, muitas outras companhias estão por vir nos próximos anos", diz o ex-presidente do BC, que participou do segundo dia de seminário que marca os 30 anos da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

A primeira mudança de qualidade que fez o investidor estrangeiro voltar os olhos para o mercado brasileiro, segundo Fraga, foi a aprovação da nova Lei das Sociedades Anônimas (S.A.), em 2001. A lei trouxe de volta, por exemplo, o direito de os minoritários detentores de ações ordinárias (ON, com direito a voto) receberem 80% do prêmio pago ao controlador, no caso de venda da companhia (o chamado "tag along"), que havia sido banido da lei no momento das privatizações. "Foi uma verdadeira guerra aprovarmos a nova lei, mas ela passou e melhorou o ambiente regulatório", lembra Fraga.

Aos poucos, foi havendo uma mudança de cultura que culminou no Novo Mercado, o que para o ex-presidente do BC foi o grande divisor de águas para o aumento da atração de capital estrangeiro para as empresas. "Hoje, 20% das companhias listadas na Bovespa estão nos níveis de governança e 8% estão no Novo Mercado, essa é uma notícia muito auspiciosa", diz Fraga, que atualmente vive muito mais de perto do dia-a-dia do mercado administrando os recursos dos cotistas dos fundos da Gávea.

Para ele, um dos sinais de que a governança corporativa reduziu o custo de capital das empresas é que as companhias do Novo Mercado possuem uma relação Preço/Lucro (P/L, indicador que mostra em quantos anos o investidor pode ter de volta o quanto investiu), em média, três pontos acima das demais empresas da Bovespa. Quando perguntado se, como gestor, ele escolhe apenas ações do Novo Mercado, Fraga lembra que alguns desses papéis já estão muito valorizados, o que os torna menos atrativos no momento.

Todo esse cenário benigno no mercado de capitais, na visão dele, está propiciando um ciclo virtuoso na economia, abrindo espaço para a criação de novas empresas e até mesmo para o empreendedorismo, uma vez que os investidores agora vislumbram uma porta de saída, com a possibilidade de vender em bolsa suas participações nessas companhias que nascem hoje. Em outras palavras, é o mercado de capitais propiciando o desenvolvimento da economia real.

Seja lá o que faltar para o mercado atingir seu nível de excelência - apenas ações ordinárias, tag along de 100% e pulverização do capital -, Fraga acredita que as exigências partirão do investidor e não de regras impostas pelo órgão regulador, assim como aconteceu com as boas práticas de governança. E essa demanda ficará cada vez mais forte na medida que a taxa de juros for caindo e o investidor aumentando sua parcela de recursos em bolsa. Ele brinca: "o brasileiro ficou muito preguiçoso conseguindo 10% de retorno no CDI." Segundo o economista, as bases principais estão lançadas para o desenvolvimento do mercado local e agora é uma questão de tempo e aculturamento para o desenvolvimento dele. "Não devemos ter medo do capitalismo", diz o ex-BC.