Título: Estudo apura que o sistema financeiro é menos concentrado do que se supõe
Autor: Carvalho, Maria Christina
Fonte: Valor Econômico, 06/09/2006, Finanças, p. C2

O mercado bancário brasileiro é menos concentrado do que as indústrias de cal, celulose, cerveja e brinquedos. Os setores de fumo e de produção de pneus são duas vezes mais concentrados do que o financeiro; e os de lâmpadas, farinha e café, três vezes mais. Em termos internacionais, o setor bancário é tão concentrado no Brasil quanto no México.

Essas foram algumas das conclusões de estudo feito pelo sócio da consultoria Tendências, Gesner de Oliveira, e sua equipe. As conclusões põem em xeque uma das premissas que está levando as autoridades monetárias a estudar medidas para reduzir o custo do crédito bancário. Um dos argumentos utilizados pelos que defendem a imperiosa necessidade de interferência do governo no processo é que o sistema bancário brasileiro se concentrou nos últimos anos e há problemas de concorrência.

Mergulhando, porém, tecnicamente no assunto, o estudo de Gesner de Oliveira e sua equipe concluiu que "a maior parte das evidências sugere que não há anomalia do ponto de vista de concentração no sistema bancário brasileiro". Comparações com as experiências internacional, intersetorial e intertemporal indicam que não houve concentração no setor bancário brasileiro em período recente. Participaram do estudo, além de Oliveira, Fábio Miessi, Thais Pons e Cinthia Konichi.

Como desconcentração não é sinal de competição, ressalvou Oliveira, o estudo também foi averiguar esse ponto e a conclusão é que o Brasil é o quarto em competição bancária em uma amostra de 17 países, atrás da Costa Rica, Holanda e África do Sul, e na frente do Reino Unido, França e Itália.

"Não dá para supor que concorrência bancária é anomalia no Brasil. Para discutir isso, é preciso olhar mercados específicos", disse Oliveira. Por isso, o próximo passo do estudo será examinar produtos e segmentos como o crédito para o middle market.

Colocar como um dos fundamentos das medidas de redução do custo do crédito a premissa de que o sistema bancário brasileiro seria concentrado acaba "interferindo emocionalmente nas propostas de mudança", disse Oliveira, para quem o ideal é conduzir esse tipo de discussão objetivamente.

O estudo da consultoria Tendências utilizou para avaliar a concentração do sistema bancário brasileiro o índice de Herfindahl-Hirschamn (IHH) e o CR3. O IHH é calculado pela soma dos quadrados das participações individuais de cada empresa. Ao avaliar o grau de concentração de uma indústria, as autoridades americanas consideram um mercado desconcentrado se o IHH for menor do que 0,1; moderadamente concentrado se o IHH ficar entre 0,1 e 0,18; e altamente concentrado se o IHH for superior a 0,18.

No caso do sistema bancário brasileiro, o IHH apurado ficou em 2000 ficou em 0,13, ligeiramente superior ao de 0,12 calculado em 1994 - mas inferior aos 0,14 do setor no México. Nesse espaço de tempo, o número de bancos brasileiros diminuiu de 245 para 193; e, no México, de 36 para 23. A fatia do mercado de depósitos dos três maiores bancos passou de 49,9% em 1994 para 55,2% em 2000; e a dos dez maiores, de 78,8% para 85,6%.

Em uma comparação intersetorial, o IHH da indústria de sorvetes, por exemplo, é de 0,25; da de lâmpadas, de 0,33; e da de cerveja, de 0,20. São menos concentrados que os setor bancário a área de fiação e tecelagem e a de calçados, por exemplo (IHH de 0,03).

De acordo com os critérios das autoridades de concorrência dos EUA, o mercado bancário brasileiro seria considerado moderadamente concentrado.

Para aferir o grau de concorrência, o estudo levou em conta a chamada estatística H, de Panzer e Rose. Quando H está entre 0 e 1, o mercado se caracteriza por competição monopolista; quando H é igual a 1, o mercado é competitivo. Quando H é menor ou igual a 0, o mercado está em equilíbrio monopolista, refletindo a operação de um cartel. O mercado bancário brasileiro apresentou um índice H de 0,83, caracterizando-se, portanto, como de competição monopolista. Nessa estrutura de mercado, explicou Oliveira, não há barreiras na entrada, há um razoável grau de rivalidade, mas a concorrência não é perfeita. "Um juro um pouquinho menos não é suficiente para levar um cliente a mudar de banco assim como um preço um pouco menor de consulta não justifica uma mudança de médico", afirmou.

A conclusão da Tendências é a mesma de estudo recentemente divulgado pelo Banco Central, e elaborado pelos economistas Mario Nakane, Leonardo Alencar e Fabio Kanczuk, os dois primeiros do Departamento de Pesquisa Econômica do BC e último da Economia da Universidade de São Paulo (USP). Os economistas calcularam que o IHH do mercado de crédito brasileiro estava, em 2003, em 0,069; e o de depósitos, em 0,09.