Título: Apuração ampla em busca de refresco
Autor: Rizzo, Alana; Silveira, Igor
Fonte: Correio Braziliense, 21/09/2010, Política, p. 2

CGU aumenta lista de investigados por tráfico de influência e Lula exige agilidade para frear oposição e chegar sem percalços às urnas

O governo optou por ampliar a lista de investigados e por exigir celeridade na verificação das denúncias que rondam a Casa Civil. A tentativa é amenizar o cenário eleitoral e interromper com o início efetivo das apurações da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Polícia Federal (PF) as sucessivas denúncias até 3 de outubro. Hoje, os envolvidos no suposto esquema de lobby montado por Israel Guerra, filho da antiga chefe da pasta Erenice Guerra, começam a ser ouvidos na PF.

Durante a reunião de coordenação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrou agilidade. O governo é o maior interessado na apuração das denúncias feitas nas últimas semanas. Precisamos saber se quem denunciou tem provas. Se o denunciado realmente cometeu irregularidade será punido. O presidente Lula quer que todas as denúncias, não importa se pequenas, médias ou grandes, sejam apuradas, disse o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, sobre o encontro com os ministros. Carlos Eduardo Esteves Lima, interino na Casa Civil, foi apresentado aos colegas e Padilha afirmou que Lula não comentou se haveria mudanças na pasta. Paulo Bernardo, porém, um dos cotados para o cargo, teve uma reunião que não estava na agenda oficial com o presidente (leia na página 3). Lima também teve um encontro com o presidente.

A CGU encampou a ordem do presidente e decidiu ampliar o rol de investigados. Inicialmente, o ministro Jorge Hage iria debruçar-se apenas sobre o pedido apresentado pela própria Erenice na última semana. Ontem, Hage divulgou nota afirmando que vai apurar todas as denúncias. Entre elas, contratos da MTA Linhas Áreas com a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), cancelamento de multas e a concessão de exploração de ouro e calcário à empresa Matra Mineração, de propriedade do marido e de um amigo da ex-ministra. Esse último caso foi revelado pelo Correio. A Unicel, empresa de telefonia móvel que operou em fase de testes no Ministério da Defesa, também será objeto de processo apuratório. O marido de Erenice era um dos representantes do negócio.

Estrutura Segundo o ministro Hage, as investigações serão feitas por meio de auditorias e/ou processos correcionais punitivos. Alguns órgãos, como os Correios, a Universidade Brasília (UnB) e as fundações de apoio, já são alvo de análises específicas.

Tudo será rigorosamente apurado, garante. Entretanto, a estrutura do ministro é limitada. Apesar de a legislação prever 5 mil servidores no órgão, a CGU conta com aproximadamente 2 mil. O número de auditorias e fiscalizações é crescente. Este ano, foram instauradas 12 investigações especiais. Todas calcadas em operações da PF. A CGU tem função legal de fiscalizar e não punir. A corregedoria é responsável pela punição no âmbito administrativo, que é restrito aos agentes públicos federais. Até agosto, 253 pessoas foram demitidas, 25 cassadas e 31 destituídas do serviço público federal.

O ministro afirma que, quando surgirem fatos que extrapolem os instrumentos de investigação da CGU, os casos serão remetidos à Polícia Federal e ao Ministério Público.

"Precisamos saber se quem denunciou tem provas. Se o denunciado realmente cometeu irregularidade será punido

Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais

Demissão confirmada

O contrato de R$ 59 milhões dos Correios com a Master Top Linhas Aéreas (MTA) será mantido, apesar das denúncias de tráfico de influência envolvendo o filho da ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra. O presidente dos Correios, David José de Matos, afirmou ontem que não há irregularidades no contrato e que a rescisão acarretaria multa milionária.

Ontem, o coronel Eduardo Artur Rodrigues Silva formalizou a saída dos Correios. O ex-diretor de Operações pediu afastamento depois de denúncia apontando conflito de interesses envolvendo o militar. Artur Rodrigues Silva coordenava a contratação de empresas privadas pelos Correios e atuava como consultor da MTA. Minha atuação no mercado de consultoria aeronáutica sempre foi de domínio público e insinuações de propriedade ou controle de empresas do setor aéreo são facilmente desmentidas, afirmou.

A suspeição do contrato ocorre em momento delicado para os Correios. O atual presidente, indicado por Erenice, está há menos de dois meses no cargo. Questionado se é protegido pelo apoio do presidente Lula para permanecer na função, David José de Matos desconversa. Me sinto protegido até a hora que o presidente disser: o senhor não está protegido por mim. Não recebi até agora indicação disso. Os Correios estão precisando é desse apoio do presidente. Se a gente sentir que perdeu o apoio, não é bom. A empresa precisa ter uma pessoa em que o presidente confie.

O presidente da estatal procurou o Correio para afirmar que não tem qualquer condenação no Tribunal de Contas do DF e argumentou que o inquérito que lista irregularidades envolvendo licitação para a administração de cemitérios na capital foi arquivado em 1ª instância. Os outros questionamentos de sua gestão no Governo do Distrito Federal são processos normais de quem exerce cargo de secretário, alega. O Ministério Público, porém, recorreu do arquivamento do processo que apura irregularidade na licitação de cemitérios.

Entenda o caso Rastros dos Guerras

O escândalo que custou o cargo de uma ministra, de dois familiares dela, de dois assessores diretos e de um diretor de estatal teve como foco o exercício do lobby sem amarras éticas. Há 10 dias, a primeira matéria que versava sobre o assunto, da Veja, denunciava o tráfico de influência praticado por Israel Guerra, filho da ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra. Ele teria intermediado a renovação de concessão da MTA Linhas Aéreas com a Agência Nacional de Aviação Civil, documento que permitiu à empresa assinar contratos de R$ 59, 8 milhões com os Correios. Mais tarde, o próprio Israel foi denunciado pelo Correio por ser funcionário fantasma da Terracap ele acabou demitido do posto.

Também perderam os postos Vinícius de Castro e Stevan Knezevic, acusados de tráfico de influência na Casa Civil. No fim de semana, o tio de Vinícius, Marco Antonio de Oliveira, relatou a Veja que o sobrinho recebeu R$ 200 mil de propina para facilitar a compra de Tamiflu pelo governo federal, o que é negado pelas autoridades envolvidas.