Título: Sustentabilidade precisa ir além da esfera empresarial
Autor: Mandl, Carolina e Sobral, Eliane
Fonte: Valor Econômico, 06/09/2006, Empresas, p. B2

O debate sobre desenvolvimento sustentável precisa ir além da esfera empresarial e chegar à atitude cotidiana dos indivíduos. Só dessa forma é que a sustentabilidade se tornará uma realidade. Essa foi uma das discussões levantadas durante o seminário "Sustentabilidade nas Empresas", promovido pelo Valor ontem.

A tarefa de levar essa conscientização aos indivíduos pode ser, entretanto, mais árdua e complexa do que cobrar responsabilidade das empresas, de acordo com a antropóloga e diretora do Centro de Altos Estudos de Propaganda e Marketing da Escola Superior de Propaganda e Marketing, Lívia Barbosa.

Segundo ela, o cidadão está acostumado a cobrar responsabilidade empresarial mas, ao mesmo tempo, negligencia o seu próprio papel. "Vamos entrar na fase de mudar os hábitos da sociedade, e isso será um problema", disse ela durante o evento.

Não é difícil entender o porquê, e a própria antropóloga exemplifica. "Quando eu era criança, havia sempre uma carrocinha de sorvete na porta de onde eu estudava, e eu não me tornei obesa", afirmou ela ao se referir à legislação que proíbe a venda de doces em porta de escolas. Para ela, em vez de educar as crianças, as pessoas estão delegando ao Estado a função de proibir.

Para Nizan Guanaes, presidente da agência de publicidade Africa , o mesmo fenômeno acontece hoje com as campanhas publicitárias. "Não há consumo responsável sem educação, e a publicidade não pode substituir nem o Estado, nem a família", completou ele. Para o publicitário, tem sido mais fácil tirar um comercial impróprio do ar do que mudar práticas da sociedade. "O Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária é sério e atuante. Tanto que há mais excessos na programação do que na hora do intervalo."

Embora os palestrantes do seminário tenham ressaltado a importância da mudança de atitude dos indivíduos, eles também lembraram que, do lado das empresas ainda há muito o que fazer. "Quando o negócio das empresas for a produção do bem-estar social, estaremos no caminho certo. A responsabilidade social não pode ser uma ferramenta de marketing", disse Paulo Itacarambi, diretor-executivo do Instituto Ethos.

Milton Seligman, diretor de assuntos corporativos da AmBev, exemplificou isso com um caso da fabricante de bebidas. "Mais de 90% da composição dos produtos da AmBev são água. Se ela acabar, o nosso próprio produto deixa de existir", disse. A indústria promove campanhas internas pelo uso racional do recurso, além de reaproveitá-lo para determinados fins, como limpeza.

De acordo com Vicente Trius, presidente do Wal-Mart Brasil, a responsabilidade social agrega valor ao próprio negócio. Ao se preocupar com a energia, a varejista trocou as lâmpadas das lojas e cortou em 20% seus custos, o que pode aumentar a lucratividade.

"O lucro é essencial. Só quem é lucrativo pode fazer investimentos sociais", disse Ricardo Voltolini, consultor em terceiro setor.