Título: Kraft e Nestlé acirram disputa no Nordeste
Autor: D'Ambrosio, Daniela e Cruz, Patrick
Fonte: Valor Econômico, 06/09/2006, Empresas, p. B5

Com um paladar diferente e hábitos de consumo também distintos do resto do Brasil, o nordestino conquistou a indústria de alimentos. Duas gigantes multinacionais, Nestlé e Kraft Foods, mantêm unidades de negócios no Nordeste totalmente voltadas ao desenvolvimento do mercado regional. Além de embalagens menores e mais baratas - a exemplo do que já fazem as empresas de higiene - as múltis de alimentos também fazem produtos e sabores específicos para o consumidor local.

A Kraft Foods começa a vender neste mês versões do refresco Tang e do biscoito Trakinas desenhadas exclusivamente para o mercado nordestino. A empresa criou no ano passado uma unidade de negócios na região, com marketing e pesquisas de preferência específicos para esse mercado.

As novas versões de Tang têm os sabores de cajá e graviola e serão encontradas apenas em pontos-de-venda nordestinos e também da região Norte. A produção do refresco não foi deslocada para o Nordeste - continuará concentrada na planta localizada em Curitiba -, mas o preço final, em torno de R$ 0,70, é o mesmo dos outras versões do Tang já existentes. "As pesquisas de mercado foram feitas também com pessoas que não são consumidoras de suco em pó. Podemos trazer novos consumidores para essa categoria", diz Andréa Nascimento, gerente de produtos da Kraft Foods Brasil no Nordeste.

O biscoito Trakinas, que praticamente não era vendido na região, ganhou uma versão de 140 gramas, mais leve que a original, de 164 gramas. E também mais barata: o preço final deverá ser de R$ 1,00. A Kraft fechou parceria com a Cipam para fabricar o produto na unidade que a empresa pernambucana tem em Caruaru, a 130 quilômetros de Recife. "O Nordeste é um mercado emergente. A região cresce a taxas médias acima das nacionais e tem tido o impacto de programas de renda mínima e maior acesso ao crédito", diz Álvaro Oliveira, diretor da unidade de negócios da Kraft na região. "Isso acaba estimulando o consumo".

A empresa vai lançar também uma campanha de divulgação que será, segundo Andréa Nascimento, "a maior que a Kraft já teve no Nordeste" para apresentar as novidades ao mercado local. Em junho, a companhia já havia trabalhado em ações de associação da marca com as festas juninas. A Kraft não revela o montante investido nessas ações nem na criação da nova linha e produtos.

A concorrente Nestlé implantou uma unidade administrativa no Nordeste há dois anos. Ao todo, são cerca de 500 profissionais entre marketing, vendas, logística e distribuição. A dimensão do negócio tem uma razão: perto de 30% do faturamento da Nestlé , de R$ 11,5 bilhões no ano passado - conforme divulgou o presidente Ivan Zurita ao Valor - está no Nordeste e equivale à receita da Nestlé chilena.

A região cresce o dobro da média nacional, a uma taxa de cerca de 10% ao ano. "Só no ano passado, crescemos no Nordeste uma Nestlé Argentina", compara Johnny Wei, diretor da unidade Norte e Nordeste, sem apresentar números absolutos.

A multinacional tem dois produtos exclusivos para o mercado nordestino: Nescafé Dolca - mais suave para atender ao paladar local - e o leite Ideal - versão em pó mais popular. A Nestlé também muda as embalagens para atender o público local. Os biscoitos Bono e Negresco, por exemplo, são vendidos em versões de 140 gramas, contra um pacote de 200 gramas no resto do Brasil. Produtos como Mucilon e Nescau, que são vendidos em latas de 400 gramas em outras praças, chegam ao Nordeste em sachês de 230 gramas.

"Há muito mais consumidores das classes C, D e E, que só podem fazer pequenos desembolsos", afirma Wei. A região também já ganha status de campo de provas: com a marca Maggi, a Nestlé lançou caldo de costela e galinha com azeite, que hoje já são vendidas em todo o Brasil.

A comunicação é outro diferencial importante. "Aqui, usa-se muito rádio, carro de som e até propaganda em jangadas", diz. O marketing no ponto-de-venda também tem outras características. "Não adianta oferecer leve três e pague dois, eles querem mix de produtos, como café e leite juntos", explica.

A Kibon, da Unilever, tem o sabor cajá no Nordeste, um dos campeões de vendas da companhia na região. A General Brands, fabricante nacional de sucos em pó da marca Camp, também está olhando atentamente para o mercado nordestino. Embora não tenha lançado sabores específicos para a região, a empresa está investindo em promoções e degustações no ponto-de-venda. A região responde por cerca de 38% das vendas e a expectativa é que cresça 10% este ano.