Título: Custo salarial sobe, mas produtividade fica estagnada na indústria
Autor: Martins,Arícia
Fonte: Valor Econômico, 16/01/2012, Brasil, p. A3

Ao contrário do observado em outros anos de estagnação ou queda da produção, a indústria preservou sua mão de obra em 2011 e concedeu aumentos reais de salário. De janeiro a novembro de 2011, a folha de pagamento real aumentou 4,3% na indústria, custo explicado pela combinação de um crescimento de 1,1% do nível de emprego da indústria e de 3,15% no salário médio do setor, segundo dados da Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (Pimes), divulgada na sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Esse aumento do custo salarial de 2011 não foi compensado por ganhos de eficiência no setor. No mesmo período, e também segundo o IBGE, a produção avançou apenas 0,4%, mas foi acompanhada por um número de horas pagas 0,6% maior. Como resultado, a produtividade do trabalho na indústria encolheu 0,2% no ano, segundo cálculos do Valor.

Para especialistas em mercado de trabalho e indústria, os custos e dificuldades em demitir e readmitir funcionários em um período de desemprego baixo, associado à falta de mão de obra qualificada explicam esse descompasso entre salários pagos e produção. A última vez que o país viu uma taxa de desemprego comparativamente tão baixa como os 6% de boa parte do ano passado foi no Plano Cruzado, em 1986 - na época, a pesquisa do IBGE seguia outros critérios.

Díssidios mais robustos também impulsionaram a folha de pagamento da indústria no ano passado, assim como a baixa base de comparação, já que, em 2010, o ganho real dos trabalhadores do segmento foi fraco, de 1,4% segundo a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE, observa Fabio Romão, da LCA Consultores. "É um número baixo". No mesmo ano, o rendimento médio real do total de trabalhadores aumentou 3,8%.

"O mercado de trabalho está apertado. Não é seguro para o setor industrial, mais organizado e que precisa de mão de obra com mais instrução, arriscar-se em aliviar a folha de pagamentos agora com demissões e, depois, considerando perspectivas de leve recuperação em 2012, correr atrás de recontratar esse profissional", diz Sérgio Mendonça, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Karin Parodi, sócia da consultoria de recursos humanos Career Center, acredita que os salários pagos hoje também influenciam nessa postura. "Os salários da mão de obra qualificada no Brasil estão muito inflacionados, isso porque a educação no país não consegue abastecer a demanda por esses profissionais após sucessivos anos de crescimento. Ainda que a rotatividade no país tenha diminuído, o custo de recontratação pode ser muito alto. É difícil assumir esse risco", afirma.

Em 2003, quando a produção na indústria sofreu um forte ajuste para baixo e encerrou o ano com expansão fraca, de 0,3%, a folha de pagamento real havia recuado 4,3% e o emprego industrial, 0,5%. Naquele ano, a taxa de desemprego média foi de 12,3%, calcula Romão, da LCA.

Apesar da semelhança no quadro desfavorável para o setor, o cenário econômico em 2003 dificultou a manutenção do emprego naquele ano, na visão de Mendonça. "2003 também foi ruim para o PIB [avanço de 0,5%], o que explica em parte essa baixa produção da indústria. A inflação naquele ano também foi bem maior [9,3%] que no ano passado [6,5%], o que corroeu mais os ganhos salariais e dificultou as negociações no início do governo Lula", diz e le.

Para Júlio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o mau momento vivido pela economia em 2003 explica porque, naquele período, o emprego industrial reagiu com rapidez à queda na produção, situação inversa ao ocorrido no ano passado, quando as demissões começaram em outubro - situação mais comum para o setor, no qual o emprego é o último elo da cadeia a ser atingido. "Em 2011, a produção foi se revelando fraca. 2003 foi um ano que já nasceu ruim."

A dinâmica inversa da indústria em 2010, que se recuperou após a crise, é outro fator que justifica a distância entre produtividade e salários em 2011, afirma Edgard Pereira, sócio da Edgard Pereira & Associados e professor da Unicamp, já que, na hora de se negociar os salários no ano passado, levou-se em conta uma produção 10,5% maior e uma inflação mais salgada. Como em 2011 a produção patinou e a alta de preços deve ser menor daqui em diante, o efeito dessa perda de fôlego será sentido pelos salários em 2012, diminuindo, ainda que moderadamente, o descompasso entre esses indicadores.

O economista Fabio Ramos, da Quest Investimentos, espera uma retomada "medíocre" da produtividade da indústria em 2012, em linha com uma produção pouco maior e com ganhos salariais menores. "Será muito difícil para o trabalhador no ano que vem pedir 10% de aumento nominal", diz, apontando que o crescimento da economia deve ser fraco no primeiro semestre.

Outro número que ajudou a indústria a compensar o custo salarial foi o faturamento, que, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), apresenta expansão real de 5,4% entre janeiro e outubro de 2011 frente igual período de 2010, último dado disponível. Segundo Gomes de Almeida, do Iedi, o acúmulo de estoques, que agora está sendo ajustado, e a maior importação de insumos são responsáveis por manter o aumento do faturamento mesmo com uma produção mais fraca.

"Uma parcela da indústria está se transformando em vendedora", avalia. Na avaliação de André Rebelo, assessor de assuntos estratégicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a indústria está pagando caro por essa conta, uma vez que o faturamento do setor cresceu menos que a inflação nesse período. "Para fechar a conta, a indústria teve que reduzir margem e tenta aumentar a produtividade."