Título: BCs agem e indicam escalada da crise
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Fonte: Valor Econômico, 01/12/2011, Finanças, p. C1

Foi com grande euforia que os mercados de ativos de risco ao redor do mundo receberam ontem a ação coordenada de seis bancos centrais, encabeçados pelo Federal Reserve americano, para injetar liquidez em dólares no sistema bancário mundial. As bolsas globais dispararam e o dólar derreteu. Houve grande alívio porque nas últimas semanas o funding dos bancos europeus só fez secar, causando uma ruptura nas operações de crédito, e havia até mesmo boatos na manhã de ontem de que uma grande instituição estaria em sérios problemas. Antes do anúncio da medida, o custo dos bancos da zona do euro para se financiar em dólares havia atingido nível recorde.

Os mercados ainda ruminavam o fato de os líderes europeus não terem conseguido chegar, na véspera, a um acordo para ampliar o fundo de resgate europeu e o rebaixamendo, na noite terça-feira, do risco de crédito de muitos dos principais bancos do mundo pela agência Standard & Poor"s quando foram surpreendidos pelo anúncio da medida, que trouxe alívio imediato.

Mas um olhar mais atento revela dois problemas subjacentes e sinaliza que a euforia pode durar pouco. O primeiro é que se os seis principais bancos centrais do mundo decidiram agir de forma orquestrada é porque a situação de liquidez dos bancos alcançou níveis realmente alarmantes. O segundo é que, embora auxilie na questão pontual e vital da liquidez bancária, a ação em nada muda o quadro original, da insolvência de nações da zona do euro. E, se os bancos centrais tiveram que agir, é porque as autoridades da União Europeia continuam demorando a encaminhar uma solução definitiva para a questão.O Fed e os bancos centrais de Inglaterra, Canadá, Japão, Suíça e o Banco Central Europeu baratearam o acesso dos bancos a recursos emergenciais em dólar. A taxa adicional cobrada sobre o swap do índice do dólar no overnight caiu de 100 para 50 pontos base com a medida. Além disso, o programa foi prorrogado por seis meses, até 1º de fevereiro de 2013, disse ontem o Fed em comunicado divulgado em Washington.

Na manhã de ontem, o custo extra para um banco da zona do euro tomar dólares emprestados em troca de euros por três meses no mercado havia atingido nível recorde, de 162,5 pontos base, visto apenas no mês seguinte à quebra do Lehman Brothers, em 2008. A ação dos BCs derrubou as taxas imediatamente.

"É um passo na direção certa", disse Jay Bryson, economista global da Wells Fargo Securities. "Não resolve o problema na Europa, mas, num momento em que os bancos europeus estão tendo problemas em captar recursos em dólar, a iniciativa facilita e diminui os custos da tomada em dólar para esses bancos."

Os seis BCs também concordaram em criar programas de swaps bilaterais temporários para que o crédito possa ser fornecido em qualquer uma das moedas "no caso de as condições do mercado assim o exigirem". Essas linhas de swap também foram autorizadas até 1º de fevereiro de 2013.

As linhas de swap em dólar tinham, anteriormente, seu prazo de expiração fixado para 1º de agosto de 2012. O novo custo será aplicado às operações a partir de 5 de dezembro. Os empréstimos de sete dias terão juros de cerca de 0,58%, inferiores aos de 1,08% anteriores, com base na atual taxa de swap do índice do overnight (OIS, pelas iniciais em inglês) de uma semana, de 0,08%. "Foi uma resposta ao aumento das tensões dos mercados financeiros mundiais", disse Massaki Shirakawa, presidente do BC do Japão, em entrevista coletiva concedida ontem em Tóquio. "A ação coordenada dará uma sensação de segurança ao mercado."

"A ação coordenada da parte dos BCs é uma coisa, sem dúvida, boa", disse Jens Sondergaard, economista-sênior para a Europa da Nomura International de Londres. "Mas será que as injeções de liquidez são um fator determinante para virar o jogo, quando o cerne do problema está nos mercados da dívida soberana europeia?"

A ação coordenada "baixa o custo da concessão de crédito emergencial e aumenta sua abrangência", disse Mohamed El-Erian, principal executivo da Pacific Investment Management (Pimco). Os BCs "estão vendo no funcionamento do sistema bancário alguma coisa que os preocupa", disse El-Erian. As ações de bancos europeus registraram forte alta em resposta à medida.

A iniciativa de ontem corrobora as medidas coordenadas decorrentes do pânico financeiro que teve início em 2007 destinadas a criar e expandir as linhas de swap cambial, cujo uso alcançou seu pico, de cerca de US$ 583 bilhões, em dezembro de 2008. Os BCs, também conjuntamente, baixaram sua taxa de juros referencial em outubro de 2008. O Fed disse que as empresas financeiras americanas "não estão enfrentando dificuldades atualmente, já que obtêm liquidez nos mercados de financiamento de curto prazo".

Embora a medida adotada ontem pelos seis BCs deva abrandar as tensões dos mercados de empréstimos de curto prazo, ela não atende a alguns apelos de o BCE atuar como instituição de crédito de última instância para os governos da zona do euro de 17 membros e comprar volumes ilimitados de bônus dos governos. A Alemanha, a maior economia da Europa, se opôs à ideia, argumentando não ser essa a função do BCE e que isso seria apenas uma solução temporária.

Na terça-feira, o BCE dedicou o maior valor de mais de dois anos aos bancos em sua operação de refinanciamento ordinária de sete dias, ao emprestar € 265,5 bilhões (US$ 357,5 bilhões). O BCE oferece recursos ilimitados aos bancos da zona do euro em troca das garantias definidas como pertinentes.