Título: De olho na reeleição, Chávez aumenta os gastos públicos
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Fonte: Valor Econômico, 04/01/2012, Interancional, p. A9

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, aposta nos recursos advindos do petróleo para bombar os programas sociais e conseguir um novo mandato nas eleições presidenciais de 2012. Com mais dinheiro circulando no país, e o baixo estímulo do setor privado para produzir em um ambiente econômico e político cada vez mais hostil, analistas ouvidos pelo Valor preveem um ano de elevação de gastos públicos e alta inflação na nação sul-americana, membro da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo).

O cenário de fundo para o aumento de gastos está no barril de petróleo cotado acima de US$ 100 - o maior nível da história - e nos US$ 17 bilhões em títulos emitidos pelo governo e pela estatal Petroleos de Venezuela SA (PDVSA), que ajudaram também a turbinar a economia venezuelana. Dados divulgados pelo Banco Central do país apontam para uma expansão de 4% do PIB em 2011, após contrações de 1,49% e 3,20% registradas em 2010 e 2009, respectivamente.

A tendência de mais gastos para este ano deverá puxar o crescimento para até 5%, prevê o Bank of America em um relatório publicado no apagar das luzes de 2011.

O lançamento em dezembro de uma série de programas sociais chamados de "missões", destinados a fornecer habitação e distribuir dinheiro para famílias pobres, deu uma ideia da estratégia de Chávez para agradar seu eleitorado e conquistar os indecisos.

"Eleições na Venezuela, sob condições normais, têm de 35% a 40% de antichavistas sólidos e 40% a 45% de Chavistas sólidos. Os demais estão sem pender para um campo ou outro", diz Daniel Linsker, analista-chefe para América Latina da Control Risks. "O que se pode esperar para este ano é que o gasto público suba, buscando ganhar o voto desses últimos."

Chávez deu início à campanha à reeleição em julho, com o anúncio de um câncer na região pélvica. As implicações da doença ainda não estão totalmente claras, apesar de uma evidente melhora de seu estado de saúde nas mais recentes aparições televisivas. Desde que tornou pública a doença, Chávez surgiu mais de 160 vezes na mídia, segundo levantamento da empresa de medição TVRadio, e trocou a cor da tradicional camisa vermelha pelo "amarelo-esperança".

Em meio a sessões de quimioterapia em Cuba, e enquanto médicos e políticos venezuelanos questionavam se o presidente teria saúde para chegar ao fim de um novo mandato, Chávez incorporou fé e religião ao seu discurso. O slogan "Pátria, socialismo ou morte" desapareceu para dar lugar ao "Viveremos e venceremos". A ideia era, a começar pela retórica, afastar a hipótese de morte do presidente.

"A doença de Chávez pode ser um tema sumamente importante nas eleições. Com o controle que exerce sobre a mídia, ele conseguiu dar a mensagem de que está curado", diz Natália Brandler, professora do curso de Ciências Políticas da Universidade Simón Bolívar. "Chávez se fortalece por dizer que foi curado milagrosamente."

Recentes pesquisas de intenção de voto mostram um equilíbrio entre Chávez e a oposição, que deve escolher um candidato único em fevereiro. Mas, para Luis Vicente León, diretor da consultoria Datanalisis, o presidente ainda é favorito. "Mesmo em condições de igualdade numérica [nas pesquisas], o governo ainda controla o petróleo e os meios de comunicação. A oposição, para vencer, tem que estar muito mais forte."

Na mesma linha, Alberto Ramos, economista para a América Latina do banco Goldman Sachs em Nova York, resume o atual quadro eleitoral: "A oposição está galvanizada, mais organizada, vai eleger um candidato de consenso e tem mais chances do que nunca de vencer as eleições. Mas Chávez deve ganhar, pois sua capacidade de usar fundos públicos e outros instrumentos aumenta as chances".

O crescimento da violência e da inflação, temas que incomodam o eleitorado, estará presente na campanha. Mas nem isso deve minar a possível vitória chavista.

Os preços ao consumidor tiveram uma guinada de 27,6% em 2011 no país, em comparação com a alta de 27,2% registrada em 2010. A desvalorização do bolívar e a escassez de produtos podem explicar isso, diz o Banco Central.

Uma das apostas do presidente para conter a inflação foi a criação, em novembro, da Superintendência de Custos e Preços Justos. O novo órgão passou a fiscalizar a contabilidade de empresas de diversos setores, a começar pelos setores de saúde, higiene pessoal e limpeza. Na opinião de analistas e empresários, porém, a medida pode levar à escassez de produtos. Isso pode anular o impacto inicial da fiscalização sobre o controle dos preços.

Para Ramos, outro efeito de medidas como essa é o desestímulo ao investimento privado, o que reduz a eficiência da economia, cada vez mais dependente do petróleo e das importações. "As condições vão piorar no curto prazo. O governo vai aumentar os gastos enormemente neste ano e estimular as importações", afirma. "Com as políticas agressivas em relação ao setor privado, qualquer tipo de demanda bate no limite da capacidade [de produção] e gera inflação." Ramos prevê que a inflação superará a casa dos 30% em 2012.