Título: O show do bilhão
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 27/09/2010, Política, p. 2

Arrecadação farta nos primeiros 60 dias de campanha eleitoral banca despesas de R$ 869 milhões. Candidatos gastam mais com impressos

As doações eleitorais para todos os candidatos atingiram R$ 1 bilhão após dois meses de campanha. O valor se aproxima do total de contribuições em 2006: R$ 1,5 bilhão. E ainda não estão computadas as doações feitas nos últimos 30 dias, as que podem ser feitas no segundo turno e até mesmo após a definição das eleições. As despesas registradas somam R$ 869 milhões. Um terço disso (R$ 285 milhões) foi gasto com material impresso (cartazes, placas, estandartes, faixas). Os programas de rádio e de TV representam a segunda maior despesa: R$ 105 milhões. Do total doado, R$ 133 milhões saíram do bolso dos próprios candidatos.

As campanhas majoritárias para presidente da República e governador priorizam seus programas no horário eleitoral gratuito. Os candidatos a presidente investiram um terço da arrecadação (R$ 76 milhões) nos programas para o rádio e para a televisão. Os pretendentes ao cargo de governador colocaram nesses programas R$ 56 milhões dos R$ 209 milhões já arrecadados. Os programas de Dilma Rousseff (PT) foram os mais caros, com gastos de R$ 15 milhões.

Sem o mesmo espaço na TV, os candidatos a cargos proporcionais investem mais na campanha visual, com farta distribuição de impressos (cartazes, faixas, minidoors, estandartes, jornais) e deslocamentos de carros de som país afora. Juntos, candidatos a deputado federal e estadual gastaram R$ 204 milhões com material impresso. A locação de carros e a propaganda com carros de som consumiram mais R$ 67 milhões.

O deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), que tenta a reeleição, investiu R$ 261 mil em carros de som. Ele explicou que precisa de palanque próprio em cada município. Eu sou o único deputado federal do estado votado nos 246 municípios. Eu faço discurso em todos. Só hoje estou fazendo nove minicomícios. Em todas essas cidades, eu tenho que ter uma estrutura de minitrios elétricos (montados em caminhonetes). Eles não podem me acompanhar em nove cidades. Caiado diz que não tem estrutura nem máquina de governo: Eu sou um parlamentar que não tenho compra de colégio eleitoral, eu tenho voto de opinião. Eu faço uma candidatura solo, não tenho candidato ao governo.

Impressos Com a quarta maior campanha entre os pretendentes a uma vaga na Câmara, o senador e presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra (PE), investiu R$ 834 mil dos R$ 2,1 milhões arrecadados em impressos. E ainda liderou os gastos com a contratação de carros de som, aplicando mais R$ 386 mil. Não há nada de anormal e estranho nas minhas despesas. Todas estão contabilizadas. Pode ser essa a diferença, comentou o senador, insinuando que pode estar havendo despesa não registrada por parte de outras candidaturas. Ele acrescentou que, na prestação de contas à Justiça Eleitoral, esse número ainda vai aumentar. Informou que contratou 14 carros de som, ao custo de R$ 20 mil cada um, além de ceder outros 40 para candidatos a deputado estadual que fazem dobradinha com ele.

A maior campanha para deputado federal até agora é a do líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), com R$ 2,7 milhões arrecadados. Mas ele só gastou R$ 1 milhão, sendo R$ 615 milhões em material impresso. O segundo colocado no ranking, Wilson Picler (PDT-PR), com caixa de R$ 2,4 milhões, investiu R$ 592 mil em impressos. Novo na política, ele explica a estratégia, apesar das dúvidas. Campanha eleitoral ainda é um mistério para mim. Acho um absurdo a gente colocar tanto material na praça para as pessoas decidirem o voto e 80 e tantos por cento ainda estão indecisos. Mas acho que o material impresso é a forma que a gente tem para levar as propostas. Não vejo outro caminho.

Os números registrados no TSE indicam claramente a estratégia dos candidatos. Considerando todos os cargos disputados, é possível verificar que os gastos com páginas na internet (R$ 12 milhões) consomem seis vezes mais recursos do que os tradicionais comícios. Mesmo a publicidade por telemarketing (R$ 4,2 milhões) representa uma despesa maior. Na campanha de Dilma, a criação e inclusão de páginas na internet é o segundo maior gasto (R$ 4,1 milhões).

O número Faltam 6 dias para o 1º turno

Quem coloca a mão no bolso

Os candidatos mais abastados tiveram um reforço no caixa de campanha. Colocaram a mão no bolso e sacaram R$ 133 milhões para a própria campanha, o que representa uma vantagem em relação aos demais concorrentes. A prática é mais comum entre os candidatos a deputado estadual. Eles se autodoaram R$ 71,7 milhões. Em seguida, vêm os pretendentes a uma vaga na Câmara, com R$ 45 milhões. Os candidatos milionários argumentam que, pelo menos, terão autonomia no parlamento. As autodoações também aparecem nas disputas pelos cargos majoritários.

O empresário Wilson Picler (PDT-PR), que atua no ramo da educação, garantiu 96% dos recursos da própria campanha (R$ 2,4 milhões). Ele conta por que fez isso: A mídia estranha valores tão altos. Eu tinha um crédito com a empresa na distribuição de lucros. Estou cobrando. O que vou fazer com o dinheiro não interessa, é meu. Questionado se essa autodoação não representaria uma vantagem em relação aos concorrentes, respondeu: Eu acho que sim, mas é a lei. É tudo contabilidade oficial. Está caro? Esse é o valor real da política. Mas só a minha é cara? Só que a minha não tem caixa dois. Tem muita coisa errada na política. Político honesto empobrece. Os que são corruptos fazem caixa dois, prosperam, ficam ricos.

Picler argumenta que há muitas formas de interpretar as autodoações: Alguém que pega muito dinheiro de bancos vai representar o sistema financeiro. Eu posso chegar lá e dizer: aqui eu represento os meus eleitores, porque não tenho rabo preso com ninguém.

Ex-presidente da Federação das Indústrias de Mato Grosso, Mauro Mendes (PSB) concorre ao governo do estado, seguindo os passos do megaempresário Blairo Maggi (PMDB). Ele bancou 98% da própria campanha, que já arrecadou R$ 2,4 milhões. Destinou R$ 730 mil para candidatos a deputados que o apoiam.

Os candidatos a deputado federal Wellington Salgado (PMDB-MG) e Marcelo Almeida (PMDB-PR) bancaram 100% da própria campanha (R$ 1,7 milhão cada uma). O ex-senador Salgado gastou R$ 1 milhão até agora, sendo R$ 600 mil em doações para candidatos que fazem dobradinha com ele. Almeida, herdeiro do grupo liderado pela empreiteira CR Almeida, com patrimônio declarado de R$ 652 milhões, já gastou quase tudo. Predominam as despesas com material impresso (R$ 574 mil). (LV)

"Político honesto empobrece. Os que são corruptos fazem caixa dois, prosperam, ficam ricos

Wilson Picler, candidato a deputado federal pelo PDT-PR, que financiou 96% da sua campanha