Título: Multa pendente impede registro de candidatura
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 18/08/2006, Política, p. A7

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) está passando um "pente fino" no registro dos candidatos à Presidência. Dos oito candidatos iniciais, sobraram seis por conta de detalhes que os ministros do tribunal consideraram suficientemente relevantes para derrubar candidaturas. Rui Costa Pimenta, do PCO, teve negado o seu registro porque deixou de enviar a prestação de suas contas nas eleições de 2002. Os ministros consideraram a falta gravíssima e foram unânimes ao derrubar a sua candidatura. Ana Maria Rangel, do PRP, não apresentou ata da convenção partidária que teria indicado o seu nome e, por isso, foi posta para fora da disputa.

O rigor foi além desses candidatos nanicos desconhecidos. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), quarto colocado nas pesquisas, tomou um susto ao saber que o vice-procurador geral eleitoral, Francisco Xavier Pinheiro Filho, pediu a impugnação de sua candidatura pela falta de apresentação de certidões criminais. Ele conseguiu regularizar a sua situação a tempo de concorrer, mas, antes, foi advertido pelo tribunal eleitoral.

Esse rigor é novo no tribunal e fez com que muitos candidatos às eleições deste ano tivessem uma surpresa ao registrar suas candidaturas nos tribunais eleitorais. A explicação é uma ampliação da interpretação do TSE sobre o termo "quitação eleitoral", exigida pela Lei n 9.504, de 1997, para o registro das candidaturas. De acordo com advogados que atuam na área eleitoral, até as eleições passadas quitação eleitoral significava estar em dia com a obrigação de votar. Mas neste ano o TSE, e conseqüentemente os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), estendeu o conceito de quitação, que passou a incluir estar em dia com o pagamento das multas eleitorais e ter prestado contas das eleições passadas. Foi essa mudança na jurisprudência do TSE que provocou a derrubada da candidatura de Rui Costa Pimenta e a impugnação de várias outras.

Em eleições anteriores, o Congresso Nacional aprovava anistia às multas eleitorais sofridas pelos candidatos, o que não ocorreu neste ano. Em 2003, começou a tramitar um projeto de lei na Câmara dos Deputados anistiando eleitores e candidatos multados pela Justiça Eleitoral nas eleições de 2002. A proposta acabou não votada em plenário. Dois projetos propunham a anistia aos candidatos, dos deputados Ricardo Rique (PL-PB) e Wladimir Costa (PMDB-PA). Foram apensados a um terceiro, de Rogério Silva (PPS-MT), que propunha anistia apenas aos eleitores que deixaram de votar.

Em março de 2004, Inaldo Leitão (PMDB-PB) apresentou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) um substitutivo mantendo apenas a anistia aos eleitores. "A anistia de infrações à legislação eleitoral é dificilmente justificável sob o prisma ético, quando possibilita ao legislador legislar em causa própria, além de contribuir para a ampliação da impunidade em nosso país, com a qual não podemos concordar", afirmou.

Mas a CCJ aprovou outro relatório, do deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), que era contrário também à anistia dos eleitores. Alegou falta de justificativa ética e que o projeto significaria premiar os faltosos. Embora com parecer contrário ao mérito, o projeto deveria ir a plenário, porque foi considerado constitucional pela CCJ. Segundo assessores da casa, o projeto foi sendo protelado e acabou não votado.

O advogado Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral que atua para vários candidatos a deputado federal e estadual de diferentes partidos em São Paulo, conta que seis de seus clientes tiveram candidaturas impugnadas por falta de pagamento de multas eleitorais aplicadas em eleições anteriores. Três deles pagaram as multas e tiveram seus pedidos de registro aceitos no TRE de São Paulo. Nos outros três casos, ele entrou com recurso para garantir as candidaturas, ainda não julgados. Como os recursos têm efeito suspensivo, as impugnações estão suspensas até a decisão final do tribunal, que pode ocorrer somente depois das eleições. Caso o candidato impugnado ganhe o pleito, mas seu recurso seja negado, perde o cargo para o qual foi eleito. "Essa quitação eleitoral de multas é inconstitucional", diz Rollo, que pretende ir ao Supremo Tribunal Federal (STF) contestar a exigência.

O presidente do TSE, ministro Marco Aurélio de Mello, afirmou ontem, que o eleitor também deve ficar atento, e não apenas o tribunal. Ele criticou a "propaganda enganosa" dos partidos. Segundo ele, o eleitor deve ficar atento ao perfil e ao passado dos candidatos, pois muitos estariam escondendo irregularidades cometidas antes das eleições. "Deve-se analisar o que o candidato diz, o que fez até aqui, o que existe contra ele, não importa se há ou não sentença condenatória. O eleitor está com a palavra. Não é vítima, é autor", disse Mello.