Título: Em busca da mão forte que protege e afaga
Autor: Borges, Robinson
Fonte: Valor Econômico, 11/08/2006, Eu & Fim de Semana, p. 14

A mão invisível de Adam Smith pode ser fruto de um trauma anterior ao seu nascimento: a morte de seu pai. Para James Buchan, autor de "Adam Smith and the Pursuit of Perfect Liberty" (Adam Smith e a busca da liberdade perfeita), a perda do pai, controlador alfandegário, em circunstâncias obscuras, foi o evento definidor da vida do filósofo e o responsável por seu complexo de Édipo. "No seu inconsciente, Smith se sentia responsável pela morte do pai, que ocorreu quando a mãe ainda estava grávida", diz.

A tragédia teria originado, assim, o seu trabalho filosófico e político. "Ele nunca soube como seu pai morreu e, por isso, elaborou a imagem da mão invisível, que age sem aparecer. O argumento faz uma analogia com sua figura paterna, que, mesmo ausente, exercia forte influência."

Buchan começou a pesquisar sobre a vida de Smith quando era correspondente do "Financial Times", na Arábia Saudita, há 25 anos. Além das abordagens psicanalíticas de sua vida, pouco evoluiu sobre a história do homem Smith, que nasceu em 1723, em Kirkcaldy, na Escócia - a mesma cidade de Gordon Brown, ministro das Finanças da Grã-Bretanha. Constatou apenas que ele teve uma vida privada sem brilho e melancólica. Muitas vezes, seu estilo se assemelhava com o de monges. Viveu ao lado da mãe até sua morte, quando ela já tinha 90 anos, e cuja perda o destruiu emocionalmente.

Smith morreu em 1790, sem ter casado e sem filhos, mas com fama e dinheiro. Ian McLean, professor de Oxford, amigo de Brown, e autor de outra biografia de Adam Smith, "Adam Smith, Radical and Egalitarian" (Adam Smith, radical e igualitário), também diz que sua vida era um tanto sombria, o que contrastava com sua genialidade. Em sua opinião, a versão de que ele era homossexual - por ter vivido com a mãe e, depois, com uma prima, sem nunca ter tido mulher- é mais uma leitura reducionista do filósofo. "Ele tinha uma vida interna intensa e tinha pouco interesse pelo dia-a-dia", afirma McLean. "Seus amigos sempre reclamavam que ele vivia com a cabeça na lua", prossegue.

O autor recupera uma história a respeito de Smith, que soa como piada: depois de pôr um pão com manteiga em seu bule de chá - sem perceber -, reclamou que aquela era a pior xícara de chá que havia tomado em sua vida. "Essa era sua imagem deliberada", comenta.

Em 1750, Smith conheceu um dos seus amigos mais próximos e mais influentes em seu repertório intelectual: David Hume (1711-1776), filósofo escocês e um dos precursores do liberalismo econômico. "Ele foi um amigo absolutamente fiel", afirma Ian McLean.

Em 1751, Smith foi nomeado professor de lógica na Universidade de Glasgow, passando em 1752 a lecionar filosofia moral. Nas suas aulas, abordava os campos da ética, retórica, jurisprudência e política econômica ou ainda polícia e rendimento.

Apesar da fama e do dinheiro, Adam Smith viajou apenas uma vez para o exterior. Viveu na França entre 1764 e 1766, onde conviveu com François Quesnay (1694-1774) - economista francês, líder dos fisiocratas e uma das figuras mais importantes na constituição da economia como ciência - e Anne Robert Jacques Turgot (1727-1781), administrador e economista, que ocupou uma posição de transição entre os fisiocratas e os clássicos. Quando voltou a seu país, a preocupação com os fatores que produziriam a riqueza das nações o levou a escrever o célebre - e polêmico - "A Riqueza das Nações" (1776).