Título: Marqueteiros atuaram nos governos de candidatos
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 11/08/2006, Especial, p. A22

João Santana e Luiz Gonzáles, marqueteiros dos dois principais candidatos a presidente da República, entram de fato na campanha nacional a partir de terça-feira já tendo tido ativa participação nos governos dos candidatos que defenderão no horário eleitoral.

Gonzáles, responsável por todo o setor de comunicação do tucano Geraldo Alckmin, ganhou com a agência Lua Branca R$ 25 milhões em 2005, em uma licitação promovida pela Secretaria de Comunicação do governo paulista. O jornalista desligou-se da agência este ano, repassando o comando para seu filho, Bruno. Firmado o contrato, foi feito um aditamento -já em 2006- de R$ 6,5 milhões, montante 25% superior à licitação inicial. O valor representa mais da metade dos recursos pagos pela pasta da Comunicação em 2005, que alcançaram cerca de R$ 44 milhões.

A participação de Luiz Gonzáles no governo Alckmin também ocorreu na outra conta de publicidade em disputa nesta mesma licitação. No valor de R$ 23 milhões, foi vencida pela agência DPZ, que subcontratou uma das maiores produtoras de vídeo do país, a GW Comunicação, da qual Gonzáles é um dos sete sócios, com 28% das ações. O valor deste subcontrato não é informado pela DPZ nem pela Secretaria de Comunicação.

O objeto do maior contrato ganho pela Lua Branca, ao qual o Valor teve acesso, foi a realização de toda a publicidade institucional do governo estadual entre 1º de julho de 2005 e 30 de junho de 2006 - véspera da campanha eleitoral. Pelo contrato, a empresa de Luiz Gonzáles ficou responsável no período pelo "desenvolvimento ou gerenciamento de pesquisas de opinião", "documentação em vídeo ou fotos das atividades do Estado", " distribuição de material e aferição de conteúdos das matérias veiculadas nos meios de comunicação".

Na justificativa para o acréscimo de 25% ao valor inicial do contrato, datada de fevereiro deste ano e assinada por Emerson Figueiredo, um dos ex-homens-fortes da Comunicação nos anos Alckmin, está o enfoque em comunicar aos mais pobres, faixa do eleitorado em que Alckmin tem os piores desempenho nas pequisas. Figueiredo menciona três vezes essa população-alvo. "Observa-se a necessidade de ampliar o conhecimento da população de mais baixa renda da existência dos restaurantes Bom Prato", afirma. Depois: "Como parte da modernização do serviço público com qualidade e levando mais conforto e assistência mais próxima da população de baixa renda, devemos dar publicidade ao Poupatempo Móvel." E, finalmente: "Os Centros de Integração da Cidadania deverão receber apoio de comunicação junto á população mais carente."

Entre as dez licitações que a Lua Branca participou no governo Alckmin, esta foi a única em que saiu vitoriosa. Não houve contestação dos concorrentes e o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo a julgou regular.

O jornalista João Santana, marqueteiro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também teve participação no governo federal. Depois da saída do publicitário Duda Mendonça do governo, em meados de julho de 2005, devido as suas declarações na CPI dos Correios de que recebeu pagamentos pela campanha de 2002 em contas não-declaradas no exterior, Santana foi conduzido ao Planalto pelo então ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Embora isso tenha ocorrido no segundo semestre de 2005, a informação oficial é de que Santana passou a cuidar da imagem de Lula apenas em dois pronunciamentos feitos em cadeia nacional este ano. Não teria sido remunerado, uma vez que seu nome já estava fechado com a direção do PT para coordenar o marketing eleitoral na campanha.

O Planalto nega, mas atribui-se ainda a Santana a regionalização da publicidade institucional do governo federal. Colocado em prática entre o fim de 2005 e o início de 2006, a idéia era mostrar à população as principais realizações da União em cada Estado, com enfoque nas ações sociais e de desenvolvimento econômico. Também teve por escopo evitar a apropriação das obras federais por governos estaduais e municipais, conforme destaca documento interno da Secretaria de Estado de Comunicação Social (Secom): "Nas pesquisas de opinião, são recorrentes os sinais de falta de informação da população a respeito de ações de governo federal nos Estados e municípios. Contribui para essa desinformação o distanciamento físico do governo federal, a descentralização dos recursos e a apropriação dos governos estaduais e municipais de programas cuja origem de recursos são federais. Isso dificulta a compreensão do discurso e afeta sua credibilidade junto à população".

Na esteira do escândalo do mensalão, a produção se iniciou no segundo semestre e foi dividida entre as duas agências responsáveis pela publicidade institucional do governo: Matisse e Lew, Lara. O público-alvo foram homens e mulheres de todas as classes sociais, com ênfase, segundo outro documento interno da Secom, "no público feminino das classes B e C" -fatia do eleitorado em que o presidente Lula tem fraco desempenho eleitoral.

A campanha foi divida em duas etapas. Na primeira, priorizaram-se os Estados com os maiores colégios eleitorais e que fazem oposição ao governo federal. Do PSDB, São Paulo, Minas Gerais, Pará, Goiás e Ceará; do PFL, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro; do PMDB, os oposicionistas Rio Grande do Sul, Distrito Federal e Paraná. Na segunda fase, a regionalização da publicidade ocorreu nos Estados de Alagoas, Amazonas, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins.

Tanto o baiano Santana quanto o paulista Gonzáles dão à eleição presidencial deste ano caráter diferente da vista na disputa de quatro anos atrás. Naquela ocasião, o marketing político dos dois principais candidatos -Lula e José Serra- foi protagonizado por publicitários-celebridades: Duda Mendonça e Nizan Guanaes, respectivamente. Neste ano, ao contrário, o principal cargo em disputa terá por trás dois jornalistas de formação que carregam em comum forte discrição e aversão a entrevistas. Além disso, trazem no currículo difíceis disputas eleitorais. Gonzáles foi o responsável pela histórica vitória de Mário Covas sobre Paulo Maluf em 1998. Santana conduziu Eduardo Duhalde -conhecido por sua falta de carisma- ao Senado argentino.

O paulista é um antigo servidor dos tucanos paulistas. Trabalhou na vitória de Covas em 1994 e 1998, na de Fernando Henrique em 1998, na Alckmin em 2002 e na de Serra ao Senado em 1994 e à prefeitura paulistana, em 2004.

Seu estilo de fazer campanha é estritamente adequado ao perfil político de Alckmin: sóbrio, propositivo, contrário a ataques pessoais. A grande incógnita é se o perfil resistirá à pressão por uma campanha negativa face às recentes pesquisas eleitorais que apontaram o aumento da diferença entre Lula e Alckmin.

Santana deverá substituir a forte carga emotiva que Duda implementou à campanha petista em 2002 por mais conteúdo e balanço da gestão Lula. Em Salvador, é tido como aplicado e adepto de uma estética estilo "elitista" nas campanhas, o que, segundo publicitários baianos, não combina com o perfil político do presidente Lula. (Colaborou Patrick Cruz, de Salvador)